Glória e dinheiro

por Fernando Luna
Tpm #80

Ser alguém. Desde quando isso virou sinônimo de ser famoso?

Não quero ser alarmista, mas o mundo acabou. Os sinais estão aí. Primeiro foi a jangada de Dorival Caymmi sair pro mar, definitivamente. Logo agora, quando sua figura discreta e seus versos são necessários como nunca. Especialmente aqueles que dizem “pobre de quem acredita na glória e no dinheiro para ser feliz”.

Depois, a tiragem recorde da principal revista norte-americana de fofocas, com... a foto dos gêmeos de Angelina Jolie e Brad Pitt na capa. Sério. As celebridades de colo, recém-estreadas, fizeram a People vender 2,6 milhões de cópias.

(É sintomático: as únicas edições mais vendidas que essa foram as dedicadas à cobertura do 11 de Setembro e às mortes da princesa Diana e de Kennedy – o John, porque o Robert, menos fotogênico, deve ter encalhado nas bancas.)

E, finalmente, a prova definitiva do fim da civilização (ou fim da picada, vá lá) chegou esses dias por e-mail.

Não conhecia o remetente, é verdade, e ainda dividia a lista de destinatários com dezenas de outros jornalistas. Mas a curiosidade foi mais forte que o bom senso e, quem mandou?, tive o que mereci. Vírus? Quem dera. Olha só:

“Sou candidado ao reality show BBB9, este é o meu perfil e me coloco à disposição para qualquer entrevista. [...] Tenho 22 anos, sou gaúcho, modelo, ator e estudante. Este programa dará um upgrade em minha carreira. [...] Meu sonho? Claro, terminar minha faculdade de direito, pagar minhas contas vencidas e, um dia, ser alguém.”

Ser alguém. Desde quando isso virou sinônimo de ser famoso? Caymmi, por que nos abandonaste? Na hora em que a gente se acostuma com a invasão de ex-BBBs mídia afora, aparece um candidato – repito, um candidato – a BBB atrás de atenção.

Se tudo der certo, e ele (vou manter o aspirante à fama no anonimato, por puro sadismo) conseguir vaga no programa, daqui a pouco vira ex-BBB e tudo volta ao normal. Como é dificílimo tudo dar certo, ele (não adianta, não digo o nome) deve acabar mesmo como ex-candidato-a-ex-BBB.

Por essas e outras, é um privilégio ter no mesmo número da Tpm figuras como Walter Salles e Cláudia Abreu. Os dois, mesmo equipados de fábrica com todos os opcionais de celebridade, insistem em cultivar uma privacidade cada vez mais rara. Sem falar na mania, quase uma excentricidade se você olhar por aí, de só dar entrevistas quando têm de fato algo a dizer.

Não quero parecer alarmista, mas essa não deveria ser a regra, e não a exceção?

Fernando Luna, diretor editorial

 

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