Entrevistamos o chef Alex Atala, a consumidora de comidas de vó Marina Person, as cozinheiras da feijoada da Portela, uma diarista e uma mãe
Já reparou que agora os bacanas servem picadinho em suas festas? E que pessoas “descoladas” pagam quase R$ 40 para comer um PF com arroz, feijão e pastel? Tentamos desvendar o enigma entrevistando o chef Alex Atala, a consumidora de comidas de vó Marina Person, as cozinheiras da feijoada da Portela, uma diarista e... uma mãe.
Que tal comer um arroz com feijão e pagar cerca de R$ 36 pelo prato? Ou se deliciar com um velho e bom PF de arroz, feijão, pastel e couve e pagar a bagatela de R$ 37? Sim, de um tempo para cá, temos observado que os bacanas (a gente incluído, apesar de a gente não ter muito dinheiro, no caso, o “a gente” significa a jornalista que escreve este texto) andam com a mania de servir comidas de pobre em suas festas. Calma, a jornalista que escreve este texto não chega a este ponto.
Mas é um tal de picadinho com ovo cozido servido em festa na avenida Vieira Souto (aquela que é um dos endereços mais caros do Brasil, com vista para a praia de Ipanema) que começamos a tentar desvendar o mistério. E, para provar que estamos certas, durante o fechamento desta reportagem, recebemos um convite para uma degustação de vinhos no restaurante Capim Santo, em São Paulo. O cardápio tinha três opções de prato: tartar com molho de pitanga, costela de tamboqui (o que é isso?) na brasa e... picadinho com farofa de banana e purê de mandioquinha! Sim, aquilo mesmo que comíamos na casa das nossas avós.
Fomos atrás de algumas pessoas para tentar detectar o fenômeno. O chef Alex Atalla, que serve no D.O.M., segundo ele próprio, o arroz e feijão mais caro do mundo (R$ 36), filosofa: “Eu fiz questão de ter esse prato no meu cardápio. É muito fácil eu provar que sou bom servindo trufas e coisas que pessoas como a gente só comeram uma vez na vida. Você come e acha gostoso porque não tem com o que comparar. Um chef brasileiro tem que ter coragem de mostrar que é bom também no arroz e feijão, que é uma coisa que a gente come desde que nasceu”, explica.
E vai além. Alex acha um absurdo que países como a França se orgulhem tanto da sua culinária e o Brasil renegue a sua. E será que estamos pagando essa grana por um bom prato de arroz com feijão por pura nostalgia? Ele acha que sim. “Tem a ver com a nossa memória afetiva”, diz.
Marina Person é do mesmo time: “pagamos porque um BOM prato de arroz, feijão e pastel é difícil de fazer, uai! Tem comida melhor do que aquela que lembra a casa da vovó? Eu troco qualquer salmão montado em cima do purê por aquela farofinha, couve... Humm...”.
Concordamos com Alex e Marina. Mas, não deixamos de nos achar ridículas quando entramos em um restaurante e pedimos um prato desses para pagar essa grana. Ficamos tão culpadas que fomos repercutir com pessoas que ficaram chocadas com o assunto: nossas mães e a Sueli, a assistente querida da Nina Lemos.
Conversa com as cozinheiras da feijoada da Portela
Nina. O que você acha de um prato de arroz, farofa, pastel e couve custar R$ 37
Ivete Pereira da Silva. Quanto? 37 reais?! Eu, hein! Isso é loucura. Só vale se tiver bebida de graça e o show de um artista legal incluído, tipo o Zeca Pagodinho, a Alcione... Aí vale!
Nelcina do Nascimento Pacheco. Isso é um absurdo! Existe isso? A nossa feijoada aqui vem completa, tem até salgadinho, e custa R$ 8 reais... Sou muito mais a nossa!
Conversa com Sueli, que trabalha na casa de Nina
Nina. Sueli, você não acha um absurdo eu pagar mais de R$ 20 por uma porção que só vem com 12 bolinhos de arroz?
Sueli. Genteeeee [cara de espanto]. Hoje mesmo eu fiz bolinho de arroz. E sabe por quê? Porque sobrou arroz de hoje, vai sair no máximo por R$ 1, porque só botei um pouco de farinha, ovo e queijo. Sério, Nina, isso não custa mais que R$ 1.
Nina. E o que você acha de um prato com arroz, farofa, pastel e couve custar R$ 37?
Sueli. Isso é um absurdo! Qualquer um faz isso em casa. Se você for ao mercado, comprar e fizer, vai sair por menos de R$ 10. E eles cobram isso só por um prato?
Nina. Sim, por um PF.
Sueli. Ai, gente! [cara de espanto]
Nina. É... (cara de vergonha)
Telefonema para Maria Amélia (mãe da Nina e não do Chico Buarque)
Nina. Mãe, o que você acha de eu pagar R$ 37 para comer um prato de arroz, feijão, farofa e pastel?
Maria Amélia. Acho um absurdo, pede para a Sueli comprar e fazer. Quando você sai de casa precisa comer coisas menos comuns. Gastar dinheiro assim é um absurdo.
Nina. Mas não é um prato assim tão simples...
Maria Amélia. Não é mais entrevista, agora eu tô falando sério. Pede para a Sueli comprar e fazer. Do que você está rindo? Fala pra Sueli comprar e fazer. Tô falando sério. Ela pode fazer toda semana pra você! Nina, eu tô falando sério. Não é para rir.