Vida é movimento, atividade. Parar, sair do ritmo de produção, dar um tempo, ter uma calma que não gera riqueza material, é um tipo de morte
Caro Paulo,
Gostei de ter participado da Batalha das Estrelas, no Planetário do Ibirapuera. Obrigado pela experiência. Vivemos uma época muito confusa, por isso acho superoportuno trocar ideias com gente que está vivendo a vida no olho do furacão. Parabéns.
Semana passada participei de uma iniciativa semelhante, muito legal, da Unibes, leia-se Bruno Assami, Alice Penna e Airton Bicudo, sobre longevidade. Reuniram umas dez pessoas sintonizadas com o tema e provocaram a conversa que rolou animada por 3 horas. A troca de experiências e os embates das perspectivas diferentes acabaram nos levando a conclusões muito simples e dramáticas sobre a velhice. Algumas delas a gente já conversou aqui. Mas tem uma que vale a pena trazer para enriquecer a ideia de “parar”.
O grupo concluiu que o maior problema da velhice é que as pessoas não se planejam para ela. Porque planejar para a velhice é planejar para parar, isto é, para morrer. Óbvio: a velhice é a última fase da vida antes da morte, antes de parar para sempre. E ninguém quer morrer.
Daí a dificuldade de parar.
Vida é movimento, atividade, produção. Parar, sair do ritmo de produção, dar um tempo, ter uma calma que não gera riqueza material, é um tipo de morte.
Desde o nascimento temos a morte como inimiga e sua presença nos incomoda seja como ideia ou como fato. Tem gente que acredita que, com o avanço da ciência e da tecnologia, em poucos anos viveremos eternamente. Então para que pensar na morte se ela é apenas um problema que será resolvido com o tempo?!
Pode até ser que um dia a morte seja derrotada. Mas não é o que temos para o momento. Nem para o meu futuro, graças a Deus.
Gosto de pensar que a vida acaba. Isso me parece bom para quem morre. Nesses dias morreu a querida Bianca Freitas aos 34 anos de idade, “irmã” do meu filho Peu, uma mulher que tinha o rock’n’roll nas veias e na vida e que ficou doente demais para continuar entre nós. Bom para ela que se livrou do sofrimento. Triste para seus queridos, mas bom para ela, RIP.
Ame seu destino
Trazer a morte para perto da vida evidencia a temporalidade, a precariedade e a fragilidade do viver. Evita o anestesiamento da noção de urgência de viver a vida, rocking & rolling, no presente, cada momento.
A dificuldade que temos de parar é a mesma que temos de morrer.
Por isso muita gente faz o gesto de parar, mas não usufrui do fato de ter parado: porque é difícil ver o tempo passar como o incontrolável senhor da vida e da morte e achar graça nisso.
Aos 68 posso dizer que parar não é uma opção. É destino. Faz parte do design do ser humano, que é tão genial que você vai parando aos poucos para ir se preparando para a grande parada.
Por isso uma boa providência nesta altura da vida – e que serve para a vida toda – é amor-fati, como disse Nietzsche – amar o destino! E eu acrescento: prestar muita atenção porque, com o tempo, o destino nos diz coisas cada vez mais interessantes.
Meu abraço,
Ricardo
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Imagem principal: Abiuro