A Trip completa este ano três décadas de vida. Genuinamente brasileira, sem ligação com um conglomerado editorial ou grande grupo financeiro. Na essência, não fazemos muito mais do que observar gente
Se você for um leitor do tipo mais detalhista, talvez tenha notado uma marca diferente na capa da nossa revista (Trip #253) deste mês. O ícone criado pelo nosso velho parceiro Rafic Farah, o mesmo designer de cuja lavra saiu a marca Trip em 1986, é apenas o símbolo de uma série de outros acontecimentos que pretendem celebrar algo que pode ser considerado sem nenhum exagero um feito muito especial num dos países mais inacreditavelmente atrapalhados (para dizer o mínimo) do planeta.
A Trip, tanto a empresa quanto a revista que lhe deu o nome, completa este ano três décadas de vida. Um grupo genuinamente brasileiro, sem ligação com nenhum conglomerado editorial, grande grupo financeiro ou qualquer outra força que a alavancasse e garantisse sobrevida neste que certamente é o conjunto de décadas com o maior histórico de percalços, crises e idiotices econômicas, políticas e administrativas de toda a nossa complicada história desde o descobrimento.
E esse cenário tão “estável e previsível” como a cabeça de um dos nossos “geniais” parlamentares só engrandece as centenas de vitórias que fomos colecionando ao longo dos anos numa construção orgânica, coerente e reta, apesar das centenas de obstáculos com os quais aprendemos a dividir nossos 11 mil dias.
“A Trip, tanto a empresa quanto a revista que lhe deu o nome, completa este ano três décadas de vida. Um grupo genuinamente brasileiro, sem ligação com nenhum conglomerado editorial, grande grupo financeiro ou qualquer outra força que a alavancasse e garantisse sobrevida”
Paulo Lima
Na lista das coisas maravilhosas que esses 30 anos nos proporcionaram, aparece numa posição de enorme destaque o fato de que desde meados dos anos 80, na essência, não fazemos muito mais do que observar gente. Apenas para mencionar entrevistas de mais grosso calibre, daquelas em que se consegue algum grau de profundidade na arte de mergulhar na vida de alguém que por um motivo ou por outro nos possa balizar e servir de referência, os números revelam volumes significativos. Só de Páginas Negras, nossas já notórias entrevistas que dificilmente ocupam menos de dez páginas da versão impressa da Trip, a conta está em nada menos que 253 figuras especiais devidamente sabatinadas. De Páginas Vermelhas, a entrevista protagonista da nossa versão feminina (a Tpm), já são 163. Se somarmos os mais de 32 anos do programa de rádio da Trip (sim, ele nasceu antes mesmo da empresa e da revista Trip), o resultado dá um salto exponencial, já que estamos falando em alguma coisa como 1.664 entrevistas levadas ao ar pelas ondas do FM e pelos canais digitais. A grosso modo, então, deixando de lado todos os milhares de perfis, minientrevistas e enquetes que já realizamos nesses e em outros suportes, só aqui teríamos mais de 2 mil entrevistas de razoável envergadura. Ah, claro, não podemos deixar de adicionar os 110 geniais homenageados até hoje pelo Prêmio Trip Transformadores. A conta vai subindo...
Em todos os sentidos
É definitivamente um traço que ajuda a definir o que somos: a nossa evidente vocação para observar gente de forma tão apaixonada quanto minuciosa. Indagar, examinar, refletir e registrar tanto aquilo que nos diferencia como indivíduos quanto o que nos une como humanidade.
Ao longo dessa epopeia, perfilando as mais impensáveis e diametralmente diferentes criaturas, nunca encontramos um guru. Felizmente porém, ao longo dessa viagem nos deparamos com centenas de indivíduos que, seja por sorte genética, por obra do acaso, pela notável formação acadêmica ou técnica, por obra de dom inexplicável, pela dedicação a algum tipo de filosofia, arte, esporte ou outro tipo de magia, atingiram um nível de compreensão desses fenômenos intrigantes que ajudam a definir a vida, ligeiramente superior à média da raça.
Não só encontramos muitos deles, como registramos suas experiências e tentamos, em que pesem nossas limitações, cair o mais pra dentro possível de suas almas para ver o que de fato há de diferente ali.
Não, não é possível, nem depois de 30 anos de pesquisas ininterruptas, desenhar um manual, um mínimo denominador comum que ajude a decodificar essas tais criaturas levemente mais coloridas (ou “iluminadas”, para quem preferir) do que a média. Mas podemos liberar para você alguns dos achados, aspectos que depois de tantas perguntas e tentativas de ler os subtextos e o verso das respostas, acabamos inferindo.
Primeira característica dessas figuras: provavelmente o que as faz mais felizes em suas trajetórias é compartilhar tudo o que aprenderam com o primeiro que demonstrar a mais remota vontade de saber.
Segunda: uma enorme e genuína incapacidade de se levar demasiadamente a sério.
Terceira: total clareza sobre a noção do coletivo. Ao que parece, para essas figuras dotadas de algum tipo de brilho maior, ninguém precisou explicar a ideia de que só há na verdade um enorme ser, que é composto de todos os outros espalhados por aí.
Quarta: o humor, a capacidade de ver a graça. Em todos os sentidos.
Aqui nestas páginas vai mais uma das nossas tentativas, que se repetem já há 30 anos, de inspirar através das histórias de gente boa.
Divirta-se.