O Partido Pós-Rancor

por Alê Youssef
Trip #199

Alê Youssef: ”rede de coletivos é política jovem em estado puro”

O colunista da Trip explica porque a rede de coletivos é mais do que um movimento cultural: é política jovem em estado puro

A descrença em relação à política institucional é uma marca das novas gerações. Muitos fatores podem explicar: figuras que nunca saem de cena, um sistema eleitoral que favorece o poder econômico, as coligações que ferem as utopias. A juventude não se encanta, e tem muita dificuldade em se mobilizar em um quadro tão engessado. Dentro dos partidos, os setores mais jovens acabam reproduzindo as mesmas falhas e vícios em vez de arejar as instâncias partidárias com sangue novo. Quem não se lembra, com certa desconfiança, dos chavões ultrapassados entoados pelos militantes do movimento estudantil dentro de nossas faculdades?

Em contraposição a essa lógica, alguns movimentos perceberam a importância de recriar os canais de comunicação entre o jovem e a participação política e incluíram na agenda um foco comportamental. Nesse processo, os movimentos culturais ganharam força, principalmente pelo apelo natural que exercem nas novas gerações conectadas com a internet e cada vez mais interessadas em profissões criativas e ligadas ao novo mundo do compartilhamento da informação. A dobradinha poderosa de cultura e internet abriu um flanco que revigorou a capacidade de aglutinação e envolvimento da juventude em causas culturais.

São muitos os exemplos de organizações que pautaram a sociedade e criaram ondas de apoio político, atenção da mídia e analises da academia para suas causas. Podemos listar o hip hop, os movimentos de arte urbana e cultura de rua, o funk carioca, o tecnobrega, os fanáticos por games, os grupos de teatro alternativo, os novos blocos carnavalescos, os grupos de novos estilistas, videomakers, os militantes da cultura digital, as associações de DJs etc.

É nesse cenário que surge o Fora do Eixo. À primeira vista, como um desses movimentos culturais. Entretanto, quando nos aproximamos podemos ver algo diferente, muito poderoso e com um potencial impressionante, especialmente pela sua capilaridade capaz de gerar contato com todos os setores listados acima. Imaginem um liquidificador em que se possa colocar as ramificações da esquerda, com estratégias e lógicas de mercado das agências de publicidade, misturando rock, rap, artes visuais, teatro, um bando de sonhadores e outro de pragmáticos, o artista, o produtor, o empresário e o público. Tudo junto e misturado. O caldo dessa batida é uma nova tecnologia de participação e engajamento que funciona de forma exemplar para a circulação e produção musical, mas que acima de tudo é um grande projeto de formação política.

O Fora do Eixo cria, portanto, uma geração que se utiliza sem a menor preocupação ideológica de aspectos positivos da organização dos movimentos de esquerda e de ações de marketing típicas dos liberais. É, como disse, o teórico da contracultura Cláudio Prado, a construção da geração pós-rancor, que não fica presa à questões filosóficas e mergulha radicalmente na utilização da cultura digital para fazer o que tem que ser feito.

Em um país que viu sua juventude se afastar da política convencional, saber que existem milhares de jovens dispostos a viver (literalmente) por uma causa, é animador. Na perspectiva de crescimento da economia da cultura como uma das vocações do Brasil, o Circuito Fora do Eixo encontra-se em situação privilegiada para se tornar uma força influente e decisiva no xadrez da política nacional. E o mais velho do grupo só tem 30 anos de idade. Eles têm muito tempo para isso.

* Alê Youssef, 36, é sócio do Studio SP e um dos fundadores do site Overmundo. Foi coordenador de Juventude da Prefeitura de SP (2001-04). Seu e-mail é ayoussef@trip.com.br. Seu Twitter é @aleyoussef

Esta coluna integra a revista Trip 199, na matéria sobre a Casa Fora do Eixo. Leia na íntegra clicando aqui.

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