Pegamos carona no jatinho da cantora para falar com ela sobre poder, fama, dinheiro e filho(s)
Ela vai trabalhar de jatinho e passeia de ônibus por Salvador. Grava em casa e toca em Nova York. Tem o DVD mais vendido da história E o filho menos fotografado do showbiz. Como Ivete Sangalo lida com todo esse poder?
São 21h05 de uma quinta-feira de outubro. Nos bastidores de uma casa de shows em Olinda (PE), Ivete Sangalo está com um prato de comida apoiado sobre as coxas. Arroz, carne e farofa. Quando acabar de comer, vai vestir o figurino – uma blusa branca e uma saia longa plissada da mesma cor –, fazer o sinal da cruz e subir ao palco numa homenagem a Luiz Gonzaga, ao lado de cantores como Marina Elali, Elba Ramalho, Zezé Di Camargo e Luciano. “É uma grande farra”, resume a baiana, que, aos 40 anos, dança sozinha no posto da voz mais popular do Brasil.
Já vendeu 7 milhões de discos solo (e outros 3 milhões com a Banda Eva) e é recordista absoluta em DVDs, com Multishow ao vivo – Ivete no Maracanã. A gravação levou 50 mil pessoas ao estádio e teve 1.350.000 cópias comercializadas, batendo todos os recordes mundiais da Universal Music, deixando para trás U2, Amy Winehouse e outras estrelas da companhia. Em 2010, lotou o Madison Square Garden, em Nova York, e mês passado lançou Real fantasia, seu 19º CD, com tiragem de 80 mil cópias, um espanto no atual cenário fonográfico. Esses números não vieram apenas na base de sorriso e simpatia. Tem muito trabalho aí.
“Ela nunca acha que o jogo está ganho”, diz a diretora de marketing da Universal Music, Márcia Santos, que trabalha com Ivete desde os tempos da Banda Eva. O conjunto, que surgiu como bloco de Carnaval nos anos 80 e teve Daniela Mercury nos vocais, ganhou projeção nacional com a chegada de Ivete, em 1993. Depois de cinco anos à frente da banda, ela se lançou em carreira solo – o grupo seguiria com Emanuelle Araújo e, depois, com o atual vocalista, Saulo Fernandes. “Ivete faz tudo o que as ações promocionais pedem, eu passo uma agenda e ela cumpre. Trata com carinho a mídia, os fãs”, afirma a executiva ao lembrar que, no dia de seu lançamento mais recente, a cantora deu conta de conceder uma coletiva de duas horas e mais 20 entrevistas para programas de TV. Nem duas nem cinco. Vinte. Em 2013, ela completa duas décadas de uma carreira sem baixos e, apesar da estabilidade financeira, não pensa em parar: “O trabalho faz bem pra cabeça da pessoa”.
Marmitas
Essa convicção vem da educação que recebeu dos pais, um ourives e uma dona de casa com seis filhos. Depois que o pai morreu, vítima de um infarto fulminante durante um discurso numa festa de 15 anos em Jua-
zeiro (BA), a família passou por dificuldades. Ivete, a caçula, tinha 16. Tudo piorou quando, apenas seis meses depois, o irmão Marcos morreu atropelado. “Vivíamos num apartamento maravilhoso, mas juntávamos moedas para comer melancia”, lembra a irmã Cynthia, três anos mais velha. “Minha mãe desmoronou. Foram tempos duros, em que a família permaneceu unida.” Para sustentar a casa, ela e Ivete decidiram vender marmitas preparadas por dona Maria Ivete.
Essa não foi a única empreitada dos irmãos. Numa família musical, em que todos tocavam instrumentos e cantavam, a voz de Ivete se destacava – e o irmão Ricardo começou a agendar shows dela em bares de Salvador. Durante uma apresentação em Morro do Chapéu, cidadezinha a 390 quilômetros da capital baiana, ela chamou a atenção do produtor Jonga Cunha, dono do Bloco Eva, que a convidou para integrar a banda que estava formando. Ivete passou a fazer dois shows semanais, em média, e viajava para cantar. Nesse vaivém, pagava R$ 20 para que a irmã arrumasse sua mala. Mais tarde, o combinado passou para R$ 50, e seguiu aumentando. Cynthia, aos poucos, ficou responsável pelo figurino, depois pelos cenários, até trocar o estágio na Petrobras pela equipe da Eva. “Foi por causa do trabalho dela que todos nós fomos tendo empregos estáveis, com salário no fim de mês”, conta a irmã, hoje contratada pela Caco de Telha, empresa de 150 funcionários – 30 para cuidar só da cantora. As atividades incluem também uma editora musical, dois blocos e dois camarotes no Carnaval de Salvador. No final de 2010, o comando saiu das mãos de Jesus, irmão de Ivete que ficava à frente dos negócios. Na época, foi noticiado que o motivo seria o processo trabalhista movido por um ex-baterista de Ivete. Procurado pela reportagem, Jesus preferiu não comentar a saída, declarando apenas: “Não trabalho mais com ela”.
