A novela pessoal de Mara Gabrilli com o fim de um relacionamento amoroso de sete anos
Estou sentindo dor, que chega ao físico quando sou dilacerada por alguns pensamentos. Eles me empoderam de uma licença, talvez islandesa, que deixa doer corriqueiramente.
Vivo o fim de um relacionamento de sete anos que sugere a impermanência de sentimentos.
Neste momento senti a “ousada leveza do ser” que um dia foi insustentável. Consegui me sentir melhor!
Passei um fim de semana tomando sol, vinho, comendo, dormindo, lendo e assistindo a conteúdos de mim mesma, para compreender melhor a situação.
Fui intercalando os imprescindíveis alongamentos que despertam ideias com comoção.
Cada onda que transitou por aqui ativou dispositivos, provocando variação no espírito e instigando mente e corpo.
Senti um movimento pelo coração que, sem métrica estabelecida, transformou dor em alívio, amor, tesão, frustração, desilusão, superação e malícia.
Estou jogando frases...
Descobri que o meu pescoço não vira para os lados o quanto eu gostaria. Pois agora vou alongar, alongar, alongar até enxergar bem atrás de mim, assim vou ver mais.
Me fazer entender
Incrementei excessivamente meus exercícios peitorais e de braços, por conseguinte irei expandir e sustentá-los e ainda receber novos flashes na cabeça. Óbvio que as pernas não podem ficar de fora, pois são sustentáculos de tudo isso. Sempre exercito minhas pernas.
Você já percebeu que movimentos sempre me salvam?
Eu sei que por causa da dor estou um pouco fragmentada, misturando capítulos de uma novela que só passa na minha cabeça. Desculpe se estou muito hermética. Fiquei do tipo que crê que para uma relação sensual prosperar um deve ser o confortável objeto de desejo do outro. Careta?
Lembrei da novela real – Alinne Moraes tetraplégica. Eu fiquei em uma situação bem diferente da dela. Como depois do acidente passava pela minha boca um tubo para que eu pudesse respirar, eu não tinha nenhuma condição de ficar reclamando como ela.
Eu arriscava me fazer entender, mas pouquíssimos compreendiam. Meu irmão entendia e tinha uma enfermeira que também sabia o que eu estava querendo. A minha boca não fechava e eu emitia sons com tentativas de consoantes. Teve um cara “tipo amigo” que pediu para eu parar de falar, pois lhe dava aflição. Foi demais, eu naquela situação, presa no meu próprio corpo, emitindo sons como forma de sobrevivência e esse coitado ainda me pede proteção. A minha irmã fez algo do gênero. Em uma conversa, que parecia descontraída, em um momento familiar em Angra dos Reis, explicou para todos que aconteceu comigo a pior coisa que poderia acontecer a alguém. Naquele dia em que eu estava feliz por ter voltado às praias de Angra, percebi que ela não entendia nada de mim. Acredito que nada é pior do que ficar aprisionado dentro da própria cabeça. E isso pouco acontece comigo.
* Mara Gabrilli, 40 anos, é publicitária, psicóloga e vereadora por São Paulo. Fundou a ONG Projeto Próximo Passo (PPP), é tetraplégica e foi Trip Girl na Trip #82. Seu e-mail: maragabrilli@camara.sp.gov.br