O homem deveria ser liberado para ser sensível, esteta e encantador sem ter de carregar bandeira alguma
Caro Paulo,
Você é metrossexual? Acho que não vamos conseguir fugir dessa pergunta. Confesso que, desde que ouvi essa expressão pela primeira vez, em meados dos anos 90, como rótulo de um tipo de comportamento masculino, torci para que ela, como todo modismo, desaparecesse logo. Mas ela continua firme. E eu continuo não gostando.
Só para ter certeza de que temos a mesma compreensão do seu significado, vamos pegar a definição do The Word Spy: "metrossexual é o homem urbano que tem forte senso estético e gasta muito tempo e dinheiro com sua aparência e estilo de vida".
Outra definição da qual gosto mais é: "homem sensível, que se cuida, se veste bem e curte um estilo de vida onde a estética tem lugar importante; um homem hétero que integra o lado feminino".
É uma pena que um homem seja rotulado assim pelo lugar onde vive (metrópole) e pela orientação sexual (hétero). E que, em geral, seja considerado um consumidor voraz de cosméticos e roupas. Pelo menos é assim que o mundo editorial masculino (GQ, Esquire, Arena, FHM, The Face) trata seus leitores.
É uma pena porque, na minha opinião, um homem que integra masculino e feminino deveria ser uma referência para todos nós, e não um dos muitos grupos de homens que habitam uma metrópole e freqüentam, narcisisticamente, shopping centers, academias e salões de beleza.
Acredito que integrar masculino e feminino seja uma evolução desejada da raça, ligada muito mais ao nosso bem-estar pessoal e social do que a uma atitude diante do consumo. Tenho receio de que, ao se relacionar integração do feminino com esse narciso consumista, se perca a dimensão libertadora que essa evolução pode significar para nós homens e para a sociedade em geral.
Crise de identidade
Felizmente, para uma matéria como a do encarte "Folhateen", da Folha de S. Paulo - que mostra adolescentes e uns twentysomething pateticamente maquiados associando suas caricaturas ao metrossexual -, tem uma matéria como a do Le Nouvel Observateur, que O Estado de S. Paulo comenta na seção "Revista das Revistas". Assinado por Luiz Oricchio, neste artigo o metrossexual é posto na perspectiva de uma evolução possível para o macho em "crise de identidade" (sic).
Gostei. Segundo Oricchio, numa pesquisa com suas leitoras, o Le Nouvel Observateur identificou alguns atributos desse novo homem: sedução, aparência e performance. E continua: "Esses atributos teriam tomado a dianteira sobre outros tradicionais, como poder de comando, autoridade, chefia e competição viril. Essas qualidades caíram em desuso e já teriam ido tarde, pois em boa parte geraram o mundo tal como ele é hoje, consequência sobre a qual é inútil comentar. O novo homem é o metrossexual, um homem doce, sensível e encantador, como um gay, mas perfeitamente heterossexual".
Concordo com Luiz Oricchio e vou mais longe. Na verdade, não é importante se o novo homem vai usar delineador, pintar as unhas ou andar bem vestido. Isso pode ser conseqüência, mas não é causa definidora do novo comportamento. Nem se ele é heterossexual ou gay. Aliás, não importa nem se ele é homem, porque integrar masculino e feminino é tarefa para homens e mulheres de nossa época.
Masculino e feminino
Não tenho dúvida de que os líderes, os executivos, os empresários e os artistas mais bem-sucedidos deste século serão as pessoas que buscam a síntese integradora de amor e ambição, de indivíduo e sociedade, de cultura e natureza, de trabalho e prazer, de dinheiro e mérito, enfim, de masculino e feminino.
Rotular esse comportamento de metrossexual empobrece o processo histórico de nossa evolução. Acho que você, Paulo, como jornalista e editor desta querida TRIP poderia fazer uma bela matéria sobre o metrossexual. A idéia é desmistificar o rótulo e liberar o povo para ser sensível, esteta e encantador sem ter de carregar bandeira alguma. Se você concordar, me liga para a gente trocar uma idéia.
Meu abraço, Ricardo.