por Fernanda Paola

Inspirado pela cultura da umbanda e do santo-daime, o artista gaúcho Wagner Pinto faz sua primeira exposição individual em São Paulo (SP)

Por Fernanda Paola e Flora Paul Fotos Wagnerpinto.com

Em seus quadros, o gaúcho Wagner Pinto usa símbolos e cores da umbanda e do santo-daime, das mirações que tem com o chá – o que ele define como surrealismo abstrato. Aos 30, Wagner, que faz parte do coletivo Upgrade do Macaco, inaugura sua primeira exposição individual em São Paulo, na POP livraria. Em entrevista à Trip, o artista fala sobre suas influências religiosas, diz como o daime ajuda em seu trabalho e compara a importância do grafite à da bossa nova.

Em sua arte, você se utiliza de referências como o santo-daime, a umbanda, grafismos e elementos alquímicos. Qual o seu contato com essas referências? Wagner Pinto. Na verdade, eu sou fardado no santo-daime, e quando a gente é fardado é como se fosse um fiel dessa igreja. Além disso, eu estudo e pesquiso muito a mitologia dos orixás. Sempre tive contato com isso, porque no Rio Grande do Sul tem muita umbanda. Então, antes de ir ao médico, a gente sempre tentava curar nossas doenças no terreiro, com benzedeira. Mas meu vínculo religioso é com o santo-daime, uma igreja da nova era.

O que você traz desse contato para a sua arte? Na verdade, quando começamos a consagrar o chá do santo-daime, certamente ficamos mais sensíveis, e, no caso, as mirações são efeito da ingestão do chá. Claro que meu trabalho não é somente baseado nisso, mas tem influência direta dessas mirações, com referências de cores. As cores que uso geralmente são contrastantes e podem ter a ver com o contexto do ritual, que tem um tom mais terroso – que, como diz o santo-daime, é o sangue da floresta.


Desenhos do sketchbook do artista

Como define seu trabalho?
Eu trabalho como “surrealismo abstrato”, porque é uma abstração, com um pouco de surrealismo metafísico. Porque as coisas abordadas ali vêm do meu universo particular, são forças invisíveis que a gente tem e que acabam sendo interpretadas no meu trabalho de maneira muito particular. São códigos meus e que talvez só eu vá interpretar, mas o resultado final disso é uma abstração um pouco diferente, meio surreal, difícil de explicar. O daime me ajudou bastante nessa série, mais especificamente nos últimos desenhos que fiz, porque na época que eu produzi comecei a ter uma experiência mais intensa com o chá, o que me deu força, perseverança e referências de cor.

Quando começou a fazer arte?
Na verdade, desde pequeno eu dizia que queria ser artista, só que veio pela via mais tortuosa. Então, eu trabalhei bastante e a arte sempre ficou em segundo plano. Faz um tempo que resolvi encarar com mais seriedade, mas a minha produção mesmo, séria, começou há uns dois, três anos.

Quem você admira na arte? Quem te influencia?
Admiro muito um cara com quem trabalho, o Bruno Novelli. Gosto também do trabalho do Franz Ackerman e do Cy Twombly, ambos pintores. Eu admiro muito o grafite no Brasil, acho que tem uma superpersonalidade, gosto bastante de todos os artistas. Tenho muita admiração e muito orgulho pelo movimento que acontece no Brasil. É muito importante, assim como a bossa nova. Pode parecer ridícula a comparação, mas o grafite ajudou o Brasil a ter uma supervisibilidade e respeito lá fora, o que foi bem bacana e importante.

Chegou a fazer grafite?
Na verdade, não. Eu tenho muita influência porque tenho muitos amigos que trabalham com isso, mas meu lance é desenho no papel ou na tela. Eventualmente, eu pinto algumas paredes, mas como suporte para o meu trabalho.

O que você achou da invasão na galeria Choque Cultural?
Fiquei sabendo, sou amigo do pessoal da galeria. Eu achei que foi um tiro pela culatra. Primeiro porque ninguém tem direito de chegar e invadir um lugar assim pra vandalizar. Porque foi vandalismo agir dessa maneira; foi dentro da galeria, estragou o trabalho de outros artistas que não tinham nada a ver. Acho que foi um protesto sem fundamento, foi diferente do que aconteceu na Belas Artes, porque lá tinha um contexto. E, outra coisa, acho que essa invasão não foi feita por pessoas que levam o picho muito a sério, porque tinha pichações criticando o planeta, coisas nada a ver lá dentro, e eu acho que muito pichador de repente nem concordaria com o que foi feito. Foi um protesto meio morno, uma coisa feita meio sem pensar, sem profundidade.

Você acha que dá pra mudar de estilo sem perder a identidade?
Acho que dá, mas tem que ser feito com muita cautela, porque você faz coisas com que as pessoas se identificam. Se ela compra aquele CD ou determinada arte, é porque realmente gosta muito daquilo, e se o artista muda de estilo está sujeito a perder os fãs. Mas muita gente já fez isso. O Palatnik pintava e, depois de visitar a colônia de doentes mentais no Juqueí e ver os doentes mentais pintando, desistiu de pintar, porque considerava aquilo uma pintura verdadeira e achou que fazia mera cópia. Então, deu novos rumos ao seu trabalho.



Vai Lá: Exposição Miração - POP Livraria R. Virgílio de Carvalho Pinto, 297, Pinheiros, São Paulo de 30 de setembro a 01 de novembro segunda à sexta das 13h às 20h e sábado das 11h às 18h Entrada gratuita Tel.: (11) 3487-1677
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