O ator e cantor, que acaba de lançar seu quarto disco, fala sobre o peso da fama, o preço de expor suas opiniões, reacionarismo, terapia e família
Alexandre Nero, assustado com a normalização da violência e cansado de receber ameaças, tem segurado o ímpeto de participar do debate político. Vez ou outra, porém, acaba deixando escapar uma opinião a contragosto: “Já não tenho esperança de que o Brasil seja o país do futuro, mas se tirar o Jair já melhora.”
A dificuldade de lidar com a fama não é algo que o ator esconde. Desde que interpretou o Comendador na novela "Império" e explodiu em popularidade, a questão tem sido um incomodo. Nero inclusive aponta o parceiro de atuação Chay Suede como alguém que lidou muito melhor com a superexposição, apesar de ser mais novo.
Mas Alexandre Nero continua evoluindo e coloca a terapia como um pilar importante para isso. Pai mais velho, aos 45 anos, e muito presente, a psicanálise foi também um mecanismo para melhorar os ímpetos de raiva que a rotina estafante da criar uma criança podem trazer.
Além da vontade de tratar a mente, a paternidade trouxe a vontade de cuidar do corpo. Com dificuldades de segurar o filho quando nasceu, Nero começou a malhar. Hoje, se sente saudável mas admite que – apesar de completamente moldado aos padrões de beleza – tem uma luta diária com a alimentação: “Esse papo de só é gordo quem quer é uma sacanagem. Existe uma questão também que se fala muito pouco que é a grana. O padrão de beleza tem a ver com grana: academia, personal trainer, plano de saúde, dentista, nutricionista, shampoo certo”.
Nascido em Curitiba, filho do meio entre duas irmãs, o ator foi morar em São Paulo quando mal andava, e cresceu em bairros como Paraíso e Pacaembu. O pai, engenheiro agrônomo, trabalhava como gerente de vendas numa empresa têxtil. A mãe, dona de casa, morreu, de câncer, quando Alexandre tinha 14 anos; o pai se foi dois anos e meio depois, vítima da mesma doença.
Aos 17 anos, o órfão tímido que havia buscado na música uma forma de ser notado pelas garotas não tinha muito o que fazer em São Paulo com seu diploma de técnico em agronomia, obtido com três anos “muito felizes” em um colégio interno no interior de Minas Gerais. Foi morar em Curitiba com um tio e, dois anos depois, se jogou na vida de músico da noite, morando em pensão e se misturando à cena local de artistas e boêmios. “Eu como curitibano sou Tom Jobim, Vinícius de Moares, Milton Nascimento, Caetano, mas o resto do Brasil não é Paulo Leminski, Dalton Trevisan, Grupo Fato, Beijo AA Força. Eu tenho algumas armas que a maioria das pessoas não tem.”
É desse mistura de referências que saiu o mais novo disco do ator, com participação de Milton Nascimento e Elza Soares, e cordas de uma orquestra russa. “Quartos, Suítes, Alguns Cômodos e Outros Nem Tanto” é o quarto álbum de Nero e, como ele, o seu mais maduro até hoje.
Em um papo com o Trip FM, Alexandre Nero ainda falou de Rio e Janeiro violência e política. Confira no play ou leia um trecho abaixo.
Como você enxerga o futuro do Brasil para os seus filhos?
Alexandre Nero. Eu cansei de falar que não sou otimista. Infelizmente eu sou um otimista, eu tenho a fé de quem acorda e vai para mais um dia de trabalho. Lançar um disco é um ato de fé. Tirar esse cara já melhora, não tem como. Agora, essa esperança de que o Brasil é o pais do futuro eu já perdi. É muito fácil enganar o povo.
Como alguém contratado da Globo, como você vê essa sacudida dos últimos anos no mundo da comunicação e do entretenimento, com os canais de streaming ganhando força? As plataformas de streaming não me assustam muito. Nunca me senti empregado de algum lugar. Sempre achei que a Globo não me aguentaria por muito tempo. Tá me aguentando, mas não será novidade o dia em que isso acabar. O que é assustador é o cenário geral. Com a pandemia, o teatro parou, com pessoas passando fome. Quanto tempo isso vai demorar para retomar? Profissionalmente, é sempre muito bom ter várias opções de plataforma e a Globo também esta antenada e muito forte neste mercado online. A Globo conhece o Brasil como ninguém. Tem um know-how ali que é impressionante.
Você aparece em uma foto do disco novo sem camisa, com o corpo em forma. Mas também já ouvi você falar que tem dificuldade com a alimentação. Como é essa questão hoje? Esse papo de só é gordo quem quer é uma sacanagem. Eu sou compulsivo: tenho problemas psicológicos com a comida. Com o tempo aprendi os truques: não ficar sentado muito tempo à mesa, não comer o primeiro chocolate... Existe uma questão também que se fala muito pouco que é a grana. O padrão de beleza tem a ver com grana: academia, personal trainer, plano de saúde, dentista, nutricionista, shampoo certo.
Créditos
Imagem principal: Priscila Prade / Divulgação