Capitalismo na coleira

Empresa eticamente sustentável é empresa economicamente viável

Caro Paulo,

A reação à coluna "Consumiu-se" também te surpreendeu? Até hoje estou recebendo e-mails aqui no meu endereço. Muito apoio, identificação e perguntas de como consigo trabalhar e ganhar a vida pensando assim. Mais precisamente, nas palavras do Gabriel Henrique Lui: "Como sua visão é recebida no meio empresarial" É possível trabalhar nesse meio realmente seguindo e defendendo essa nova ética social?"

Queria tentar responder à questão porque considero vital que se acredite ser possível para que de fato algo se torne possível. É preciso crer para ver. Principalmente porque estamos vivendo uma época muito destrutiva/criativa que dá muita chance para a imaginação. Na verdade, precisamos dessa imaginação. No meu caso, não só consigo viver defendendo essa visão de mundo como acredito que é por causa dela que me dão valor. O que me deixa muito tranquilo, porque não saberia fazer diferente.

Então, onde está o pulo do gato? Primeira resposta: no cliente. Tenho tido a sorte de encontrar em meus clientes pessoas de qualidade com consciência e competência. São empresários e executivos ambiciosos que têm sonhos, crenças, valores e que gostariam de colocar isso em prática nos negócios. Esses líderes fazem acontecer em suas organizações e precisam de ajuda para juntar lucros e princípios.

Segunda resposta: no mercado. Nossa época está mudando muito o referencial de sucesso. A idéia de sustentabilidade é cada vez mais aceita como critério para julgar o valor de uma empresa. Para ter valor reconhecido, uma organização precisa ser sustentável em termos sociais, ambientais e mercadológicos - isto é, precisa cuidar do seu resultado e dos contextos onde vai buscar esse resultado. Esses contextos são a sociedade em geral, o meio ambiente e o mercado.

Assim como a Bolsa de Valores de New York, a Bolsa de São Paulo também está criando o seu índice de sustentabilidade para avaliar as empresas. É uma tendência irreversível, pois sinaliza amadurecimento do mercado e da sociedade que aceitam cada vez menos a mentalidade especuladora curto-prazista típica da sociedade industrial.

Na Sociedade do Conhecimento, tudo se sabe: balanços mascarados, relações ruins com investidores, funcionários, consumidores, meio ambiente - tudo vem à tona mais cedo ou mais tarde, mostrando o que de fato tem valor e o que é frágil e é de fachada.

Comece pelos princípios

A terceira resposta é a mais difícil de dar - teria que falar bem de mim, o que é sempre constrangedor. Mas é justamente essa resposta a que poderia ser mais útil para um estudante como o Gabriel, que faz gestão ambiental na USP.

Então lá vai: o discurso do profissional precisa ser verdadeiro, consistente e conseqüente. Não basta defender a tal da nova ética social, que é muito fácil e confortável porque se está do lado certo, do bem. Defender ética divide o mundo entre éticos e não-éticos. E o mundo já tem divisões demais. Ninguém mais agüenta discursos maniqueístas. É preciso defender a evolução da sociedade, da empresa, das pessoas. Uma evolução integradora que ponha junto tudo o que separamos um dia. Juntar lucro e princípios, trabalho e prazer, sagrado e profano, mocinho e bandido, cotidiano e propósito - por exemplo.

Vejo que muita gente talentosa e com consciência não consegue dar consistência a seu discurso porque não tem uma proposta integradora. E se pode conviver com o mundo empresarial é por concessão, não por convicção. Na minha experiência, a proposta integradora é a que seduz, que entusiasma as pessoas porque desperta um sonho, resgata uma utopia possível, um projeto de vida rico em todos os aspectos. Mas é preciso que a proposta seja verdadeira para você, porque os problemas enfrentados nessa jornada não são pequenos nem simples, embora muito gratificantes.

Claro que não esgotei a conversa nessas linhas, mas se alguém quiser continuar, é só mandar ver que eu respondo. Para aqueles que quiserem trilhar o mesmo caminho, pode vir atrás que a estrada é mais que viável. É da vez.

Meu abraço otimista, Ricardo.

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