Na contramão do senso comum

por Diana Corso
Tpm #84

Com os anos, o que é moeda corrente para adolescentes torna-se ouro para uma mulher adulta

 
Com os anos, o que é moeda corrente para adolescentes torna-se ouro para uma mulher adulta: despertar algum olhar de desejo de um desconhecido

Estou reconciliada com meus cabelos, os anos de litígio encerraram- se com um acordo diplomático. Não bastassem a cor original,um castanho sem graça, e os fios grossos e indomáveis, ainda os brancos tomaram conta da cabeça aos 30.Durante as décadas de discórdia, as batalhas incluíram todos os tons de vermelho, cobre e mechas possíveis e imagináveis. Cansada das labaredas vermelhas dessa guerra de tintas, decidi parar de pintar faz uns quatro anos. Foi extremamente difícil achar um profissional que comprasse essa ideia, hoje é charmoso, moda em Nova York,mas, na época, em Porto Alegre, era esdrúxulo. Deixar a cor natural e cuidar da saúde dos fios resultaram em um cinza prateado e macio que me agrada demais. O cabelo deixou de ser um problema, mas surgiram outros.

Jamais fui uma beldade de parar o trânsito, mas de garota tive direito aos olhares que toda mocinha bem-proporcionada tem. Com o passar dos anos, aquilo que é moeda corrente para qualquer adolescente torna-se ouro para uma mulher adulta: ser capaz de despertar algum olhar de desejo, dispensado por um desconhecido na rua, nos corredores do supermercado, na fila do cinema. Estão equivocadas aquelas que esperam que disso nasça uma história de amor, é um mero exercício de fantasia. Nós sabemos disso porque também o praticamos. Quando vemos alguém interessante, criamos uma novelinha que inclui a inserção do sujeito numa escala classificatória. Esse é do tipo Clooney, coroa mulherengo; esse é chamativo, mas é do tipo que aprecia os próprios peitos no espelho; esse é um Brad Pitt, lindo e bacana, pena que nunca serei uma Angelina; esse é um cara charmoso,mas sério, tipo bom marido fiel; esse é bonito, mas é gay; esse é, hum, atraente, mas tem jeito de maluco...

Em geral, nós mulheres olhamos mais discretamente e apreciamos sempre criticamente. O que realmente nos interessa é participar da fantasia de um desses, na verdade serve qualquer um, porém, quanto mais valioso o produto, maior é a cotação de ser notada por ele. Assim como nós, os homens olham por curiosidade e para afirmar sua identidade. Eles tendem a ser mais explícitos, faz parte de seu papel imaginar-se caçadores, fantasiar conquistas que nem sempre são acompanhadas de vontade, tempo ou energia para efetivar.

Eu recomendo
Quanto mais inseguros formos, mais tenderemos a gostar do óbvio, como homens grandes e amplos, mulheres com peitos sempre alertas e longos cabelos lisos. Se formos vistos em companhia de um macho ou de uma fêmea explícitos, no vigor da idade, logo ficaremos confirmados em nosso valor sociossexual. É uma mera questão de imagem, mas o que não é? Lá onde parecia tratar-se apenas de desejo, é de autoimagem que falamos!

Esse é, então, o único problema dos cabelos grisalhos. O que ajuda é que aquele que mais me interessa acha lindo, mas é uma escolha difícil essa de gostar-se na contramão do senso comum. É uma outra forma de sentir-se interessante, embora não seja jogar para a torcida. Não serve para levantar o entusiasmo do pessoal das obras, mas mesmo assim recomendo.

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