Velho
Só agora começo a perceber, finalmente, que estou mesmo ficando velho. Os sinais físicos da velhice jamais me atingiram. Sempre pratiquei ginástica, jamais me mantive inativo por muito tempo. Pratico diariamente uma série de exercícios físicos e alongamentos que me dão estabilidade e força física. Presentemente faço caminhadas (ontem foram quase três horas andando com minha sobrinha) aqui pela minha cidade (Embu das Artes). Frequento o Horto Florestal, passeio no Parque Ibirapuera, estou sempre no Parque da Juventude e no Parque da Luz. Adoro parques! Estou bem.
Mas já não gosto de quase nada feito no presente. Claro, não estou alienado e as inovações tecnológicas e de costumes também me afetam. Gosto muito do computador, da TV enorme e a Internet para mim é uma benção. Não gosto das coisas feitas agora. Tudo que antes era bem permanente, hoje tornou-se descartável. Por um lado resolve o problema do apego às coisas, mas torna tudo muito breve, como nós mesmos. Por exemplo: um guarda-roupa já não é um móvel que faz parte de nossa vida. Os guarda-roupas atuais, assim como todos os móveis, são feitos de pedaços esmigalhados de madeira (das menos nobres) prensados com resina e recobertos com folhas milimétricas de madeira nobre. Uma enorme falsidade. Assim como quase tudo o que há. Relógios (há réplicas de 1ª, 2ª e até 3ª linhas), peças ornamentais de "ouro", roupas, DVDs, CDs e uma infinidade de objetos. Há algum tempo atrás, usar bijuteria, cópia de relógio, roupa de grife falsificada, e coisas assim era o maior vexame. Era coisa de pobre (e o interessante é que a maioria da população do país era pobre), de quem quer aparecer sem ser.
Não gosto da música atual. O hip-hop não me atrai nem um pouco. Sei da necessidade urgente de suas letras, da importância do que elas dizem e que nunca foi dito. Mas prefiro música cantada e não apenas falada. A falsamente chamada de "música sertaneja" e os "pagodes" também não conseguem me pegar. Exploram excessivamente a baixa emocionalidade e não oferecem nenhum conteúdo aproveitável. O nome "brega" representaria melhor tais manifestações "musicais". Gosto de bossa nova, das big bands, de blues, das grandes cantoras nacionais e internacionais, de MPB, reggae, rock do bom, música orquestrada e até um pouco de música clássica que, embora não tenha cultura suficiente para apreciar de fato, gosto mesmo assim.
Não gosto das pinturas atuais. Aqueles rabiscos monocromático não são nem um pouco artísticos para mim. Prefiro o surrealismo, as grandes telas, os grandes gênios. A literatura não fez aparecer nenhum grande escritor. Desses fantásticos que escrevem obras monumentais que resistem ao tempo, como aqueles que apreciamos do passado. Descobri Eduardo Galeano e Eduardo Giannetti há alguns anos, mas eles já estão ai há décadas e são produto do mesmo século que eu. Os filmes atuais são extremamente velozes. Há uma aceleração que chega a embaralhar os olhos e dar uma semi-tontura pela velocidade da exposição das fotos. A vida não ocorre nesse tempo, essa aceleração me sabe à artificialidade por falta de conteúdo. Os enredos caíram muito, estão batidos, comuns e nada de novo oferecem. No começo dos filmes eu já posso dizer o que vai acontecer a seguir e às vezes até prevejo o fim. Tudo leva a crer que estava certo quem afirmou que depois de Shakespeare não se criou mais nada. A televisão de canal aberto virou uma comédia. Programas falsamente populares; programas humorísticos super apelativos e sem graça alguma; programas jornalísticos completamente desacreditados; novelas em cima de novelas que raramente conseguem ultrapassar o comezinho e conduzem seus seguidores à alienação.
É acho que preciso mesmo me render aos fatos: a velhice me pegou. É meio assustador, mas eu me defendo bem. Toda vez que sobra uma "graninha" percorro os "sebos" da cidade em busca de raridades do passado: livros; DVDs, CDs... E fico todo feliz quando encontro algo do meu gosto e do alcance de meu bolso. Apesar de estar ficando velho, eu alimento bem minha alma.
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Luiz Mendes
19/08/2013.