Se despir, se apresentar da forma crua e vulnerável, virou um ato político. A força mais potente está dentro do gesto e do olhar mais suave, como o de Mariana Elek Machado
Outro dia, eu dei uma palestra, para a qual me convidaram para falar da beleza na fotografia. Aí lá fui eu, toda arrumada, com mil fotos das mil mulheres em mil estados de nu – e minha musa favorita estava ao meu lado. Mas não queria falar da beleza em si. Queria falar da fotografia como ferramenta da liberdade.
Hoje em dia, ser dona do próprio corpo virou um ato político, e se transformar e se afirmar faz parte de nossa história. Gosto da fotografia, gosto da técnica, gosto da vida que me proporciona, mas o que mais me encanta na fotografia são os presentes infinitos que você pode dar para outras pessoas – para suas musas, para as mulheres que você encontra em ilhas perdidas, para seus amantes, para sua família e, quem sabe, para você mesmo.
A minha amiga Mariana Elek Machado, Trip Girl meia década atrás é, hoje, por sorte, a curadora da minha exposição no Espaço Mira [em São Paulo]. Mariana me escreveu um texto que começou com a seguinte frase: “Existe um lugar onde somos engolidos e alimentados através dos olhos”. E talvez seja esse o ponto.
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A gente tenta proporcionar uma experiência que nos consome com a força da beleza e, através dessa experiência, nós, como seres humanos, somos alimentados pela força do momento. Na fotografia, somos alimentados por meio da força da memória criada. A fotografia virou uma coisa que pode criar um espaço saudável – e seguro – para as pessoas serem outras pessoas, ou melhor, para serem a versão mais verdadeira de si, para crescerem, e para mostrarem até para elas mesmas quem elas mais querem ser.
A SUAVIDADE E A FORÇA
Eu fui à palestra com a mulher da minha vida do meu lado para dizer a uma plateia de desconhecidos o quanto eu a amo e como eu vivo melhor através da beleza dela. Todos nós vivemos melhor e mais potentes através da beleza das nossas musas. Eu tenho três Marianas, tem a Érica, tem a Camila, tem a Luiza, tem a Maryam. Vejo que, quando você trabalha da forma como eu trabalho, não tem uma linha reta entre o trabalho e a amizade, entre a política e a arte, entre o sonho e a vida real. Roubei uma frase muito potente da Érica – “a beleza é inevitável” – para dar o título da mostra.
Parece um clichê dizer “musa”. Mas o nosso mundo está em um momento precário, o futuro do nosso planeta está num lugar inseguro, estamos precisando lutar novamente por nossos direitos e igualdades como mulheres e também como seres humanos. Se despir, se apresentar da forma crua e vulnerável, virou um ato político. Virou o meu ato político. E, às vezes, a força mais potente está dentro do gesto e do olhar mais suave.
Créditos
Imagem principal: Autumn Sonnichsen