De frente para o espelho

por Gregory Prudenciano

Depois do sucesso de ”Home”, visto por mais de 600 milhões de pessoas, Yann Arthus-Bertrand vem ao Brasil lançar ”Humano”, documentário sobre o que é ser humano

Foi desafiando uma confusão de línguas e quilômetros, de culturas e geografias que nos separam uns dos outros, que o fotógrafo e ambientalista francês Yann Arthus-Bertrand dirigiu o filme Humano — uma viagem pela vida. No documentário, pessoas são colocadas diante de uma câmera e convidados a falar sobre o que lhes vier à mente. Temas universais como amor, família, sexo, pobreza, discriminação, morte e esperança dão o tom dessas reflexões, feitas por todo tipo de gente, do ex-presidente uruguaio Pepe Mujica a uma universitária africana presa por ter feito um aborto. O filme não tem narração e as pessoas não são identificadas pelos nomes. "A ideia é que haja uma profunda identificação, como se o espectador estivesse diante de um espelho", diz Yann.

A produção do longa durou três anos e envolveu viagens por 60 países e mais de 2 mil depoimentos em 63 línguas diferentes. Embora o foco do documentário esteja nas falas dos participantes, as imagens aéreas que servem como transições entre os depoimentos também merecem destaque. No Brasil para promover o lançamento do filme, Arthus-Bertrand falou com a Trip.

Você pensa que haja algo essencialmente humano em cada um de nós? A necessidade de amor. A necessidade de amar e a necessidade de ser amado. Nós somos uma espécie cheia de empatia e isso é único nos seres humanos. Você pode andar pelas ruas e parar diante de alguém e se identificar com ele. Mas, além da empatia, também somos cheios de ódio e isso é parte de nós. Penso que Humano é uma questão a respeito do que é ser humano. O problema é que ninguém tem a resposta. Nós estamos tentando entender o que causa, em essência, todos os nossos problemas uns com os outros. Por que estão acontecendo os conflitos no Oriente Médio? Por que existe homofobia no mundo? Penso que ter viajado para tentar entender foi um trabalho incrível, mas para mim não é foi o suficiente. Eu ainda estou tentando entender o que é ser humano.

As pessoas entrevistadas falam com tanta facilidade mesmo? Mesmo as que não estão acostumadas com câmeras? Para muita gente foi a primeira vez que havia uma câmera para onde olhar e falar. Então, quando isso acontece, você dá o máximo que você pode dar porque nunca antes alguém tinha se interessado em conhecer você dessa forma. Assim que a pessoa está diante de uma câmera, ela responde às perguntas. Qual foi a pior coisa que aconteceu na sua vida e o que você aprendeu com isso? É uma pergunta muito difícil. Você fala sobre seus pais, sua esposa, o que você fez, a morte de alguém, sua família. As pessoas tentam ir fundo em seus corações. Elas são tão inteligentes! Às vezes elas não sabem nem ler, mas nem por isso deixam de ter muito bom senso. Todo mundo tem algo para dizer. Todos. Eu gosto dos brasileiros, aliás, porque os brasileiros falam sobre seus sentimentos e vida com mais facilidade.

O filme mudou o seu jeito de enxergar a vida? Sim, eu e a equipe fizemos o filme por muito tempo. Eu tenho 70 anos e quanto mais eu vivo, mas eu amo as pessoas. Aprendi a aceitar as pessoas que não são como eu. Aprendi a perdoar e a conviver, mas entendi que aceitar é uma palavra importante.

Ano passado morreu Antônio Abujamra, um grande diretor de teatro que apresentava um programa de entrevistas no Brasil. Ele sempre fazia uma pergunta que eu queria que você respondesse: a felicidade é uma ideia velha? Não. Nós todos estamos procurando por felicidade em nossas vidas. Quando você ama alguém, quando você dá algo a alguém, quando você vai ao cinema, come alguma comida ou faz amigos, ou mesmo quando você compra alguma coisa, sempre há por trás um desejo por felicidade. O problema é que nós não sabemos exatamente o que é felicidade porque somos insaciáveis, sempre queremos mais. Infelizmente nós não aprendemos na escola o que é ser feliz [risos]. Eu não sou feliz, mas eu estou tentando ser.

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