por Tiago Santos Vieira
Tpm #110

Ela conquistou o respeito do mundo das lutas e de ícones como Rodrigo Minotauro

Nos últimos seis anos, Paula Sack foi repórter do canal Combate, fez 500 entrevistas e conquistou o respeito do mundo das lutas e de ícones como Royce Gracie e Rodrigo Minotauro. Agora no UFC (Ultimate Fight Championship), maior evento de artes marciais do mundo, é a única brasileira da organização – e mostra que nesse universo há mais do que orelhas em formato de couve-flor

O cenário da entrevista com Paula Sack não é hostil como o octógono (espécie de ringue onde lutam os praticantes de artes marciais mistas – MMA, o antigo vale-tudo). O embate se dá numa área reservada de um hotel em São Paulo. Recém-chegada de Toronto, no Canadá, onde aconteceu a edição recorde (55 mil presentes) do UFC, o Ultimate 

Fight Championship, maior evento de artes marciais do mundo, a jornalista tem dificuldade em se colocar na posição contrária dos microfones. No outro canto, o interlocutor se esforça para desconstruí-la. Com 500 entrevistas no currículo, fruto dos seis anos que foi do canal pago Combate, Paula, 30 anos, acaba de ser contratada pela organização do UFC como a única repórter brasileira.

Enfim, ela baixa os punhos e aceita a condição de entrevistada: “Em uma luta de MMA, não são dois enjaulados no octógono. São homens e mulheres presos do lado de fora querendo entrar e fazer o mesmo”.

Kempo e Twitter
Vamos ao cinema tentar entender essa posição, usando como exemplo o filme Clube da Luta, com Brad Pitt. Sinopse: homens estressados com rotinas insossas se agrupam para lutar e extravasar. Assistir ao UFC pela TV vale da mesma premissa, embora homens e mulheres se satisfaçam no conforto do sofá. “A luta é o esporte mais antigo de que se tem registro. Está no contexto social. É instintiva para os dois sexos. A facilidade de assimilação do MMA, com regras autoexplicativas (nocauteie e vença), esclarece o sucesso do UFC também entre o público feminino”, arremata Paula.

Em 2005, após dois anos no programa Oi Radical, na Record, ela foi convidada para um teste no Combate, passando a apresentadora e repórter. Em março, cobrindo as coxias do UFC, um colega de equipe pediu que Paula mandasse vídeos para avaliação. Daí, partiu o convite para ser o braço da organização no Brasil (que ganha edição do evento em agosto, no Rio de Janeiro). Paula transparece saudosismo ao lembrar de quando trabalhava no Combate. “Meu trabalho é basicamente o mesmo: matérias com atletas, bastidores, esportes radicais... Agora no site (br.ufc.com), o volume quintuplicou! Fico responsável por produção, câmera, direção. Chuto e corro pra cabecear”, brinca.

Paula é elétrica. Fala, explica e faz perguntas o tempo todo, ritmo que remonta à infância: “Fui uma criança hiperativa. Meus pais tentaram de tudo para me frear. Na busca por um ‘desacelerador’, parei no kempo [arte que imita movimentos de animais]. Bem lenta... Ideia perfeita pra revoltar qualquer garotinha acelerada”, ironiza. Filha da jornalista Zezé Sack e do arquiteto cubano Fidel Sack, eles nunca a repreenderam quanto à opção pelas lutas. Apesar do nome, o pai saiu da ilha caribenha antes da revolução de 1959. O sobrenome vem da avó paterna, francesa. O irmão mais novo, Pedro Sack, é advogado e leve entusiasta de futebol.

“Em uma luta de MMA, não são dois enjaulados no octógono. São homens e mulheres presos do lado de fora querendo entrar e fazer o mesmo”

A carioca criada no Leme e que hoje mora no Leblon cresceu, assim, acelerada e apaixonada por esportes outdoors. “Já experimentei todos que pode imaginar. Essa relação se fortaleceu na época da faculdade, cursando jornalismo esportivo.” Dentre os favoritos, lista wakeboard, escalada, skate longboard e snowboard. “Fui criada na praia, mas o surf não está entre meus esportes preferidos”, revela.

