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O que muda quando a vida muda?

Na segunda edição da Casa Menopausa, mulheres inspiradoras se reuniram para falar de tudo o que importa quando o assunto é envelhecimento

Casa Menopausa 2025 / Fotos: Mariana Pekin

Casa Menopausa 2025 / Fotos: Mariana Pekin


Por Redação

em 27 de outubro de 2025

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Por muito tempo a menopausa foi uma palavra quase proibida, sussurrada em segredo, disfarçada entre calores, insônias, lapsos de memória e as angústias que crescem quando não podemos conversar. Esse silêncio só aumenta os tabus, os estereótipos, a desinformação e aquela sensação de solidão que a gente conhece bem. Mas a menopausa é uma parte de um debate muito maior. Precisamos falar sobre o medo que nos fizeram ter de envelhecer – e até de dizer isso em voz alta. E cada vez que deixamos de colocar em palavras o que sentimos, perdemos a oportunidade de ouvir: “nossa, eu também me senti assim”. Por isso, a segunda edição da Casa Menopausa mais uma vez reuniu mulheres inspiradoras pra debater um assunto que interessa a todas nós.

LEIA TAMBÉM: Tudo o que rolou na primeira edição da Casa Menopausa

A gente não precisa esperar estar vivendo uma mudança pra falar sobre ela. Discutir menopausa, saúde, prazer, autoestima, bem-estar – e como tudo isso se transforma e nos transforma ao longo da vida – é para todas. E todos também. Porque assim, quem sabe, um dia não vamos ter medo de sentir um fogacho no meio de uma reunião de trabalho, receberemos mais apoio do nosso parceiro ou parceira nas flutuações da libido, e vamos permitir que as filhas, filhos, sobrinhos, amigas de todas as idades saibam que o que vem pela frente é desafiador, mas também transformador. Como escreveu Rita Lee: “Se eu pudesse dar um conselho a mim mesma aos 17 anos, diria ‘Envelheça! Mas saiba que envelhecer é uma loucura!'”. 

Casa Menopausa 2025 / Foto: Mariana Pekin
Em outubro, a segunda edição da Casa Menopausa reuniu mulheres inspiradoras para discutir o envelhecimento / Fotos: Mariana Pekin

Se reinventar dá trabalho, mas talvez a gente também precise aprender a envelhecer: do nosso jeito, entendendo que cada uma tem a sua experiência, aprendendo a identificar o que é pressão e o que é nosso desejo e conhecendo quem é a mulher que estamos nos tornando, e também a que não estamos nos tornando. Encarar as fases, as transformações, as angústias, as belezas, os desafios e as possibilidades pra experimentar todas as versões que queremos – e podemos – ser. 

Casa Menopausa 2025 / Foto: Mariana Pekin
Casa Menopausa 2025 / Fotos: Mariana Pekin

No momento em que enxergamos as primeiras luzes jogadas na escuridão em que a menopausa e o envelhecimento da mulher existiu por tanto tempo, é hora de ouvir as conversas que (realmente) importam. E ela só acontece entre nós, todas nós, em um espaço onde é possível entrar sem guarda, sem medo e sem certezas. 

É por isso que Tpm e Botik promoveram a segunda edição da Casa Menopausa, um encontro entre mulheres inspiradoras para falar de tudo o que importa quando o assunto é envelhecimento. Você pode assistir aos debates na íntegra no YouTube ou conferir um pouquinho do que rolou por lá a seguir.

Liberdade pra mim hoje é não esconder a minha idade. Aliás, eu nunca escondi. Mas acho que isso é libertador pra mim e pra todas nós que chegamos aos 80 anos sem esse peso”

Zezé Motta, atriz e cantora

Zezé Motta, atriz e cantora / Foto: Mariana Pekin
Foto: Mariana Pekin

“Com todas as transformações, eu não gostaria de ter 20, 30 ou 40 anos hoje. O tempo, inevitavelmente, traz sabedoria e uma capacidade de sofrer menos, que é fundamental. Ninguém merece passar a vida inteira sofrendo pelas mesmas coisas”, diz Zezé Motta. Aos 81 anos, a atriz e cantora fez mais de 100 papéis, uma dezena de discos e é dona de uma trajetória que precisou abrir muitos caminhos. Primeira mulher negra a protagonizar um filme no Brasil, como Xica da Silva, e também a primeira a formar um par romântico na novela das oito da Globo, ela não fez só história. Resistiu, sonhou, se reinventou e encontrou uma maneira de se multiplicar em novas gerações. E completou 60 anos de carreira sem deixar de ser exatamente quem ela é.

