Amiga, colega, admiradora. A atriz Martha Nowill revela o que está por dentro de Paulo Vilhena
Acordei pálida, tremendo.
Naquela manhã, eu, Maria, Caio, Julinho, Carol e Paulinho deveríamos deixar São Francisco Xavier, após um mês de filmagem do longa Entre nós e um porre coletivo de despedida.
Enfiei as roupas sujas e a minha dificuldade de lidar com o fim da nossa convivência dentro da mala e, antes de abandonar o quarto da pousada, achei sobre o capacho da porta um livro deixado por Paulinho. Era o livro de poemas de seu pai, Sergio Vilhena, Ser errante, ser natural.
Aquilo significou muito para mim, sei que em algum momento da noite ele quis encontrar um gesto de amor, algo que mostrasse o quanto nossa vivência no filme foi especial para ele. Em troca escrevi uma carta quilométrica e parti. Totalmente apaixonada.
Porque, sim, eu sou apaixonada pelo Paulinho.
Eu, o cara do posto, as minas da maquiagem, o microfonista, o boom, a câmera, as garçonetes, os garçons, os engenheiros, a minha mãe, o seu pai, as nossas tias.
Em primeiro lugar porque ele é lindo. E porque tem um cuidado com as pessoas a sua volta que é quase irreal. Tem também um senso de responsabilidade e uma forma amorosa de estar no mundo, e, mais, quer sempre melhorar.
Perguntei ao telefone: “E esse personagem da novela, hein, Zinho, esse louco, você não ficou com medo de canastrar? Morro de medo de fazer uma louca e ficar canastra”. E ele respondeu: “Zinha, sabe que nem pensei nisso? Essa temática é tão fodida, tão importante”, e continuou falando sobre como aquele personagem (Domingos Salvador, da novela Império) ia atingir o público, sobre a parte social da novela. Enfim, eu numas de vaidade de atriz e o Zinho pensando em mudar o mundo. Entende o coração desse homem?
Mas o bicho pega mesmo porque o Paulinho é bom desse jeito, mas faz uma cara de bad boy de vez em quando que é de ferrar qualquer mulher desavisada. E surfa, hein, exibindo uma tatuagem linda no ombro direito. E vai na onda do diretor, do elenco, bicho intuitivo com anos de experiência, olho no olho. É uma loucura contracenar com ele. No meio de tudo ainda pode vir com uma tesoura e cortar a ponta errada de um figurino da colega de elenco por achar que não ia imprimir bem.
Lembra, Maria Ribeiro, quando antes de começar seu take mais difícil do Entre nós ele leu uma carta, falando dos seus filhos, pra você entrar na cena com tudo? Eu lembro, foi bonito demais. Lembro dele também me ajudando a ficar tranquila antes de ter que mostrar os peitos em cena. Falando em peitos: “E esse ensaio sensual, hein, Zinho, tá animado?”. Ele responde: “Muito animado, vai ser legal, mas o Julico é foda, ficou mostrando a bunda, né, e agora?”. “E vai fazer o quê?”, respondi às gargalhadas. “Vou fazer um monte de agachamento”, ele disse. “Sério? E funciona?” “Claro que não, vou continuar com meus exercícios, comendo direito, como sempre fiz, e tá tudo certo.” “Ah bom”, suspirei aliviada. E ele emendou: “E diminuí bem o álcool, depois da Oktoberfest sem fim que foi a Copa. Resolvi dar um tempo, agora só no fim de semana”. “Que bom”, respondi já com uma ponta de culpa do champanhe da noite anterior.
E ficamos nessas conversas picadas ao telefone, 10 minutos aqui, 10 acolá, nas brechas da nossa agenda frenética. Paulinho me contou que queria ter tido um filho antes de seu pai morrer: “Pra ele sentir o neto no peito, sabe? Acho que a gente vem ao mundo para ter esses encontros com nossos familiares e amigos”.
Mas, como bom Paulinho que é, na hora que viu que não ia rolar, se apaziguou. Tem tido sonhos fortes com o pai, acordou chorando dia desses. Continua querendo um filho, mas tá focado no trabalho, arrebentando no novo personagem. E no teatro, onde ele e a Fê Rodrigues bancaram a montagem de uma peça sem grana, Tô grávida!, e estão tendo um retorno lindo, bilheteria, público vibrante. Que lindo, Paulo, você merece realizar esse sonho de todos nós, atores.
E eu aqui, contando os caracteres e pensando que antes do fim do texto preciso encontrar um defeito nessa unanimidade que é Paulo Vilhena pra não ficar só babação. Ah, lembrei uma história bem queima filme. Desculpa aí, Zinho, vou ter que contar para humanizar um pouquinho a jornada do herói.
Ele está sempre pronto para não deixar a peteca cair, a festa acabar, o caldo amargar
Eu e o Paulinho num fim de noite em São Chico: tínhamos feito uma batida de maracujá depois que a cerveja desaparecera goelas abaixo. Acaba a batida, mas a festa em nós, não. E ele, sem o menor constrangimento, pede que eu recolha os restos de bebida nos copos da galera. Joga tudo no liquidificador. Liquidifica. Procura o gelo. Não tem, só uma daquelas bolsas de fisioterapia que ficam no freezer. Joga ela dentro, dá cinco minutos pra gelar e serve a iguaria em copos. Eu, chocada, nem por um instante hesito em beber e continuar dançando enquanto ele passa a bandeja pela sala.
Essa é a imagem que eu tenho do Paulinho, sempre pronto para não deixar a peteca cair, a festa acabar, o caldo amargar. E é tudo de verdade, orgânico, sem agrotóxico, já que ele não precisa fazer o menor esforço para ser assim.
“Olhar de perto o teu céu aberto.” Esse é um dos versos que está no livro do seu pai. E é isso que você é, Zinho, um céu, de peito aberto, com uma abóboda apinhada de estrelas ou raios incandescentes, depende da hora do dia que se olha para você.
Vai lá: Paulo Vilhena já esteve no ensaio da Tpm, em abril de 2004. http://goo.gl/fgDty9