por Clarice Machado

Documentário feito por estudantes relata a grife e aproxima as prostitutas da sociedade

Um documentário que exalta as putas, literalmente, e sem firulas. Cinco estudantes de jornalismo resolveram fazer disto o seu trabalho de conclusão de curso e despertaram para uma realidade que achavam que conheciam. Orgulho, família, sexo e doenças foram só algumas das coisas com as quais se chocaram no caminho. Conversamos com Heloísa de Oliveira, Arthur Anderman e Marília Kodic que juntos com Rodrigo Russo e Nathália Butti estão fazendo o documentário Daspu: Moda Para Dar e Vender (título ainda temporário).

Desde o início, os cinco sabiam que a escolha do tema seria mulher, mas não conseguiam definir exatamente o que abordar dentro deste universo. Escutaram que falar qualquer coisa sobre mulheres é batido, mas nem o desinteresse generalizado, nem o preconceito dos pais pelo tema escolhido, a prostituição, os desanimou.

A ONG Davida surgiu em 1992 para informar profissionais do sexo sobre seus direitos civis e saúde, exercendo um papel fundamental na socialização dessas mulheres. A Davida abriu as portas para que os estudantes conhecessem o universo da Daspu, grife que existe desde 2005, cujo principal intuito é arrecadar fundos para a ONG através da confecção de roupas sensuais, provocativas e inteligentes feitas por estilistas profissionais.

Dispostos a viver todas as experiências que auxiliassem no conceito do filme, os jovens paulistanos viajaram para o Rio de Janeiro em busca destas mulheres que tanto os interessavam. Entre passagens curtas e estadias mais longas, em uma das vezes ficaram cinco dias num intensivão Daspu, quando puderam ver e ouvir de perto as histórias inacreditáveis destas heroínas.

Gabriela Leite, criadora da ONG e da grife, Val, Maria, Nilza e outras mulheres são retratos deste documentário que aborda com sensibilidade questões sociais, pessoais e profissionais, discutidas com a abertura e profundidade ideais para que a sociedade aceite ou simplesmente entenda algumas dessas coisas.

Por mais difícil que seja não julgar, é preciso frisar que elas são muito felizes e têm orgulho de suas profissões. Mas também não há como ser hipócrita e dizer que tudo são flores. A principal diferença entre a Davida e outras ONGs que se destinam tratar da prostituição, é que todo mundo acha que a solução é tirar as mulheres das ruas, mas quando a conversa chega aqui, Marília prontamente diz: "Você já perguntou se elas querem?".

A equipe do documentário fez essa pergunta e todo o processo de pesquisa os ajudou muito a entender que as mulheres nem sempre querem ser tiradas da rua mas, mesmo assim, merecem respeito de todos. Muitas conseguiram criar e manter uma família equilibrada, educar os filhos - tantas vezes em escolas particulares -, e dar-lhes tudo o que precisam do básico e às vezes até o luxuoso. É o que os integrantes do grupo gostam de chamar de prostituição com um propósito.

Segundo o trio de documentaristas relata, a prostituição para as mulheres da Daspu nem sempre vem como última opção para uma vida sofrida mas muitas vezes está ligada à liberdade - ou a sensação de. Não só a liberdade sexual, mas também da profissional e pessoal; um trabalho sem horários (ou mais noturno que diurno), que permite às mulheres ter uma outra profissão ou estarem mais próximas de suas famílias nas horas vagas e sobre o qual na maior parte das vezes não precisam se justificar a ninguém. Muitas são casadas, amam suas famílias, e de tudo fariam por elas.

Respeito

O documentário retoma a Daspu e suas mulheres que, depois do boom em 2005 na mídia envolvendo a grife Daslu, ganharam o mundo e o respeito de muita gente. Embora no Brasil elas possam ser vistas como vulgares e oportunistas, no exterior são vistas quase que como celebridades, são bem tratadas e adoradas. E por aqui ainda assistimos boquiabertos ao lançamento de cada nova coleção, com o respaldo de formadores de opinião.

Os estudantes entrevistaram pessoas que de alguma forma estão envolvidas com o tema tratado no filme. Lilian Pacce, jornalista de moda, Hilaine Yaccoub, antropóloga, Otávio Mesquita, apresentador (e um dos primeiros a mostrar a Daspu na TV), e Fernando Gabeira, político que tem um Projeto de Lei em favor do reconhecimento da prostituição como atividade profissional, são alguns dos nomes que contextualizam a discussão.

O filme saiu do bolso dos estudantes, sem apoio ou pa(i)trocínio , está em processo de finalização e será entregue em novembro deste ano, quando e equipe passa pelo desgastante processo de banca e aprovação na faculdade onde estudam (Cásper Líbero). E eles acabam de fechar uma parceria com uma produtora.

A complexidade do modo de vida destas mulheres e todas as contradições que as envolvem é um universo a parte, bem distante da nossa imaginação. Vai ser ser possível desmitificar pelo menos um pedaço dele com o trabalho de Heloísa, Arthur, Marília Kodic, Rodrigo e Nathália.

Para acompanhar o processo de lançamento do documentário, fique de olho no Twitter @Doc_Daspu.

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