O dia que eu não levei uma maçã

por Ana Manfrinatto

De repente era o último dia de aula, só que sem tin-tin ou flores para a professora

 

De repente era o último dia de aula, só que sem tin-tin ou flores para a professora

 

Parece que foi ontem mas, de repente e faltando quinze minutos pro sinal bater, me dei conta de que aquele era o último dia de aula do curso de francês. Isso significa que o semestre passou voando e que a temida semana de provas chegou. Sussa, até aí tudo bem.

Mas naquele momento em que o relógio marcava oito horas e trinta minutos, o que passou pela minha cabeça soy loca por ti America foi: como é que ninguém marcou uma confraternização? Como é que ninguém fez uma vaquinha pra comprar flores pra professora?

Estava consternada. Não que eu quisesse fazer amizade no curso para adultos da prefeitura de Paris – até porque a melhor e mais antiga rede social do mundo, “amigos de amigos”, está dando conta do recado –, mas, né?

Queria ver aquelas pessoas (poloneses, egípcios, japoneses...) em um ambiente informal. Confesso, aliás, que um dos meus passatempos preferidos em sala de aula era tentar traçar o perfil da professora mesmo contando com pouquíssíma informação: migalhas de gestos, atitudes ou frases soltas que conseguiam ultrapassar a autoridade e discrição da docente.

Descendente de russos, casada com português e mãe de uma criança pequena, costuma usar saia plissada com meia grossa e bota de cano alto. Um frufru de veludo prende, em forma de meio rabo, os cabelos castanhos claros. Baixinha porém altiva. Altiva porém acessível. Uma excelente professora, enfim.

A altivez de Olga só parecia diluir quando ela abaixava para molhar uma esponja em um baldinho d’água para, então, limpar a lousa. Nesse momento ela desce do Olimpo, mesmo que por alguns segundos, e se assemelha um pouco mais a nós, reles alunos e mortais.

TRIMMM...

O sinal bateu, as pessoas vestiram seus casacos, levantaram e disseram “au revoir, bonsoir” como se aquela fosse uma quinta-feira qualquer. E eu, que tava MORRENDO de vontade de dar um beijo na professora e de dizer que eu aprendi um montão de coisas com ela; só consegui proferir um distante e tímido “obrigada por tudo, foi um prazer”.

Não, não levei uma maçã. Já o colega argentino foi o único capaz de driblar a barreira da defesa e correr pro abraço, digo, apertar a mão, da psôra. Gol da Argentina!

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