Millos Kaiser, da Trip, entrevista sua fofa conterrânea carioca Mariana Caldas, da produção
Estava lá eu, vítima daquele bullying saudável que é praxe quando se é novo numa empresa (e é maior ainda se você for estagiário), quando me apresentaram a Mari: “Carioca, tem uma conterrânea sua aqui”.
Foi só a pequena abrir a boca para me cativar. Quem a conhece sabe que a Mari tem um jeito todo particular de se expressar, um misto de carioquês forte com uma meiguice que nem ela resiste, tanto que fala sempre sorrindo. E, apesar dessa fofura toda, ou por causa dela, Mariana Caldas é mestre em resolver problemas e conseguir coisas, que é basicamente o que as meninas da produção da Trip, da qual ela é estagiária, fazem todo dia.
Segunda-feira passada, fomos os dois no El Guaton, aquele restaurante chileno aqui perto, para empanadas y cerveza. Lá descobri que a Mari já quis ser uma megaexecutiva, já foi punk rocker, não é a Adriana Calcanhoto, mas também ama “Cores de Almodóvar, Cores de Frida Kahlo” e sabe apertar uma bota de ski como ninguém.
*Por Millos Kaiser
O que te levou a fazer faculdade de jornalismo?
Para ser bem sincera, eu não sei muito bem. Decidi em algum momento do ensino médio que iria fazer jornalismo e ponto. Eu era uma dessas loucas que quer fazer tudo e achei que com jornalismo dava para fazer isso, conhecer mundos e pessoas.
Quando criança você queria ser o quê?
Eu queria ser executiva, que nem o meu pai. Queria ser daquelas bem matadoras, que usam saia com um corte enorme, salto altíssimo, com muito poder. Meu pai era um superexecutivo, diretor de marketing da Visa. E eu adorava papéis, anotações, assinaturas. Minha mãe também era executiva, antes de ser artista plástica.
Vestibular foi um terror ou passou tranquilo?
Eu não sei como passei, na real. Não fiz nada no meu terceiro ano. Era da comissão de formatura, esse era o meu pretexto para não ir às aulas. Não fui a nenhuma de física e matemática, por exemplo. Pensava: “tenho coisas mais importantes para fazer”.
Mas aí você passou para a Cásper Líbero e veio para São Paulo, deixando Friburgo, seus amigos, família e namorado. Como foi isso?
Foi complicado. Eu estava no auge da paixão, estava começando o namoro, tínhamos nem quatro meses juntos. Ele tinha pedido para namorar comigo na formatura, coisa de filme mesmo. Estudava com ele desde a quinta série, mas a gente nem se falava direito. O problema de São Paulo não era São Paulo, era o que eu estava deixando.
Mas foi só a faculdade começar que as coisas melhoraram, né?
Com certeza. Na primeira semana eu já fiz uma best friend, a Bubu (Bruna Bopp, estagiária da redação da Tpm). Hoje ela é minha melhor amiga da vida.
Foi através dela que você foi parar na Trip?
Foi. A Isa saiu da produção e a Bruna me indicou. E agora a gente trabalha uma do lado da outra. Já estou aqui faz seis meses.
Pra mim, você parece já ter nascido produtora. Você pensa em ser repórter também?
Eu entrei na faculdade a pessoa mais perdida do Brasil. Hoje em dia, eu quero ser repórter, juro. Tenho isso muito mais claro, sei o que quero. Aprendi a assumir pra mim mesma que gosto de escrever, mas foi difícil, rola um bloqueio. Já na produção, eu me sinto superconfortável. Posso passar vários perrengues que sei que, no fim, vou conseguir.
Sempre tive impressão que mulheres são naturalmente melhores produtoras que os homens. Você concorda?
Vocês são mais organizadas...
É, acho que é isso. A gente tem mais jogo de cintura também, mais paciência. Mas isso é lenda, qualquer um pode ser um bom produtor.
Desde que não seja eu, certo?
Mesmo você! Eu sou muito desorganizada fora do trabalho, mas na Trip eu tenho um compromisso, tenho que me organizar.
Você falou que fica bem feliz quando vê os resultados das pautas que você produz. Teve alguma que te empolgou mais?
Do boombox (“Radio heads”, publicada na Trip 181). Foi muito difícil, era uma logística absurda. Se desse algo errado, desandava tudo. Eram cinco personagens, todos morando longe, e 140 boomboxes espalhados em quatro casas. Eram duas kombis para pegar isso tudo e levar para o centro, para montar uma parede de rádios.
Uau. E perrengues, qual foi o maior?
Não teve nada ainda que tenha dado totalmente errado, mas na minha primeira produção rolaram vários estresses. Tínhamos combinado que faríamos a foto do Pelé, um Famoso Quem, em um galpão do Teatro Municipal, onde ele trabalhava. Na hora, a diretora não permitiu mais usarmos a locação, nem liberou o Pelé para dar entrevista. Pior: eu havia pedido um carro para mim, o Bruno (fotógrafo), o Pelé, a Isa (repórter) e a Camila (arte). Só depois descobri que o Bruno tinha uma assistente. E me mandaram um Uno. Um Uno! “Vou enfiar o Pelé no capô”, pensei. No fim, mesmo todo mundo apertadinho, deu tudo certo. Liberaram o Pelé e a gente fez a foto na rua mesmo.
Já rolou algum esporro da Adriana Verani (chefe de produção)?
Não, a Dri não dá esporro. Ela fala cantando quando está nervosa, só isso.