Na Casa Menopausa, a artista bateu um papo com a jornalista Claudia Lima sobre como a maturidade pode ser um tempo de potência, e não de apagamento. “Eu sou de um tempo em que achavam que uma pessoa idosa não servia pra mais nada além de fazer crochê e cuidar dos netos. Hoje, as pessoas idosas estão em atividade, produzindo e vivendo”, afirma Zezé. Ela também lembrou o medo que sentiu quando chegou à menopausa. “Antes, não se falava sobre isso, as mulheres tinham vergonha de chegar na menopausa. Quando os assuntos são discutidos, eles deixam de ser tabu e tudo fica mais leve. A gente se sente menos solitária ao saber que outras passam pelos mesmos problemas”, conta. “Eu gosto de falar que estou namorando pra acabar com esse tabu de que com a idade o desejo acaba. Se você estiver bem, com saúde mental e física, vai se apaixonar até o último dia.”

“Tenho certeza de que vou ser uma mulher desejante até a morte. Libido, pra mim, está na cabeça. É muito mais sobre fantasia do que hormônios. Ela não está só nas parcerias, está na vida, no trabalho. Libido é vontade de estar viva”

Virginia Cavendish, atriz, produtora e roteirista

Virginia Cavendish, atriz, produtora e roteirista / Foto: Mariana Pekin
Foto: Mariana Pekin

Entre as muitas transformações que chegam com a menopausa, o desejo também muda. A libido pode até oscilar, mas o prazer continua vivo: mais consciente, mais livre, mais nosso. “O que faz com que uma parceria seja quente não é só o sexo. É a relação como um todo. E quando a admiração ou a convivência vão desmoronando, a libido acaba”, diz Virginia Cavendish, que tem usado sua voz e sua arte pra ressignificar o envelhecer. Ela bateu um papo com a médica especializada em ginecologia endócrina e climatério Mariana Prado e a atriz e apresentadora Flavia dos Prazeres sobre corpo, desejo e as transformações físicas, emocionais e simbólicas dessa fase.

“A libido é algo multifatorial, então, na menopausa, ela precisa ser tratada com diversos profissionais, não só da ginecologia. Não é uma questão que pode ser resolvida só com terapia hormonal”, explica Mariana Prado, que lembra que o desejo precisa ser olhado de forma integral. “A medicina tende a negligenciar as queixas e a normalizar os sintomas das mulheres. A menopausa é um evento fisiológico, mas não precisa ser sofrido. Para além da terapia hormonal, hoje a gente consegue tratar os sintomas dessa fase com plantas e ervas medicinais, alimentação e atividade física”.

A atriz e apresentadora Flavia dos Prazeres lembrou que não é só no consultório que o prazer precisa ser entendido de maneira mais ampla. “É importante entender as nossas fases e escolher com consciência quem vai caminhar ao nosso lado. Nem todo parceiro entende o nosso momento e, às vezes, um mau estímulo basta pra fazer a libido desaparecer”, diz. “Em alguns momentos, também é importante ficar sozinha e descobrir outras formas de sentir prazer”.

“Envelhecer é difícil para as mulheres e para as atrizes mais ainda. As pessoas não querem ver uma mulher bonita envelhecer. Faltam bons papéis e quase nunca temos uma personagem de 60 anos com vida própria nas telas. As mulheres viram só a mãe, a avó”

Claudia Ohana, atriz

Claudia Ohana, atriz / Foto: Mariana Pekin
Foto: Mariana Pekin

A sexualidade, a saúde, o corpo e os desejos são vividos de formas diferentes em cada geração. E, apesar de nenhuma relação entre mãe e filha ser igual à outra, quase sempre crescemos olhando para uma mulher que também muda com o tempo. Na Casa Menopausa, a atriz Claudia Ohana e sua filha, a diretora Dandara Ohana Guerra, se encontraram para conversar sobre essas transformações. “Envelhecer, para a mulher, é bem mais difícil do que para o homem. Temos medo de ficar invisíveis, como se tivéssemos um prazo de validade. Mas não é nada disso, nós só estamos em outra fase”, contou Claudia.