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A primeira conquista que o dinheiro trouxe foi a quitação da dívida de dois anos de condomínio, que acabou com os olhares tortos dos vizinhos. O primeiro luxo, um apartamento só para ela, aos 25 anos. “Mas eu nunca ficava em casa, estava sempre viajando”, lembra. “Quando fui dormir pela primeira vez lá, percebi que não morava mais com minha mãe e me desesperei. Eu era muito grudada nela.” Foram anos intensos, em que a Banda Eva fazia 28 shows por mês. “Até que veio o dezembro em que fizemos 30. Na volta de um deles, em Caravelas, desmaiei no ônibus e acordei só no hospital de Salvador, com o negócio na veia. Pura estafa.”
Poeira
A presença de palco fez diferença em sua carreira. Talvez o exemplo mais emblemático seja o da música “Sorte grande” (aquela do refrão “Poeeeira...”), de 2003, como lembra Márcia Santos: “Lançamos a versão em estúdio em agosto. Chegou novembro, não tinha virado sucesso. Eis que a gente resolveu gravar o clipe ao vivo, pra fortalecer a música. Aí, explodiu. Começou a ser cantada pelas torcidas [de futebol] e, em um mês,
virou fenômeno absoluto no Brasil. Posso dizer que o ‘ao vivo’ com a energia da Ivete traduziu o que a música precisava passar”. É dançando e gesticulando que Ivete se sente à vontade. “Detesto fazer foto. Faço quando precisa e porque é trabalho, mas não gosto. Me dê 14 horas de vídeo, mas não me dê três horas de foto.”
À medida que foi ficando mais à vontade no palco, Ivete perdeu parte de sua liberdade no dia a dia por conta do assédio. A apresentadora Sarah Oliveira, 33, amiga há mais de uma década, lembra de um episódio, ocorrido em Salvador. “Saímos para jantar e, no final, depois da uma da manhã, Ivete decide passar no shopping [aberto até a madrugada no período de festas]. Ela disse: ‘Vamos, vai ser tranquilo’. Mas, assim que chegamos, o primeiro segurança que a viu começou a gritar ‘Ivete!, Ivete!’, tipo fã mesmo! Ela respondia: ‘Sim, sou eu, mas fale baixo, meu filho!’ [risos]. Não adiantou. As 40 pessoas que estavam por lá vieram correndo e tivemos de nos refugiar dentro de uma loja”, conta Sarah. O curioso em Ivete não é a calma com que ela lida com esse amor desesperado. São, sim, as brechas que encontra na vida de celebridade. “Adoro andar de ônibus à noite pela orla de Salvador. É uma delícia, com o ventinho batendo. Sentamos eu, meu marido e meu filho no fundo, quase ninguém percebe e quem percebe fica de boa.” Quando esta repórter faz cara de incredulidade, ela confirma: “Eu juro!”.
É do filho, aliás, que ela mais gosta de falar. Marcelo, 3 anos, conversa com propriedade, diz a mãe. “Ontem ele estava batendo os dedinhos no sofá assim [imitando o gesto] e me perguntou: ‘Mãe, posso abrir a geladeira?’. E eu: ‘O que você quer pegar lá?’. E ele: ‘Acho que você não vai gostar, mas posso?’.
Ele queria uma balinha de ursinho que só pode comer no fim de semana, mas já veio falando que eu não ia gostar. Como resistir? Combinei que podia só um pouquinho e ele entendeu”, derrete-se. Ela imita a pose do filho ouvindo música. “Ele para e fala assim: ‘Mãe, bota um rock!’.”