Você já viajou muito?
Sim, quando era criança, sempre com meu pai. Meu avô paterno é americano, então íamos muito para os EUA. Fui para Nova York, Califórnia, Flórida. Na primeira vez, eu tinha 5 anos, fomos para a Disney. Lembro bem porque descobrimos lá que o meu avô tinha Alzheimer. Mais velha, fui para Paris e Londres também.
No fim do ano passado, fiz work experience em Lake Tahoe, na Califórnia. Era demais, trabalhava na loja que alugava equipamentos, fazia snowboard todos os dias.
E o namorado?
Foi junto, ficamos quatro meses num quartinho de hotel. No fim ainda fomos para Nova York.
Você ficou rica?
Não, mas ele ficou. Era uma temporada de merda: pouca neve e os EUA na crise. Minha loja tinha muito empregado, só me deixavam trabalhar duas horas por dia. Era enlouquecedor. No fim, meu chefe me mandava ir embora e eu ficava lá ainda trabalhando. Agora posso dizer que sou ski tech, sei regular uma bota de ski. Nunca mais vou usar isso, mas é legal saber que sei fazer.
Rolavam aquelas festinhas típicas de work experience, com a galera enchendo o pote numa casa mínima?
Rolavam umas festas trash, numas casas fedidas, com peruano, argentino, mexicano... Aquele reggaeton bombando, maior doideira. Mas eu não tinha muita paciência. Tinha muita balada normal também, mas eu era menor de idade.
Falando em reggaeton, e música? Do que você gosta?
Tenho fases. Com uns 13, era punk rocker.
Jura? Mas punk rock tipo Ramones ou tipo Blink 182?
Mais Blink 182, tenho todos os CDs. E Green Day, Offspring, essas bandas da nossa geração. Era um movimento em Friburgo, todo mundo andava de skate, enchia a cara na rua, tinha show dos amigos todo fim de semana.
Seu primeiro porre foi aí?
Foi, de porradinha (Sprite com vodca), numa festa junina da escola. Eu tinha uns 13, 14. Fiquei bem bêbada, mas não cheguei a vomitar. Isso nunca aconteceu, aliás. Tenho essa capacidade de ficar bem louca, mas não passar mal.
Atualmente você escuta o quê?
Música boa de ouvir. Da minha época punk rock, sobreviveu só o NOFX. Amo samba, Cartola, Mart'nália. Gosto também de jazz, Billie Holliday. Já passei um bom tempo também escutando só trilha sonora. Adoro a de Alguém Tem que Ceder, com o Jack Nicholson, e de Antes do Pôr do Sol (Ela começa a cantar: “Let me sing you a waltz”...). Minha última paixão é o Gero Camilo, que descobri recentemente que faz música também.
Quem é Gero Camilo mesmo?
Um ator muito bom, artista completo, puta cara fodido. Ele é horroroso, do meu tamanho, cabeça chata, o perfeito anti-herói, mas eu amo ele. Quero fazer meu TCC sobre ele. Tenho essa coisa de descobrir alguém e ficar aficionada. Já rolou isso com o Travis Barker (baterista do Blink 182), com o Kurt Cobain e mais recentemente com a Mart'nália.
Filmes preferidos, dá para dizer?
Todos do Almodóvar, menos Má Educação. Amo a estética dos filmes dele, me faz bem. As cores são incríveis. Também gosto muito de Frida e de Antes do Pôr do Sol. Ah, e de A Vida dos Outros. Já viu?
Já. O filme é frio, duro...
É, exatamente. E tem aquela cena do clímax, quando o espião alemão escuta uma soneto sobre ser uma pessoa boa e a partir daí o filme muda todo. Genial. É daqueles filmes que te deixa pensando o resto da vida.
Mari, diz pra mim: de onde vem esse jeito meigo seu, tão comentado por todos?
Não sei de onde vem, acho que sempre fui assim. Mas meigo como, você diz? Dos outros quererem me apertar ou de eu apertar os outros?
Os dois. Você é bem apertável. No bom sentido, claro.
Todos os meus namorados sempre reclamavam disso. Acho que escolhi a dedo os caras mais ciumentos. Eles sempre falavam que eu dava mole pra todo mundo, que era simpática demais, pegava nos outros sem necessidade.
Sua mãe e seu pai são amorosos assim?
Isso é bem deles. Aliás, a única característica que os dois têm igual é essa: ambos são bem carinhosos. Meu pai é o maior porra louca, mas sempre foi megacarinhoso comigo. A gente dorme junto ainda e quando visito a minha mãe em Friburgo faço a mesma coisa. E olha que é uma cama de solteiro!
Eu li uma vez que gente que cresceu sem ser tocado, sem receber carinho, tem outras percepções de frio e calor. Tipo se o dedo está queimando, a pessoa demora mais para sentir. Inteligência corporal, sabe?
Sério?! Que legal. Faz sentido. Tem gente que você sente isso só pelo abraço, é todo duro. Acho que sou bem inteligente corporalmente então
Acho que é isso, Mari. Não sei mais o que perguntar.
Deu, né? Eu só falei aqui.
*Às vezes eu tenho a sensação que o Millos é meu amigo de infância. Não sei se é a minha enorme competência em lembrá-lo do que ele está esquecendo, já esqueceu ou vai esquecer. Ou se é a naturalidade com a qual ele sempre tenta me acalmar. Talvez seja só o seu sotaque, que me faz me sentir em casa. (Por Mariana Caldas).