A maior trilha urbana do Brasil, com 183 km de caminhada, foi pensada por um ex-comissário de bordo e percorre lugares ainda remotos da capital fluminense
Há vinte anos, quando ainda trabalhava como comissário de bordo pela Varig, o ambientalista Pedro da Cunha e Menezes sentava-se próximo à janela do avião para apreciar os gigantescos morros de granito que cortam o litoral do Rio de Janeiro. A vista do asfalto que desemboca na areia, as favelas que rodeiam o Cristo Redentor e o oceano cristalino eram comuns aos olhos do carioca, admirador estudioso da paisagem natural do município onde cresceu e vive. Pedro sabia, porém, que ainda existiam caminhos inéditos a serem percorridos naquela natureza tão familiar. Foi assim que ele calculou a trilha que percorre toda a cidade por dentro da Mata Atlântica, batizada como Transcarioca.
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Inaugurada oficialmente em fevereiro, após o esforço de mais de mil voluntários, a caminhada conecta parques estaduais a trechos ainda pouco acessados da capital fluminense. Com um dos pontos iniciais na Barra de Guaratiba, na zona oeste, a trilha pensada por Pedro sobe em direção ao parque da Tijuca, cruza com a Vista Chinesa, chega próximo ao Cristo Redentor e finaliza no Pão de Açúcar, zona sul. São 183 km, ou 12 dias de caminhada. É a maior trilha urbana do país. "No caminho se pode passar por duas fortalezas, estradas de pedra e fazendas da época do café, do século 19, e terminar perto de um forte na pedra da Urca, onde o Rio de Janeiro foi fundado em 1565", revela à Trip. Há também lagoas localizadas em cumes onde se pode apreciar a capital de um lado, a Baixada Fluminense e o interior de outro. A caminhada pode levar às Praias Selvagens, na Barra de Guaratiba, onde existem quatro praias poucos frequentadas pelos cariocas, ou à cachoeiras, como a do Camorim, no Parque Estadual da Pedra Branca, e à vistas exuberantes lá no alto da Pedra da Proa, localizada no Parque da Tijuca.
O roteiro, que parece estimular um Indiana Jones fluminense, possui um significado maior do que a aventura. A Transcarioca é um presente ambiental à cidade, avalia o idealizador. Com o caminho aberto cuidadosamente na mata, animais têm mais espaço para transitar, o que melhora a capacidade imunológica e estimula a reprodução entre as espécies, ele conta. "Também há um ganho claro de saúde pública - as pessoas ficam menos estressadas e doentes. O principal ganho é o aumento na consciência ambiental da população, mostrando que é preciso preservar e exigir conservação", explica.
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A manutenção e a divulgação - como guias de segurança, sinalização etc. - são encabeçadas por ONGs e coletivos de trilheiros, que apresentam esses caminhos inéditos à quem desconhece o universo de árvores e silêncio escondidos na metrópole. Hoje, Pedro se tornou pesquisador do Ministério do Meio-Ambiente, em Brasília, e um dos principais pesquisadores de preservação vegetal urbana do país. Mesmo já tendo visitado mais de 80 trilhas de longo percurso para suas pesquisas, ele ainda diz se surpreender com a criada no Rio de Janeiro, que imaginou lá do alto. "O bom da Transcarioca é que ela nunca estará finalizada ou totalmente descoberta. Afinal, é um organismo vivo em meio à cidade", conclui.
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Imagem principal: Divulgação