“Fico dois dias longe de casa, no máximo. Três é suicídio. Eu choro de saudade, vou murchando e fico ruim pro trabalho”
Amor de mãe
Ficar longe de Marcelo foi a coisa mais difícil que Ivete, mãe aos 37, fez nos últimos anos. Quando ele nasceu, em outubro de 2009, ficou sem fazer shows por dois meses, a maior pausa da carreira – mesmo assim, bem menor que a licença-maternidade padrão, de quatro meses. No dia de voltar, no entanto, quase não conseguiu. “Eu tirei 1 litro de leite do peito, o que é um volume absurdo”, lembra. “Comecei a fazer o trajeto da minha casa ao aeroporto na cabeça. Eu sabia que teria de sair do prédio, virar a direita e seguir. Mas, na minha cabeça, eu virava de novo e de novo e voltava pra casa.” Quem conduziu o carro aquele dia foi Raimundo Espinheira, o Dito, o amigo de mais de 20 anos que virou assistente pessoal e hoje é padrinho de Marcelo.
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Para Ivete, a maternidade virou o tabuleiro das prioridades, em todos os aspectos. Inclusive no que diz respeito ao corpo. Nos meses seguintes ao nascimento, ela fez shows com roupas que não tentavam esconder o corpo acima do peso habitual. “Aquele era o meu momento, não queria pensar em emagrecer. [Correr para voltar à forma] é loucura! Pode parecer arrogante dizer isso, mas sou cantora [enfatizando]. O que me liga às pessoas é o meu canto, a minha voz, não a minha aparência.” Ao longo do processo natural que a levou de volta ao shape pernão, bundão, cinturinha, Ivete declarou inúmeras vezes se sentir gostosíssima e não se escondeu das câmeras nem dos palcos.
Ela se esforça para preservar dos flashes o marido, o nutricionista de atletas Daniel Cady, 27 anos, e, em especial, o filho, Marcelo. Não “apresentou” a criança em capas de revista nem chamou a imprensa para seus aniversários. As pouquíssimas fotos dele foram feitas por paparazzi, de longe. “Eu recebo o público com o maior prazer, mas não tenho o direito de fazer o meu filho passar por isso sem escolha”, decreta.
Por causa do filho, Ivete aprendeu a dizer mais “não” no trabalho. Prefere ficar numa média de oito apresentações por mês. A Caco de Telha não divulga números, mas três produtores culturais que já negociaram seus espetáculos apontam valores que vão de R$ 300 mil de cachê para shows abertos até R$ 1 milhão, para fechados, em empresas ou festas particulares. Depois de cantar, ela volta voan-
do – literalmente – para casa, acorda cedo para preparar a merenda do filho e levá-lo à escola. Quando não tem alternativa, condensa os compromissos e fica poucos dias fora. “Dois, no máximo. Três é suicídio”, confessa. “Choro de saudade, vou murchando, fico ruim pro trabalho.”
Voando por cima
Nos último dez anos, o poder da cantora aumentou, principalmente o de escolha. “Sou mais dona do que faço hoje”, diz à reportagem da Tpm, a bordo do seu jatinho particular, no trajeto Salvador- Recife, rumo ao show em homenagem a Gonzagão. A aeronave, modelo Citation Excel, tem gravado na cauda o logo com uma coroa de cinco pontas sobre as letras “IS”. “Ela comprou um usado, mas um modelo desse, novo, custa cerca de US$ 12 milhões”, diz Marco Sena, que administra o vaivém aéreo da cantora. Dentro do avião, sete poltronas de couro bege estão dispostas em duas fileiras. A largura dos assentos é quase o dobro da largura da aviação comercial, a fivela do cinto de segurança, dourada.
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No aeroporto de Recife, uma van preta de 11 lugares está à espera. Quando chegamos ao Chevrolet Hall, em Olinda, uns 40 adolescentes cercam o carro. Alguns pareciam ter nascido depois do lançamento de “Carro velho” e “De ladinho”, hits de 1998. Eles não conseguem enxergar através do vidro fumê, mas batem com força dos dois lados do veículo. Ivete mantém a calma, autografa CDs que os fãs estendem quando ela abre uma fresta do vidro.
Esses admiradores são uma boa amostra dos 7 milhões que seguem seu perfil no Twitter, o segundo maior do Brasil – menor apenas que o do jogador Kaká e maior que o do apresentador Luciano Huck, seu ex-namorado. Para os fãs, ela própria tuíta diariamente, posta fotos da sua casa e dá notícias do seu paradeiro. Poucos minutos antes de a van ser rodeada, tinha avisado: “To chegandooooo”. Depois, no camarim, completou: “Vou si maquilare”. Esta intimidade digital com os fãs ajuda a fazer de Ivete uma das garotaspropaganda mais disputadas do país. Em pesquisa encomendada pela revista Contigo! no primeiro semestre do ano ao Instituto Ipsos, em que foram ouvidas 6 mil brasileiras, Ivete foi o nome mais lembrado espontaneamente, depois da atriz Angelina Jolie e da amiga e apresentadora Xuxa. Para o mercado publicitário, as características positivas de Ivete são: não se meter em escândalos, saber se reinventar, ser sorridente e, mais do que isso, autêntica. Qualidades que, combinadas, resultam numa credibilidade poderosa.
