Inspirada pelo Marco Civil da Internet, 'Plataforma Brasil' discute reforma política no país

por Lia Hama

Novo site deseja pensar, conversar e criar coletivamente políticas públicas com a participação da sociedade pela web

Quando o Marco Civil da Internet (lei que regula o uso da web, com os direitos e deveres dos usuários da rede) foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff em abril do ano de 2014, o criador da rede mundial de computadores, Tim Berners-Lee, elogiou a iniciativa brasileira. "O Marco Civil foi criado por seus usuários, um processo inovador, inclusivo e participativo que resultou em uma política que equilibra os direitos e responsabilidades dos indivíduos, governos e corporações que usam a internet", afirmou ele às vésperas da aprovação da lei. Lee se referia à forma participativa como o texto foi elaborado, com um amplo processo de colaboração pela internet de empresas, governo, terceiro setor, usuários, programadores e interessados em geral.

Agora, alguns dos responsáveis pelo Marco Civil querem usar a experiência para discutir políticas públicas no páis. Na segunda-feira, 4 de maio, o Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-Rio) lançou a Plataforma Brasil, uma ferramenta para a discussão popular sobre a criação de propostas de leis e temas de interesse público. O primeiro assunto a ser abordado será a reforma política no país, com tópicos como financiamento público de campanha e voto distrital. "É um assunto de suma importância, que está avançando no Congresso sem que a sociedade brasileira tenha tido a oportunidade de participar do debate", afirma o advogado Ronaldo Lemos, colunista da Trip e sócio-fundador do ITS-Rio. A pedido da Trip, ele respondeu a perguntas sobre o tema.

Qual é o objetivo da Plataforma Brasil? Usar a tecnologia para melhorar a forma como são feitas as políticas públicas no país. A plataforma foi construída com base na experiência que tivemos como idealizadores do Marco Civil da Internet. Por sete anos, usamos a web para debater e articular o Marco Civil e o resultado foi muito positivo, tanto em termos de processo quanto de resultado. Com base nessa experiência, criamos uma plataforma que permite expandir essa possibilidade para outras áreas.

Que debate vocês imaginam provocar, dado o clima de forte polarização política no país? A plataforma é feita para superar essa polarização. Olhando para o debate político realizado por meio das redes sociais nas últimas eleições, a sensação é de uma enorme frustração. Foi um debate nada construtivo, que mais parecia briga de gangues. E, para piorar, um debate sem memória. Onde estão os registros de tudo o que foi dito? Desapareceram enterrados em milhares de timelines no Facebook. Estamos fazendo o contrário disso: um debate transparente, em uma plataforma com memória, que desde o início conta com a participação de vários setores: sociedade civil, academia, setor privado, setor público e cidadãos de modo geral. É um debate onde o conhecimento é cumulativo, aberto a dados empíricos e em condições de transparência. Algo raro no debate político.

Quais as semelhanças com o debate sobre o Marco Civil? Usamos a experiência do Marco Civil, mas de forma aperfeiçoada. Quando o marco foi debatido online em 2009, o Facebook não era relevante no Brasil. Hoje é uma peça central da esfera pública. Desse modo, a arquitetura do debate dialoga diretamente com ele, mas o debate acontecerá fora dele. Levamos um ano desenhando a tecnologia para construir o mecanismo de debate e priorização dentro da Plataforma Brasil. Vale a pena conhecer porque é um modelo poderoso. 

Quanto tempo demorou entre o início das discussões e a aprovação do Marco Civil da Internet? A criação do Marco Civil foi em 2007. A sua discussão online aconteceu em 2009. A aprovação final foi em 2014. Ou seja, demorou sete anos para ele ser aprovado. Com a Plataforma Brasil estamos fazendo diferente. O foco não é apenas projetos legislativos, mas sim a construção de políticas públicas. Uma vez construídas, elas serão monitoradas, cobradas e haverá interlocução direta com quem é responsável por sua implementação.

Como vocês garantem que a discussão seja relevante e de alto nível? Vocês têm parceiros fixos que participam do debate? Existe algum mediador? O elemento central da plataforma são as parcerias em torno dela, que são os pontos de partida. Por exemplo, para debater reforma política, nosso parceiro inicial é o IESP (Instituto de Estudos Sociais e Políticos), da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro). É uma instituição reconhecida na área, que garante um alto nível de discussão. Não é preciso concordar com as visões do IESP, mas elas servem como ponto de referência a partir de onde o debate será construído. A segunda etapa da plataforma será a reforma do sistema de segurança pública no Brasil, incluindo as polícias. Estamos conversando com lideranças nessa área para darem o ponto de partida. E temos um ombudsman: Manuel Thedim, economista reconhecido e fundador do site Vozerio.org.br. Sua função é acompanhar todo o uso da plataforma e funcionar como um "ouvidor" geral sobre sua utilização, garantindo que o debate siga em condições ideais.

Vai lá: plataformabrasil.org.br

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