por Mara Gabrilli
Tpm #146

Nossa colunista conta como a tetraplegia mudou sua relação com a própria vagina

Ela sempre foi uma vedete em minha vida. Ainda criança, já aprendi que ela podia me proporcionar muito
prazer. Adorava me masturbar. Ao sofrer o acidente e perder os movimentos, fiquei com um medo danado de que ela pudesse perder seu poder de me proporcionar todos os encantos. Mas, na UTI mesmo, descobri
que ela ainda se manifestava positivamente ao toque. Ufa, que alívio, minha periquita continuava a mesma.

Quando fui para os EUA me reabilitar, um dos maiores incômodos era ter várias pessoas entrando durante a noite no quarto para mexer em mim enquanto eu, deitada, não podia ver o que estava acontecendo. Muitos eram enfermeiros. A nova condição física, que mexeu muito com minha sensibilidade, ainda era desconhecida para mim. Sentia-me invadida, sem saber o que exatamente acontecia lá embaixo... Foi aí que resolvi conversar com o diretor do centro de reabilitação e fiz um pedido que nunca haviam feito naquele lugar: a instalação de uma câmera no quarto para que eu pudesse ver o que estavam fazendo com a minha periquita. Afinal, se algum homem fosse mexer nela, que fosse com a minha participação!

A tetraplegia tornou minha xoxota mais livre que nunca. Ela é praticamente uma instituição pública do meu corpo. Adotei saias e vestidos em todas as ocasiões para facilitar meu dia a dia na hora de fazer xixi, já que para isso preciso ser sondada. O que acabou facilitando para namorar também. Assim, na hora H meu parceiro não precisa se matar para tirar uma calça. Além do que, com uma agenda corrida como a minha, seria muito difícil achar banheiros acessíveis.

Meu xixi se tornou a coisa mais dinâmica do dia: faço no carro ou em qualquer outro lugar com o mínimo de privacidade e espaço para que eu possa ficar em pé na cadeira. Muitas vezes, despacho e-mails e vários compromissos de trabalho com as meninas da minha equipe enquanto faço xixi. Podemos dizer que faço várias reuniões privadas.

Mas não pense que com tanta publicidade minha periquita perdeu sua essência. Ela continua mantendo suas origens. Sou apaixonada pelo seu cheiro. Hoje, a sensibilidade interna dela é muito mais intensa e diferente.

Aliás, tenho uma teoria quanto a essa química: o sistema límbico controla todas as nossas emoções e está hierarquicamente acima de todos os outros sistemas. Ou seja, aquilo que a gente sente manda em todo o resto. Então, na hora de escolher um namorado, quem manda é ela. Se ela não curtir, nem adianta tentar...

Pública ou privada, a periquita tem vontades e direitos que precisam ser respeitados.

Mara Gabrilli, 42 anos, é publicitária, psicóloga e deputada federal pelo PSDB. É tetraplégica e fundou a ONG Projeto Pró ximo Passo (PPP). Seu e-mail: maragabrilli@maragabrilli.com.br

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