Veterano da comunicação relembra suas origens no rádio e o início da Globo, que ele ajudou a transformar na maior televisão brasileira
“Sou adepto de uma coisa fundamental: a emoção. Não há vida, nem trabalho, nem qualquer coisa sem emoção”, diz José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni. Aos 89 anos – 73 deles dedicados à televisão –, o veterano da comunicação relembra no Trip FM suas origens no rádio e o início da TV Globo, que ele ajudou a transformar na maior emissora brasileira. “Roberto Marinho foi um visionário, mas aquilo não existiria se não fosse a presença do Walter Clark, do Joe Wallach e minha. Nós construímos do zero", conta.
Num papo com Paulo Lima, o ex-vice-presidente da Globo reflete sobre a essência da televisão – que, para ele, deve ser o mais distante possível de uma empresa tradicional. “Se você lidar com artistas como se estivesse administrando um banco ou uma fábrica de linguiça, está perdido. A televisão é uma indústria, mas um artesanato ao mesmo tempo. O conteúdo precisa ter emoção, porque é isso que conecta o público.”
Além de falar de seu livro, “O Lado B de Boni” (2024), que revela bastidores e histórias inéditas de sua trajetória, ele comenta os desafios da educação no Brasil e a necessidade de preparar os alunos para a vida de forma prática e significativa. Você pode ouvir esse papo no play aqui em cima ou no Spotify.
Trip. Você me parece alguém que tem ao mesmo tempo uma vertente racional e um lado de quem enxerga o sonho. O que é mais natural para você, o campo da arte ou da organização?
Boni. Ficção é muito mais prazeroso: você pode imaginar e fazer o que quiser. A realidade é mais dura. Eu sou um operário, operário de colocar de pé o sonho, fazer ele acontecer. Não há vida sem emoção em nenhum campo, nenhum trabalho, nada que a gente faz, nem na vida da gente. Eu sou emotivo, Eu é um cultivador da emoção por excelência.
Você diz que faltou um pouco de carinho da TV Globo quando o deu "um pé na bunda", como você mesmo diz. Foi isso mesmo? Toda empresa precisa mudar seus executivos, mas, quando eu saí da TV Globo, eu esperava algo mais importante do que gratidão: o reconhecimento pelo que foi feito. Nós construímos aquilo do zero. Roberto Marinho foi um visionário, mas, se não fosse a presença do Walter Clark, do Joe Wallach e minha, aquilo não existiria.
Você acredita que sua forma de gerir a TV Globo incomodava algumas pessoas? Esse clima fantástico que eu criava na TV Globo incomodava, principalmente algumas pessoas de cima. Eles achavam que nosso negócio era muito paternalista. Mas como é que você pode lidar com os artistas se não for paternalista? Como é que você pode respeitar essa classe maravilhosa? Como é que você pode conviver com essas pessoas? Se você tiver a mentalidade de uma fábrica de linguiça ou de um banco, como vai administrar artistas? Não é administrar bancários, é uma coisa muito diferente. Não é fabricar salsicha, não dá nem para encher linguiça! Eles queriam ter uma empresa mais parecida com uma empresa tradicional. Mas a televisão, no meu entender, tem que ser o mais distante possível de uma empresa, porque, embora seja uma atividade industrial, é um artesanato, uma indústria artesanal.
Créditos
Imagem principal: Renan Olivetti (@olivetti)