A certeza de ser correspondido
A claridade risca de sol cada sorriso, cada olhar. O entusiasmo enche de alegria o coração. A confirmação da conquista nos atravessa de vida. O pensamento adquire a sua velocidade máxima e em seu rastro o cheiro doce da realização.
A receptividade, a abertura formam laços de ventos, amarrados pelo orvalho mais fino das madrugadas. O tempo faz sua curva mais longa e os motivos usuais de existir como que fogem, perdidos de nós. Tudo o que anteriormente justificava nossos movimentos torna-se fraco e não resiste ao simples estremecer das horas a escorrer no espaço de tempo que se forma ao nosso redor.
Não há idade, não há regras. A noite se levanta da tarde morna, majestosa e solene, e se derrama por sobre quantos se amam. Depois vem o frio na barriga, a angústia da ansiedade. Estar junto é tudo que se deseja e a presença querida nos transporta ao que a vida tem de mais repleto e palpitante. Longe somos rasa solidão que se alastra. Perto nos sentimos engolfados, a respiração se rompe e atordoa. De esplendores feridos, nos tornamos implausíveis e tudo em nós como que se escraviza ao sentimento que brota do âmago de nosso ser.
Pensamos no que há de melhor, planejamos nossos melhores momentos e vivemos um estranho transcender. Transgredimos regras, mesmo aquelas que nos impomos, vencemos a fraude, a incompetência em ser quem até então, sentíamos. Tudo torna-se mais real e substancial. A vida cresce sob nossos olhos. E as horas engolem dias, semanas, meses. Tudo é pleno e de vastidão transvestido.
Somos invadidos da mais absoluta satisfação de existir. Tudo adquire um novo brilho. Em nosso coração não resta um único canto que não esteja inteiramente inundado da mais profunda ternura e da mais comovente doçura. Amamos transportados pelo sonho de felicidade que nos embala desde a mais tenra idade. Tudo torna-se largo, como nossos olhos sempre úmidos de uma piedade desconhecida. Piedade por aqueles que não amam como nós, que não sentem o que sentimos.
Tudo para trás se torna compreensível ao nosso olhar agora compassivo, como a convicção de que o presente se constrói a partir do que estamos sentindo. A certeza de que somos correspondidos nos torna aprendizes da esperança, essa professora tão amável. O rosto do ser querido não sai de nossos olhos interiores. A vontade é de chorar de tamanha alegria e felicidade. As mágoas anteriores, esse poço de lágrimas que nem cabe ser chorado, como que por encanto, seca e desaparece. Estamos salvos, varridos e lavados pela emoção de sermos, mais uma vez, queridos, necessários, ou até escolhidos.
Como é maravilhoso ser escolhido! Um cristal fino que não se quebra, uma água redonda e ares cheios de asas. Estar único para alguém provoca em nós uma alegria infantil, pura, de ingênua constituição. Abre em nossos corações o anseio profundo de corresponder inteiramente. De saquearmos os tesouros do tempo para presentear o ser amado.
E mergulhamos no exame das possibilidades. Vagamos sonhos adentro em busca de realidades, agora viáveis, nos reerguendo de nossas misérias interiores. Recomeçamos nossos passos plenos dessa ternura que vasa pelos olhos, preenchendo todos os vazios de que nos dotamos no decorrer da vida. E abençoados pela vida, seguimos riscando de claridade todos os gestos.