Sou por menos Rivotril e mais carinho. Com cinco reais se compra um abraço químico
O mais simpático dos tarja preta, de preço acessível e sabor doce, o Rivotril é, segundo dados da IMS Health, o segundo remédio mais vendido do país. Há anos, nós, brasileiros, estamos na pole position de seu consumo mundial. O medicamento não trata apenas distúrbios de ansiedade, mas também epilepsia e esquizofrenia. Posto que não somos uma nação de epiléticos ou esquizofrênicos, me pergunto se somos a pátria dos aflitos, fóbicos e angustiados.
Mas o existencialismo não nasceu nos trópicos. Aqui, o xarope da paz só perde em números para a pílula anticoncepcional. O que soa como uma contradição em termos. Ou não. O sexo que relaxa o corpo não necessariamente tranquiliza o coração. Como as pesquisas apontam que o brasileiro tem um dos regimes sexuais mais vigorosos do mundo, de fazer franceses babarem de inveja e britânicos bocejarem de tédio, fico com a sensação de que o excesso de Rivotril fala de escassez de amor.
Mais amor, por favor
De sexo com amor – a forma que humilha todos os outros tipo de sexo. De amor dos médicos para com seus pacientes, ao abrir sua escuta sem pressa aos problemas do outro, e medicá-los, se for o caso. Sou por menos Rivotril e mais carinho. Fornecer uma receita fácil e com cinco reais se compra um abraço químico, não. Sou por encarar com madureza as angústias, os ritos de passagem, as dores do crescer. Isso é um gesto de amor para com a própria humanidade. Retira de sobre a realidade o manto de poder ilusório que nos protege do desconcertante contado (contato) com a fragilidade. Vulnerável também pode ser bonito. Cicatrizes enfeitam a pele. Sem medo da dor, ama ao próximo como a si mesmo. E ouça a canção “Tempo de Amor”, com letra de Vinicius de Moraes, reembalada, recentemente, na voz de Seu Jorge: “Ah! Não existe coisa mais triste que ter paz e se arrepender e se conformar e se proteger de um amor a mais. O tempo de amor é tempo de dor. O tempo de paz não faz nem desfaz. Ah! Que não seja meu, o mundo onde o amor morreu”.
Antonia Pellegrino, 31 anos, é roteirista e escritora. Seu e-mail: a.pellegrino@terra.com.br