O fim do estilingue

por Nina Lemos
Tpm #114

O estilingue foi banido por ser politicamente incorreto, mas crianças brincam de caveirão

Quando éramos crianças, os meninos brincavam de estilingue. Esse era um instrumento meio do mal, a maioria de madeira, usado para tacar pedra nos outros. Mas sua função inicial era a de matar passarinhos mesmo. Sim, era maldade. E não achamos legal que as crianças andem por aí assassinando aves. Mas acontece que o estilingue era um símbolo importante. O que seria do desenho do Menino Maluquinho, do Ziraldo, sem um estilingue, hein?

Procuramos o brinquedo vintage e politicamente incorreto para vender. Obviamente ele não existe mais. A não ser, claro, em sites de antiguidades, o que fez todas as pessoas que trabalham nesta revista (a média de idade vai entre os 20 e poucos e os 40 e poucos) se sentirem velhas. Sim. Aqueles revólveres iguaizinhos aos reais também saíram de cena. E foram substituídos por pistolas fluorescentes. Em sites de leilão, ainda é possível comprar um coldre de policial de couro por R$ 50.

De novo. Não daríamos de presente para nossos filhos, sobrinhos e afilhados instrumentos de matar passarinho e também não daríamos armas. Mas muito menos ainda: jamais daríamos um “caveirão”. Sim, o carro usado pelo Bope do Rio de Janeiro para invadir favelas (e temido pelos moradores) virou brinquedo febre no último Natal. Pensando nisso, a época do estilingue parece inocente. Quer uma prova? O músico Tatá Aeroplano, por exemplo, um sujeito pacato e sensível, já teve um. E guarda lembranças inesquecíveis.

“Durante muito tempo quis que meu pai comprasse um estilingue de tripa de mico que tinha na venda do seu Pedro, que ficava perto do nosso sítio. Um dia, ele se rendeu e comprou o tal estilingue já alertando que só era pra usar no sítio. Não me contive, saí da venda, peguei a primeira pedra que vi e soltei. A pedra pegou uma curva, entrou na venda e foi direto no balcão de vidro. Resultado: meu pai teve que pagar o balcão e eu tive o estilingue confiscado na primeira vez que usei. Muito azar.”

Não, essa não é uma história horrível de criança perversa. É uma história fofa. Por isso, sim, sentimos saudades do estilingue e das arminhas.

R.I.P., brinquedos de meninos pestes.

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