Beleza avassaladora que desafia o tempo em ensaio pelas mãos do marido Carlos A. Riccelli
Bruna Patrizia Romilda Maria Teresa Lombardi. Os muitos nomes são poucos para dar conta das várias mulheres que existem em Bruna Lombardi: extrovertida e reservada, hiperativa e focada, escritora admirada e um dos maiores símbolos sexuais do Brasil... Mas todas elas têm em comum a beleza avassaladora, que desafia o tempo, como prova este ensaio feito para as lentes de seu marido, Carlos Alberto Riccelli.
Bruna. Bru-na. A simples menção do nome já causa certa agitação interna. A tônica num “u” aveludado quase força uma expressão de súplica. É preciso ajustar as sobrancelhas para que a pronúncia saia neutra, desarmada de tudo o que significam aquelas duas sílabas.
Não seria exagero dizer que Bruna Lombardi é o maior símbolo sexual brasileiro. No mínimo poderíamos colocá-la como uma das três BBBs – Bruna, Brunet e Bündchen, da mesma forma que na música clássica se junta Bach, Beethoven e Brahms num único suspiro de admiração. (Ou Beatles, Beach Boys e Byrds, diriam outros.)
Bruna, especialmente, sugere música, som. Quando ela surge na sala de sua bela casa no Morumbi, muda alguma frequência no ar. Ela está simples, jeans, uma blusa leve, cabelos soltos. Se havia alguma tensão, ela se desfaz com sua naturalidade. Em pouco tempo o visitante se sente próximo daquela figura até então inatingível, mítica.
“Nada do que é currículo em escola é fundamental. Escola deve ser inspiradora, estimular a imaginação e não a repetição”
Agitada com os mil lançamentos de seu novo filme, a comédia Onde está a felicidade?, ela diz que mal tem dormido, o que explica os óculos escuros. Mesmo assim está radiante, como uma menina. Ninguém diria que tem 59 anos e um filho, Kim, de 30. O corpo cultivado por anos de ioga se aconchega felinamente no sofá. Ela abre um sorriso e começa a falar.
“É louco fazer um trabalho que provoca essa reação intensa de alegria; o retorno de público tem sido enorme.” No filme, dirigido pelo marido, Carlos Alberto Riccelli, ela faz uma apresentadora de TV casada com o xará Bruno Garcia. Seu programa é de culinária afrodisíaca. Ansiosa, engraçada e sexy, lembra uma heroína de Almodóvar.
“Eu sou bem palhaçona no dia a dia. Eu imito todo mundo, pego o jeito da pessoa”, diz, divertindose consigo mesma, enquanto abraça as pernas contra o peito. “Desde menina eu tenho essa veia humorística, meus amigos sempre me dizem para parar de fazer heroína romântica.” E então tira os óculos, revelando os olhos azuis-piscina, límpidos, transparentes, sinceros: “Não acho legal falar com uma pessoa sem olhar nos olhos dela”, explica, com um sorriso. Nem precisava.
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No filme ela pega o marido num chat erótico. “Eu nunca encostei nela”, ele diz. Não é, claro, o suficiente. Depois de uma cena explosiva, resolve dar um tempo e fazer o caminho de Santiago de Compostela. Ainda que ela tenha escrito o roteiro, na vida real é bem diferente: “Não sou do ciúme. Nunca fui ciumenta com namorado nem amiga. Não é nossa marca. A gente tem um nível de cumplicidade em que essas coisas parecem muito bobas”, explica.
A cumplicidade já dura mais de 30 anos, desde que se conheceram no Xingu, nas gravações de Aritana, novela da extinta TV Tupi. “A gente estava no meio daquela mata exuberante, ele seminu e eu com um biquíni sumário. Era um lugar mágico de ponta a ponta, e nós éramos Adão e Eva.”
Riccelli a dirigiu em outros dois filmes, O signo da cidade (2007) e o independente Stress, Orgasms and Salvation (2005), feito em Los Angeles, onde moram a maior parte do tempo. A sintonia parece mesmo forte. É só olhar para essas fotos. Bruna volta a ser Eva. Afeito a seus caprichos, Adão a desnuda com uma câmera. Só que nesta história não há expulsão; o paraíso continua.
“Crescemos juntos de uma forma que ficou interessante pros dois, o tesão continua muito presente, o sexo cada vez melhor. É simples: se tá bom a gente fica, se não tá bom procura outras paragens. E a gente nunca entrou em crise. A gente se pega de frente mil vezes, mas já sabe como resolver, com o tempo você fica mais paciente, mais sábio, e a sabedoria é um grande bem. Nunca pensei que eu fosse ficar com alguém na minha vida. Era uma adolescente cheia de paixões, mas sempre achei que seria uma mulher sozinha. Eu não tinha o sonho de casar quando era criança.”
