por Carol Sganzerla
Tpm #118

Como celebrar o Dia da Mulher se tantas atrocidades contra elas ainda são cometidas?

Diariamente, as notícias nos lembram que o fim do mundo já deu as caras por aqui e ninguém está dando lá muita bola. Porque ele não chega como um estrondo, mas sim aos poucos, bate à porta da sua casa ou cruza o seu caminho quando menos se espera. Estou me referindo a três tragédias, que, se você nem ouviu falar, previno das descrições fortes e adianto que as vítimas são mulheres.

 

A primeira tem 12 anos, é estudante e voltava da escola num ônibus de linha em um trajeto da zonal sul do Rio de Janeiro, sol a pino. No coletivo, havia mais duas outras passageiras. Sem nenhuma delas perceber, a menina – de, repito, 12 anos – foi obrigada por um homem armado a se sentar no último banco. Ameaçada, ela teria sido obrigada a tirar a calça do uniforme e ali mesmo estuprada por cerca de 15 minutos. Com o carro em movimento.

A segunda tinha 21 anos e pulava Carnaval na madrugada do último dia de folia, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Ao ser assediada por um desconhecido, no meio da rua, ela revidou com um tapa, e, após breve discussão, o homem atirou contra o rosto da moça. Ela morreu na hora.

A terceira passava dos 50 anos, era jogadora de vôlei, morava num bom apartamento da capital paulista, tinha empresa, imóveis. Foi morta a facadas pelo filho de 22 anos, que forjou um sequestro relâmpago para justificar a ida de um cúmplice a sua própria casa. O filho estava cansado das cobranças da mãe – ele é usuário de drogas.

E por que a tranquilidade da sua leitura, logo no início da revista, deveria ser incomodada com essas atrocidades? Explico. Quando esta Tpm chegar às bancas, o mundo vai estar às voltas com as comemorações do Dia Internacional da Mulher, relembrando freneticamente, em retrospectiva, as inúmeras conquistas alcançadas ao longo dos anos: direito ao voto, liberação sexual junto à invenção da pílula anticoncepcional, ocupação no mercado de trabalho, marcas no esporte, alcance de altos cargos políticos, independência para escolher casar ou comprar uma bicicleta.

Pois bem. Tantas conquistas a serem comemoradas ao longo da história que o direito mais básico – o de ser mulher e usufruir dessa atraente condição – acabou em segundo plano. O direito de ir e vir sem que o destino, a dignidade e a feminilidade sejam interrompidos por um instante, por uma covardia qualquer.

Como acredita a atriz Alessandra Negrini, uma das capas desta edição: “O mundo não vai acabar. Nossa civilização, talvez, mas o mundo se refaz”.

Carol Sganzerla, diretora de redação

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