Compre Ivete
Resta, aos anunciantes, contratá-la. Ivete tem parcerias de mais de dez anos com uma marca de sandálias e uma de coloração de cabelo. Com a última, encara o desafio de atrair “desde meninas de 16 anos, que começam a pintar o cabelo, até mulheres de 60, que pintam para esconder os brancos”, diz Danilo Pacagnella, gerente de marketing da Nutrisse, da L’Oréal. E completa: “Ivete funciona porque consegue se comunicar com todas as idades e classes sociais”. Só em comerciais de televisão em 2012, ela apareceu, até o início de outubro, 1.810 vezes e é a única cantora nesse patamar de exposição. No topo do ranking calculado pela consultoria Controle da Concorrência, em que Ivete aparece como 13ª colocada, estão a atriz Camila Pitanga e o jogador de futebol Neymar. O apelo da cantora atraiu há pouco a marca de lingerie Triumph, que a escolheu para o seu maior lançamento dos últimos cinco anos. Na empresa, espera-se que a linha assinada por Ivete responda por 20% do faturamento do ano.
Entre o que os marqueteiros costumam chamar de “ativos intangíveis”, Ivete tem uma característica que a torna mais interessante: a falta de papas na língua. Em qualquer conversa, é fácil perceber isso.
Ao falar, por exemplo, sobre a vontade de ter um segundo filho, dispara: “Quero engravidar de novo logo, e sabe o que estou fazendo pra isso? F****** muito [risos]. O que mais vou dizer, ‘fazendo amor’?!”, ri, entre um exercício de voz e outro. O comentário dá razão à amiga e cantora Preta Gil, que se diz menos desbocada que Ivete. “Ela foi criada com muitos irmãos, viajava com músicos. Tem uma coisa mais máscula de falar bobagem, de ser extrovertida mesmo”, entrega. Preta a conheceu quando ainda trabalhava em produção cultural. “No momento em que quis largar tudo para cantar, ela me emprestou o estúdio na casa dela e fiquei morando lá por três meses.” Orgulhosa da amiga, foi a Nova York e chorou durante todo o show do Madison Square Garden.
New York, New York
É só citar esse show, aliás, que Ivete enrola a língua para falar “the book is on the table”. “É glamour, é Nova York. Do ponto de vista da vaidade, é jogar você no crime.” Além disso, o espetáculo foi visto pelo filho, então com 11 meses. “Estava passando o som no piano e vi que ele estava na plateia, com meu marido. Veio tanta coisa na minha cabeça, pensei: ‘Que foda, o cara tá ali me assistindo’. Me deu essa vontade de me exibir mais para que ele me veja.”
“O preparo vocal dela é de um nível técnico absurdo. É das maiores cantoras do país. E isso não é gosto, é fato” Marina Lima, cantora
Enquanto as homenagens ao rei do baião animam o palco, o cantor sertanejo Luciano chega correndo aos bastidores e pergunta esbaforido aos produtores do show, que assistem ao penúltimo capítulo de Avenida Brasil: “A Carminha pegou o Tufão?”. Ele e o irmão Zezé também haviam sido convidados para a homenagem a Luiz Gonzaga, mas foram chamados ao palco bem na hora da novela. No camarim de Ivete, no entanto, as atenções estão voltadas para outro folhetim.
A cantora está contando como se preparou para fazer a cena do enterro do coronel Ramiro, o amor bandido de Maria Machadão, personagem de Ivete na minissérie Gabriela, que terminou no fim de outubro. “O diretor me disse que era uma cena de muita concentração. Saí de perto do [Antônio] Fagundes, que já estava maquiado de defunto, fui pro meu canto e refiz na minha cabeça a história deles dois, que não podiam assumir aquele amor. E sabe no que pensei? No dia em que enterrei minha mãe [que morreu em 2001, quando Ivete tinha 29 anos]. Eu olhava para ela e pensava que nunca mais ia vê-la fisicamente. Foi forte demais. Quando ele disse ‘ação’, chorava de não conseguir me controlar”, lembra. Entrar de verdade numa novela foi, segundo ela, apaixonante. “Foi demais. No início, eu chegava no set toda solta, rindo, e os atores estavam sérios, compenetrados. Aprendi a me concentrar.”
