Os velhos clichês que insistem em te padronizar em um tamanho de manequim
O Inmetro, tadinho, não sabe o que é manequim 38.
Por isso, 38 numa loja pode significar 40 em outra ou até 36 no mesmíssimo endereço, seis meses depois. Ainda falta padronizar com quantos centímetros de busto, cintura e quadril se faz uma numeração.
Você, porém, sabe bem. Trinta e oito é o número mágico que representa o corpo perfeito. Corpo perfeito, você também sabe bem, é aquele que não é o seu – que sempre será mais magro ou mais gordo do que o ideal, nem que seja na panturrilha.
Anota aí: “O corpo ideal é irreal”, como enfatiza a psicanalista inglesa Susie Orbach na reportagem “Eu não visto 38. E daí?”, a partir da página 46.
Aliás, a partir de 46 você entra no terreno dos “tamanhos especiais”.
E, antes que eu me esqueça, “plus size” é o escambau.
Pior que isso, é um eufemismo – aquela figura esquálida de linguagem, como você lembra das aulas de português, que tenta amenizar uma ideia supostamente desagradável.
Mas como uma característica de quase metade dos brasileiros pode ser desagradável? Afinal, de acordo com o IBGE, 48,5% da população está acima do peso. São mais de 92 milhões de pessoas.
Opa, “acima do peso” também tem um quê de politicamente correto. Se “magro” não é palavrão, por que “gordo” deveria ser?
A ativista norte-americana Marilyn Wann, autora do blog Fat! So?, defende um papo reto: “Gordo é uma palavra simples. Está coberta de significados negativos, mas se você começar a usar vai tirar dos outros uma arma poderosa para magoar você”.
G****, não. Gordo. Sem ofensa.
Claro que “gorda”, no feminino, traz mais problemas do que “gordo”.
Cena real. Três amigos falam de mulher. Papo vai e vem, e um deles vaticina: “E a fulana, hein? Engordou...”. Atenção, seria preciso ressuscitar o Fernão de Magalhães para circum-navegar o globo abdominal do autor da frase. Mas isso parece irrelevante para ele.
Embora existam mais homens gordos do que mulheres gordas, para elas o fardo (ainda) é mais pesado de carregar. Naomi Wolf explica. “Dieta e magreza se tornaram preocupações femininas quando as mulheres do Ocidente conquistaram o direito de votar, em 1920”, escreve em O mito da beleza. “A fixação cultural pela magreza feminina não é uma obsessão sobre o corpo da mulher, e sim uma obsessão sobre a obediência da mulher.”
Falando em dieta, só mais quatro pequenas porções de informação para encerrar a conversa:
1) A ONU risca em 1.800 calorias/dia a linha abaixo da qual um ser humano deve ser oficialmente considerado faminto.
2) As mulheres mais miseráveis dos países mais desgraçados do planeta, aqueles que só chegam às manchetes depois de pelo menos 10 mil mortos, ingerem em média 1.400 calorias por dia.
3) A dieta do momento, o “macarrão milagroso” (você leu certo, mas o macarrão em questão é um tipo absolutamente insosso, com 97% de água em sua composição), propõe apenas 1.200 calorias por dia.
4) Se dieta funcionasse, só seria necessário fazer uma vez. E assim a indústria do emagrecimento não movimentaria US$ 60 bilhões por ano. Isso apenas nos Estados Unidos. Mas a gente chega lá.
Fernando Luna, diretor editorial