Dandara, por sua vez, trouxe o olhar de outra geração. “Aos 42 anos, observo meu filho de 20 e vejo muitas diferenças entre as gerações. E isso que é o legal, você poder trocar e aprender com o mais novo”, diz. “Eu tive a sorte de nascer numa família em que todos os assuntos eram falados com naturalidade entre as mulheres: a nudez, a menstruação, o sexo e a menopausa. Isso me deixou mais tranquila sobre o que vem pela frente”.

“A Dandara me dá mais conselhos do que eu dou para ela. Em assuntos de relacionamento, ela me alerta sobre machismo. É outra visão, outra geração. Hoje falamos de menopausa de uma maneira mais responsável. Não queremos dar lições, mas exemplos. Queremos ser mulheres atuais que mostram as coisas como elas são”, afirmou Claudia. Ao falar de prazer, ela contou o que também ganhou com o tempo. “Com a menopausa vem a queda na libido. Mas, sinceramente, pra mim foi bom, porque me deu uma acalmada. Nem tudo gira em torno de sexo, de relacionamento. O mais importante é não perder o tesão pela vida e ter prazer com você mesma”.

“Quando entrei na menopausa, tive a sensação de que estava perdendo o controle da minha vida, do meu corpo. Foi então que decidi me informar e percebi o quanto a saúde feminina ainda é pouco pesquisada, e a menopausa é mais uma dessas fases que foram deixadas de lado”

Maria Cândida, jornalista

Maria Cândida, jornalista / Foto: Mariana Pekin
Foto: Mariana Pekin

Enquanto tanta gente quer julgar e controlar o corpo da mulher, ele segue sendo o menos estudado da medicina. A ciência sempre priorizou corpos masculinos, mas a disparidade no investimento em pesquisas sobre a saúde de homens e mulheres ainda é enorme. O resultado? Mulheres são diagnosticadas mais tarde em mais de 700 doenças – isso quando são. Na mesa que encerrou a segunda edição da Casa Menopausa, a jornalista Maria Cândida, a artista plástica Claudia Liz e a cientista do Grupo Boticário Monique Cantu discutiram como o corpo feminino é tratado (ou ignorado) pela medicina, pela ciência e pela sociedade.

“A ideia de que a menopausa marca o fim da vida da mulher vem de um tempo em que, de fato, não se vivia tanto. Na década de 1970, muitas pessoas sequer chegavam aos 60 anos. Hoje, a expectativa de vida passa dos 79 e muitas de nós vamos chegar aos 90. Por isso é tão importante falar sobre esse assunto para nos preparar e viver essa fase da melhor forma possível”, disse Maria Cândida.

Claudia Liz, que começou a trabalhar como modelo aos 13 anos, compartilhou o impacto de ter o corpo julgado e controlado desde cedo. “Eu vivia dependendo da validação do outro e cercada de críticas. Um dia, depois de um desfile, uma jornalista escreveu que eu estava gorda. Fui tomada por uma culpa absurda. Decidi fazer uma lipo e entrei em coma. Só comecei a me recuperar de verdade quando entendi que o cuidado precisava vir de dentro, contou ela, que fez da maturidade um convite à reinvenção. “A menopausa me deu coragem de assumir o que eu quero. Foi quando decidi começar uma carreira nas artes visuais. Hoje, me sinto mais fértil, sensível e criativa do que antes.”

Já a cientista Monique Cantu destacou como a ciência pode (e deve) devolver conhecimento e autonomia às mulheres. “A ciência traz informação de qualidade e empoderamento. É a partir das pesquisas que nós conhecemos todas as alterações que ocorrem na menopausa para saber qual especialista procurar, que tipo de produto usar ou qual tratamento fazer”, afirma. “Durante muitos anos, a indústria da beleza impôs padrões rígidos. Hoje, é dever dela trazer uma agenda de bem-estar, com conhecimento profundo sobre a mulher e devolvendo esse saber para a sociedade”.