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Diz isso e lembra, aliás, que é hora de se concentrar para cantar: passa da meia- noite, hora de Ivete se despedir dos convidados do camarim. Sai escoltada por três seguranças e encontra Elba Ramalho na coxia. Dali mesmo, começam a cantar “Xote das meninas”, clássico de Luiz Gonzaga. Quando sobem ao palco, justamente no refrão “ela só quer, só pensa em namorar...”, a plateia vem abaixo. No final do show, a van de Ivete está estacionada na saída mais próxima ao palco. A cantora sopra beijos para o público e parte rumo ao aeroporto, a Salvador, ao filho, Marcelo.
GRANDE IVETINHA O jornalista e escritor Nelson Motta relembra o primeiro encontro com a cantora Quando Ivete apareceu, eu morava em Nova York e a acompanhei de longe e nas idas ao Brasil. Adorei de cara, a morena era tudo de bom, diferente das outras crooners de trio elétrico, uma nova linhagem de cantoras metade atletas e metade artistas. A pedido do amigo Marcelo Castello Branco, presidente da Universal, recebi a Ivete na primeira viagem dela a Nova York, em 1994. Fomos almoçar na churrascaria brasileira Plataforma, na rua 47, onde encontramos o João Marcello Bôscoli. No outro dia pedimos comida mexicana na minha casa, passeamos pelas ruas, ela interessada em tudo, inteligente, espontânea. Ficamos amigos. Além da grande voz e de todos os requisitos musicais necessários o que lhe dá poder é sua personalidade única. Une uma grande força e virilidade à extrema feminilidade: homens, mulheres e gays adoram. Tem uma espontaneidade que todos percebem como genuína e autêntica: pode falar qualquer barbaridade que ninguém se choca e se ofende, todo mundo se diverte. Mas ela é inteligente, não se mete em assuntos que não conhece. Apesar de poderosíssima, nunca parece pretensiosa nem autoritária como muitas estrelas. Tudo em Ivetinha é grande: a voz, o pernão, o peitão, o bundão, o humor, a simpatia. Não é só axé. Ela canta muito bem baladas românticas, soul (começou como cantora de soul), sambas, MPB, mas a minha música favorita de seus últimos discos é “Corazón partío”, junto com Alejandro Sanz. É sensacional! A última vez que a vi, há alguns meses, estava caminhando de manhã pela orla de Salvador com minha nova namorada, quando passou um carro e ouvimos um berro: “Gostooooooooso!!!”. Olhamos e era ela, às gargalhadas, acenando. Me deu a maior moral com a namorada, estamos juntos até hoje... Grande Ivetinha. |
“Um Pelé, um Roberto Carlos” Em seu recém-lançado livro de memórias, a cantora Marina Lima tece elogios à baiana Quero comentar algo a que assisti e que me deixou muito impressionada: o especial da Ivete Sangalo no fim de 2011, na Globo, com Caetano e Gil. Tenho a impressão de que Ivete é a artista mais popular que o Brasil já teve. Parece que ela já atingiu o nível de um Pelé, de um Roberto Carlos. Uma unanimidade. E ninguém me obrigou a gostar da Ivete. Na realidade, gosto é de música. Não importa se vem da rua, da Bahia, da burguesia ou mesmo da esfera clássica. Não é, de cara, essa a minha preocupação. Então, diante de tanto sucesso, a Ivete tinha tudo para não evoluir – e ficar numa zona de conforto. Podia se acomodar, afinal a mulher é quase uma lenda. Mas percebi que ela fez justo o oposto. Ivete foi estudar música! E o resultado é o seu crescimento como cantora. O preparo vocal dela, hoje em dia, é de um nível técnico absurdo. É das maiores cantoras do país. E isso não é gosto, é fato. É muito bacana não se preocupar somente em ser a mais popular. O seu desejo é maior, existe uma ambição artística. Ela tem o dom natural? Tem. Mas resolveu contar só com isso? Não. Ela investiu no aprimoramento para brilhar ainda mais. Vai lá: Maneira de ser, ed. Língua Geral, R$ 53, em novembro nas livrarias |
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FOTO MARCELO NADDEO/DEIXE SEU RETRATO (A foto foi clicada pela própria Ivete, com a ajuda de um disparador fotográfico)