Trânsito livre
Paula diz que sua rotina de viagens e gravações é completamente louca. Não desliga, fica “24 horas no ar, sempre com a câmera por perto por via das dúvidas”. Conta que, quando não está trabalhando, o lugar mais fácil de encontrá-la é no Twitter. E se nota que os bastidores do UFC a agradam mais que o conforto do lar: “O espetáculo começa lá. A guerra dos atletas contra o peso antes do confronto, a tensão dos lutadores, o último treino. Tudo para o grande momento: o combate! A estrutura, a organização e o profissionalismo do evento impressionam”, enfatiza.

O confronto brasileiro mais comentado do ano, em que Anderson Silva aplicou um chute fatal em Vitor Belfort, encerrando o embate de forma brusca, causou tanto espanto quanto a admiração da cantora Sandy pelo primeiro lutador – e pelo esporte. 
Paula questiona: “Mas por que Sandy não gostaria de MMA? Não existe perfil para gostar de MMA. Sandy, ou qualquer famoso, gosta porque o esporte é inteligente, agressivo, envolvente e global, as pessoas se identificam”.

Tanto é que, sem o mesmo peso das masculinas, existem as ligas femininas de MMA, com a brasileira Cris Cyborg entre as melhores lutadoras. Royce Gracie, pertencente à casta que mudou os rumos do MMA, diz que, particularmente, não gosta de ver mulher lutar e elogia a jornalista: “A Paula sabe chegar, vem cercando até conseguir a entrevista”, solta. E emenda: “O MMA virou esporte, mas é só uma junção de artes marciais. E mulheres gostam de defesa pessoal, está tudo ligado!”.

Rodrigo Minotauro – vencedor de uma das melhores lutas a que Paula assistiu, contra o gigante Bob Sapp – também rasga seda: “O aprofundamento da Paula em artes marciais e o cuidado para que as perguntas não sejam repetitivas transmitem respeito, garantindo trânsito livre entre lutadores”, afirma. Trânsito esse que poderia provocar ciúmes em seu marido, o economista Saulo Sabbá, 28 anos, com quem é casada há dois. Mas Paula garante que “orelhas cheias de calosidades” (típicas de lutadores) não fazem seu estilo.

“A primeira impressão sobre Paula Sack é: ‘Outra repórter bonitinha, que faz as perguntas de sempre’. Mas, mal ela começa a falar, te surpreende” (Murilo Bustamante, líder de uma das principais equipes de MMA)

O que não a impede de apontar os brasileiros Lyoto Machida e Mauricio Shogun e o canadense Georges St. Pierre os preferidos das mulheres – principalmente das que não se encaixam no rótulo de “maria-tatame”. Paula conta que nunca namorou um lutador, apesar de ter conhecido o marido em uma academia. Assim como ela, que pratica boxe apenas para condicionamento físico, ele aderiu ao muay thai.

Revanche
Por mais que frequente um ambiente extremamente masculino, a jornalista conta que o profissionalismo com que trabalha não abre espaço para eventuais galanteios. Porém de grosserias ela não se livrou. Como na vez que o norte-americano Chael Sonnen a destratou diante das câmeras, ao descobrir que ela tinha a mesma nacionalidade de Anderson Silva, seu adversário seguinte. “Quem é você, enquanto brasileira, para falar de respeito aqui na América?”, disparou Sonnen.

Sem muitos esclarecimentos, Paula começa a contar de quando levou o peso pesado Júnior Cigano para escalar o Pão de Açúcar. “Assim como você está tentando me desconstruir, coloquei o Cigano em provação numa matéria. E vi que naqueles 110 quilos existem medo, sensibilidade, emoções comuns a qualquer pessoa.” O espírito da jornalista incorporara novamente. Dessa vez ela não se atém a questionamentos, mas a intermináveis narrações. Era uma revanche, ainda que a entrevista terminasse empatada.

ESTILO CAMILA NUNEZ MAQUIAGEM RAFAELA FIGUEIREDO (CAPA MGT) / PAULA VESTE JAQUETA ÁGATHA

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