Conheça os homenageados do prêmio GOL Novos Tempos 2019 – Priscila Gama, criadora do aplicativo Malalai, é a grande premiada
Em sua terceira edição, o prêmio GOL Novos Tempos reconheceu e homenageou projetos que, por meio de soluções e ideias inovadoras, promovem a democratização da mobilidade e facilitam o acesso ao que a vida pode ter de melhor.
Neste ano, Priscila Gama, criadora do aplicativo Malalai, foi a grande premiada. Mas várias outras iniciativas foram reconhecidas. Confira todos os homenageados abaixo:
Malalai
Alguns dos fatores que trazem segurança ao andar na rua são comércio aberto, postos policiais por perto, ruas iluminadas e prédios com porteiro. E ser homem. Pensando nisso, a arquiteta mineira Priscila Gama, 36 anos, criou a Malalai, app que mapeia as rotas mais seguras e permite alertar pessoas em caso de risco. O nome faz uma explícita referência à Malala Yousafzai, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz.
A ideia veio logo depois que o site Think Olga lançou a campanha “Meu primeiro assédio” e a arquiteta leu relatos assustadores, principalmente de mulheres violentadas na rua à noite ou em transportes coletivos e compartilhados. “Nenhuma mulher anda sozinha tranquilamente. Aprendemos algumas técnicas instintivas, mas precisamos de outras soluções”, diz ela, que lembra ter sofrido casos de assédio desde a infância. “A mulher negra é hipersexualizada, então, desde muito nova eu escutava comentários que não eram apropriados para ninguém, muito menos para uma criança.”
Decidida a fazer algo para mudar esse cenário, juntou a vontade de empreender com o conhecimento do programador Henrique Mendes, que se tornou seu sócio, e lançou o app em 2015. Desde lá, mais de 30 mil pessoas já utilizaram o serviço.
Além de mapear colaborativamente os lugares mais iluminados, com assédio recorrente e mandar SMS de alerta para contatos selecionados, o aplicativo ainda vai ter opções que acessem, via bluetooth, o número de emergência do celular e enviem o alerta sem a necessidade de manusear o aparelho. “Ter que se virar o tempo todo é algo inerente às mulheres e faz parte da minha essência. Foi isso que me deu coragem para criar a Malalai”, conta.
Remada ambiental
Jason Maciel se tornou ambientalista por acaso. Cansado da carreira corporativa que durou quase 15 anos, aproveitou o nascimento de seu segundo filho para refletir sobre o que gostaria de fazer. Em 2012, decidiu abrir uma escola de stand-up paddle no Rio Tarumã-Açu, afluente do Rio Negro, em Manaus.
Além de aulas de esportes aquáticos, Jadson passou a oferecer passeios em barcos de remo. Em um desses tours, ele percebeu que, antes de o dia raiar, todo resíduo sólido da redondeza era despejado nas águas do rio. O primeira pensamento foi determinante: era preciso recolher aquele lixo para fazer com que as águas ficassem limpas. Porém, menos de 24 horas depois, todo lixo estava ali de novo. Não seria tão simples assim acabar com a poluição.
“Já não eram mais remadas a passeio, eram a trabalho”, lembra. A irmã, ambientalista, o incentivou a criar um grupo com esse propósito. Assim, nasceu o Remada Ambiental. A primeira edição do projeto foi em maio de 2016 e hoje já são 42 expedições concluídas com sucesso – foram mais de duas toneladas de lixo retiradas do rio e 1.500 voluntários.
O empreendedor gosta de destacar que não faz nada sozinho, afinal, sem os outros, nada seria possível. “Nossa proposta é mostrar para a sociedade que temos uma
responsabilidade compartilhada.”
Trazer os comerciantes e valorizar a água como meio de transporte também são objetivos do Remada, que sai uma vez por mês. Se, antes, era impossível chegar a pontos do rio por causa do lixo, hoje, a água tem menos resíduo e a luta é por terminar com o derrame de esgoto. “Hoje, me considero um empreendedor social e é a melhor sensação que se pode ter.”
Eu vô
Pensar a mobilidade em grandes cidades é uma tarefa bem difícil. Quando o público é composto por pessoas acima de 60 anos e com movimentos reduzidos, a questão é ainda mais complexa. Foi dentro de casa que os irmãos Victória, 27, e Gabriel Abdelnur, 30, de São Carlos, no interior paulista, descobriram como ajudar. Após morar em São Paulo para fazer faculdade, Victória teve uma oportunidade de trabalhar em casa e voltou a morar com a mãe, que tem esclerose múltipla. Foi quando viu que a mãe, que trabalhava fora, precisava de auxílio para realizar coisas simples do dia a dia, como ir ao mercado ou a uma consulta médica. Victória passou a ser motorista da mãe. “Levava-a para tomar café com a tia, fazer compras ou exames e percebi, com isso, que ajudava ela a se sentir viva”, lembra Victória.
