Festival Trip de Política

por Diogo Rodriguez

Saiba o como foi o primeiro Festival Trip de Política, que lotou o Studio SP no domingo

Enquanto Rubens Barrichelo perdia o título da Fórmula 1 para Jenson Button em Interlagos, uma fila se formava longe dali, na região da Baixa Augusta. O Studio SP está acostumado a organizar as pessoas esperando para entrar, mas geralmente o evento é um show ou uma festa. Ontem foi diferente: a tarde de domingo não virou noite de pizza, mas de reflexão. Nas cinco horas de evento, 976 pessoas (quase duas vezes a lotação da casa) viram discussões sobre o uso da internet em campanhas eleitorais, sobre corrupção e transparência na política, a capacidade de transformação social e política do cinema, o alcance dos direitos dos homossexuais e dos deficientes físicos, e uma boa dose de música de protesto.

Em sua primeira edição, o Festival Trip de Política trouxe para o mesmo fórum de discussão pessoas com diversos tipos de envolvimento com a política. De um deputado federal (Fernando Gabeira) a uma líder do movimento sem-teto (Veronica Kroll). E essa era justamente a idéia, deslocar a política, normalmente confinada em salas de aula ou plenários, e devolvê-la à rua e, principalmente, aos jovens. Afinal, como disse Fernando Luna, diretor editoral da Trip Editora, na abertura do evento com Alê Youssef, “mesmo que você não goste de política, a política gosta de você e do seu voto”.

Para começar, Ricardo Calil, crítico de cinema  e diretor de redação da Trip, mediou o debate sobre cinema com os cineastas Carlos Nader, colunista da Trip (Pan-cinema permanente), e Laís Bodanzky (Bicho de sete cabeças, Chega de saudade). Entre trechos de filmes de Glauber Rocha, Jorge Bodanzky e João Moreira Salles, foi discutida a relação entre cinema e poder. Os convidados concordaram que a mudança trazida pelos filmes é “feita aos poucos”, conforme disse Laís. Nader acrescentou que a “soma [das transformações] pode levar a mudanças sociais”.

Em seguida, o projeto Maquinado, liderado por Lúcio Maia, da Nação Zumbi, assumiu o comando do som - que teve a discotecagem de Tatá Aeroplano - e subiu ao palco para tocar uma seleção de canções no tom do Festival: Jorge Ben (“Zumbi”),  Antonio Carlos e Jocafi ("Queima lá") e Vinícius de Morais e Baden Powell (“Canto de Ossanha”).

Internet, corrupção e humor
O debate mais aguardado começou quando já era noite, por volta das 19h, com o cientista político Luiz Felipe d'Ávila, o colunista da Trip e especialista em internet e sociedade Ronaldo Lemos e o deputado federal (PV-RJ) Fernando Gabeira. Fernando Luna, o mediador, começou levantando a questão do futuro das campanhas eleitorais frente às possibilidades que a internet traz. Lemos e d'Ávila vêem na rede um grande potencial para mudanças: o primeiro lembrou que o número de computadores no Brasil vem aumentando e afirmou que prover banda larga ao maior número possível de cidadãos é “uma questão de cidadania”; já d'Ávila disse considerar que a internet é “revolucionária” frente à perda de poder dos partidos políticos na sociedade brasileira.

Houve espaço até para prestação de contas, o que Fernando Gabeira fez ao ser questionado por Luna a respeito de seu envolvimento no escândalo das passagens aéreas, que se tornou conhecido neste ano. Gabeira, que já havia invocado a idéia de “accontability” (termo usado na ciência política para designar a responsabilidade de políticos frente a seus atos), admitiu que errou ao dar uma passagem para sua filha: “Não sou infalível, quando eu erro, procuro corrigir”. Ainda houve tempo de discutir a importância e os limites dos programas humorísticos que cobrem a política, como Pânico e CQC. Todos concordaram que os humoristas devem ter liberdade de circular por Brasília, mas certos limites têm de ser respeitados. Luiz Felipe d'Ávila disse que os programas “não podem denegrir as instituições”  e Gabeira afirmou que luta “para que eles tenham direito de entrar na Câmara dos Deputados”, mas não dá “ mais entrevista para o entrevistador onisciente do Pânico ou do CQC”.

Foto-história
O último bloco do Festival apresentou 25 fotografias importantes no fotojornalismo brasileiro. João Wainer, fotojornalista e Guilherme Werneck, diretor de mídias eletrônicas da Trip, comentaram as imagens exibidas no telão do Studio SP. Escândalos, como a aparição de Itamar Franco ao lado de uma modelo sem calcinha e Fernando Henrique Cardoso sentado na cadeira de prefeito antes do fim das eleições em São Paulo, momentos históricos como a última foto de Fernando Collor de Melo como presidente e o primeiro de Franco, assumindo o cargo. Duas imagens interligadas abriram e fecharam o bloco sobre fotografia: os presidentes Getúlio Vargas e Lua com as mãos sujas de petróleo.

Ao longo do dia, entre um bloco e outro, convidados tiveram cinco minutos para expor uma idéia, fazer um discurso ou simplesmente reclamar da política. Mara Gabrilli (vereadora por São Paulo), Mario Sergio Cortella (filósofo e professor da PUC-SP), Tia Dag (fundadora da Casa do Zezinho), Marcos Lopes (escritor), Veronica Kroll (dirigente do Fórum de Cortiços e Sem-Teto de São Paulo), André Fischer (criador e diretor-geral do site Mix Brasil). Veja todos os vídeos, na íntegra, no site da Trip.

Encerrando a noite – que deixou o pessoal da Trip inspirado para uma possível segunda edição, o Instituto fez a platéia dançar, misturando Miles Davis com rap e tocando Public Enemy para protestar com estilo. O primeiro Festival Trip de Política pode não ter respondido à difícil questão que colocou na mesa (e no palco), “tem jeito?”, mas criou um novo espaço para debates, sem cerimônia e sem gravata.

 

fechar