“Eu e o Riccelli crescemos juntos de uma forma que ficou interessante pros dois, o tesão continua presente, o sexo cada vez melhor”
Sobre posar nua, parece ser uma questão de timing, de estar no momento certo. Foi assim com a Status, em 1980, e a Playboy, que teve de esperar anos para tê-la na capa, em 1991. “Sexo e erotismo são coisas muito importantes na minha vida. Agora tenho horror de vulgaridade, de obviedade, não combina comigo, tem lugares a que eu não iria”, deixa claro.
A literatura tem certo papel em tudo isso. “Eu tinha acabado de ler a náusea, do Sartre, e aí comecei o Sexus, do Henry Miller. A partir daí, não quis mais outra coisa. O Sexus me salvou da Náusea” [risos]. Seu livro O perigo do dragão (1984), um dos sete que escreveu, é todo feito de poesia erótica. Até hoje faz sucesso, com mil citações na internet. É muito revelador de seu espírito. O próprio ato de escrever sugere uma Bruna de desejos intensos, povoada de fantasias, mas que prefere manter certa reserva.
“Sou mesmo reservada. Muitas e muitas vezes na vida me apaixonei por um cara que nunca soube. Eu nunca cheguei perto de um menino na vida, se o cara não toma a inciativa morre comigo. Acho legal a mulher que vai lá e pega, mas eu não sou assim, não me acho nem contemporânea, é estranho. Mas não sou tímida. Acho que tenho forte essa coisa do yin e yang. Por um lado sou extrovertida, expansiva, doadora, solar, carismática. Bem italiana. Mas tenho outro lado tão importante quanto esse, que quer sumir, quer ficar num canto escrevendo.”
Física quântica
Foi modelo a partir dos 14. Depois, fez ao mesmo tempo, uma de dia e outra de noite, faculdades de jornalismo e publicidade. Como em seu poema “Roupa íntima”, ela tem “sido muitas mulheres”. Rindo, lembra: “Olha o meu nome: Bruna Patrizia Romilda Maria Teresa Lombardi. Um amigo me disse: mas ainda é pouco nome para tantas mulheres. Nossa, será que eu sou tão esquizofrênica assim?”.
“Eu sou mais curiosa que qualquer outra coisa. Eu tô sempre em alguma atividade extraordinária, imprescindível, que eu preciso saber tudo dela [risos]. Quando eu mergulho, mergulho com todos os meus interesses. Eu nunca molhei o pé. Não sei o que é fazer só um pouquinho. É da minha natureza. Eu tenho de desbravar aquilo de forma completa, como se fosse a história da minha vida. Pode ser qualquer coisa.”
Esse qualquer coisa inclui física quântica, Fritjof Capra (autor do famoso O Tao da física) e o novo guru, o também físico Nassim Haramein, um interesse inesperado que divide com o filho (“Eu e o Kim somos muito ligados; a gente pensa muito parecido”). “Se eu tivesse nascido com dom matemático provavelmente teria sido física nuclear, é o máximo que a gente pode estudar na vida. Nós vivemos dentro de uma convenção mensurável, mas a realidade é imensurável. Coloca esse meu pensamento na educação: você é um ser em expansão, você não deveria caber num lugar que é menor que você por causa de um controle social.”
Filha do diretor de fotografia italiano Ugo Lombardi, que ajudou a criar a companhia cinematográfica Vera Cruz, e da atriz austríaca nascida na Turquia Yvone Sandner, Bruna estudou no colégio Dante Alighieri, um dos mais tradicionais de São Paulo. Mas seu pai certa vez lhe disse: “Minha herança pros meus filhos é a liberdade”.
Nessa liberdade ela foi educada e assim educou o simpático Kim, formado em teatro, músico e assistente de direção do pai. “Sempre achei que eu nunca devia poupar ele de experiências, achava que ele devia ir a um show de música, mesmo que no dia seguinte não fosse à aula. Nada do que é currículo em escola é fundamental. Você tem de aprender a pensar, e os professores têm de perceber seu ponto de vista, para onde orientar melhor seus dons. Escola deve ser inspiradora, estimular a imaginação, a criatividade e não a repetição, os testes de memória.”
Bruna tem a fórmula definitiva para a questão: “Educação é amor, amor que se estende a tudo, não só a teu filho ou família. A vida é uma longa lição de humanidade, e a descoberta do amor faz parte disso”. Quem há de negar?