Logo em seguida, Gabriel também voltou a morar em casa e, juntos, os irmãos tiveram um estalo: a necessidade da mãe poderia originar um novo segmento de transporte por aplicativo. Estudaram, montaram o plano de negócios e, assim, em 2017, nasceu a Eu Vô. O serviço nasceu como uma página no Facebook que agendava corridas para idosos e pessoas com mobilidade reduzida. Além do transporte, o foco era o acompanhamento.
A procura foi tão grande que, em seis meses, eles criaram um aplicativo. Os motoristas – muitos com mais de 50 anos – são treinados por psicólogos e gerentólogos – é importante saber como se comunicar com esse público e como agir em certas situações. “Além de democratizar, o Eu Vô trabalha a inclusão. Quanto mais essas pessoas estiverem na rua, mais elas se sentem bem e mais os outros vão entender que tudo bem envelhecer e ter alguma doença.”
Kit Livre
Inconformado com as dificuldades pelas quais cadeirantes passam, Júlio Oliveto aproveitou seu mestrado em engenharia mecânica na Unesp para pensar em uma solução. Em 2011, criou um sistema capaz de transformar qualquer cadeira de rodas em triciclos motorizados e elétricos.
No ano seguinte, buscou empresas para licenciar a tecnologia e colocá-la no mercado e só então chamou o irmão, o administrador Lúcio, para desenvolver o modelo de negócio da empresa. Foi quando veio o primeiro desafio. “Ninguém acreditava na ideia. Achavam que colocaríamos os cadeirantes em risco”, relembra Júlio. De 2012 a 2014, o projeto, chamado de Kit Livre, ficou parado. Voltou com tudo depois de receber um investimento por meio de um concurso. “A ideia é ter um acessório que pode ser instalado em qualquer cadeira de roda manual para transformá-la em um triciclo elétrico. Com isso, damos autonomia para as pessoas que usam a cadeira de rodas”, explica.
O nome vem da liberdade que Júlio quer transmitir aos cadeirantes. “É sobre sentir o vento no rosto, sabe? Não precisar pedir ajuda para se locomover. Fazemos um trabalho emocional e, ao mesmo tempo, trabalhamos a mobilidade nas cidades. Afinal, ao conseguir circular por uma calçada esburacada, a pessoa ganha autoconfiança e autoestima”, ressalta.
Com o Kit Livre, a cadeira alcança 20 quilômetros por hora, velocidade muito maior que cadeiras de rodas normais ou motorizadas. Para continuar chegando a mais pessoas, Júlio conta que os próximos passos serão fazer parcerias com instituições para fornecer o Kit Livre gratuitamente. Segundo ele, para democratizar a mobilidade, é preciso trabalhar em um conceito amplamente difundido atualmente: o compartilhamento.
Colab
E se você pudesse fiscalizar, avaliar e propor soluções para os problemas da sua cidade? Foi pensando nisso que o recifense Gustavo Maia, 35 anos, criou o Colab, uma plataforma que conecta cidadãos e governo.
Publicitário especialista em marketing digital com ênfase em política, ele sempre quis empreender. Mas, foi só em 2013 que ele começou a explorar esse universo profissionalmente. “Percebi que faltavam ferramentas de tecnologia que pudessem proporcionar uma boa gestão do governo e engajassem as pessoas a a construir uma sociedade melhor”, conta Gustavo. O Colab é um aplicativo e uma rede social para que qualquer pessoa, de qualquer cidade, possa publicar reclamações de caráter social. “A ideia é criar uma integração cada vez maior entre cidadão e poder público”, explica ele.
Logo no começo, a plataforma ganhou o prêmio App My City de melhor aplicativo urbano do mundo e Gustavo conseguiu expandi-la para todo o Brasil. Outro fator que impulsionou foram as manifestações de junho de 2013. “Imagina ser um governante e perceber que, enquanto o povo está tacando fogo nas ruas, uma startup nasceu para criar uma relação mais direta entre cidadão e governo?”, pergunta o empreendedor. Assim, o Colab passou a ter prefeituras como clientes. Com todas elas, a maior reclamação são os buracos nas vias.
Por expor os problemas a quem quiser ver, muitos governantes não gostaram do Colab. “Mas o buraco está na rua, não no aplicativo. A gente trabalha para que isso fique visível”, brinca . Escancarando problemas como buracos, mato alto e descarte irregular de lixo, o Colab busca ajudar as pessoas a circularem por suas cidades. “Acredito que o futuro dos governos é mais colaborativo”, diz o criador do Colab.
Créditos
Imagem principal: Zé Otávio
Texto: Camila Eiroa