A crise econômica pode ter passado, mas o mundo não é um eletrodoméstico autolimpante
Quando o verso do título acima foi feito e cantado pela dupla Simon & Garfunkel, em 1972, talvez se tratasse ainda de uma opção. Deixou de ser.
A crise econômica pode mesmo ter passado. E pode ter sido como o sintoma que tem seu pico, um momento agudo que evidencia que há um transtorno grave no sistema, e depois é naturalmente aplacado, sem que a enfermidade tenha de fato abandonado o organismo.
Quando isso acontece, a tendência é que o doente retome o tipo de vida que gerou o mal, sem que se dê conta. Você tem alguma dúvida sobre o fato de que estamos, em grande medida, vivendo de forma equivocada, acelerando demais, em direções erradas e, pior, nas mais das vezes, perdendo o controle da aceleração?
Os sinais estão por onde você quiser. No uso desenfreado e suicida dos recursos naturais, nas doenças do aparelho circulatório que vão implodindo populações em todas as faixas de rendas, latitudes e idades, nos olhares que não se fixam mais durante as conversas, passeando ansiosos pelas órbitas esquizoides de seus donos, nos fluxos inadministráveis de informações irrelevantes, nas relações humanas que vão escorrendo lentamente para o décimo plano das nossas prioridades, na competição burra e doente pela acumulação sem propósito ou um nexo real.
Se você acha que o mundo é uma espécie de eletrodoméstico autolimpante e que o negócio é correr pro abraço, talvez tenha comprado a revista errada. Se for este o seu caso, tire o terno do armário, sacuda a poeira e se jogue no fluxo novamente em busca do seu troféu. Se, ao contrário, você acha que a necessidade de repensar tudo está cada dia mais evidente, ou se pelo menos desconfia que há algo errado que precisa ser transformado, acelere para a próxima página. Você vai conhecer pessoas, lugares e situações que podem inspirar e contribuir para a sua tão necessária, desejada e, desculpe a pressa, urgente reflexão. Desaceleração é evolução.
Paulo Lima, editor