Bolsonaristas, trumpistas, brexistas e assassinos de Marielles só se veem como diferentes quando se percebem superiores ao resto do mundo
Caro Paulo,
“Este Rolex é de verdade?”, pergunta o turista ao vendedor numa rua de Bangkok.
“Same same but different” (“Igual, mas diferente”), responde o vendedor.
Em outras palavras, ele quer dizer que o Rolex é falso.
E eu quero perguntar: a gente é tão falso quanto aquele Rolex quando nos submetemos às convenções para conviver melhor, para ganhar o carinho e o apreço dos outros? Qual é o tamanho da falsidade permitida do Rolex para o vendedor de Bangkok ser um homem feliz?
Saber negociar entre o individual e o coletivo talvez seja a maior competência que a vida pede para alguém ser feliz. A segunda maior é saber conviver com o diferente.
A argola no nariz, a tatuagem no olho, o cabelo verde, é para ficar diferente ou igual? A gravata Hermès, o sapato Gucci, a camisa Giorgio Armani, é para ficar igual ou diferente? Chinelo, bermuda, camiseta e maconha, é para ficar diferente ou igual?
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Para quem não é da tribo, todos os índios são iguais. E, para quem é da tribo, não existem dois índios iguais. Apenas pontos de vista diferentes?
Não apenas. Acho que vivemos um processo de evolução individual e coletivo pautado pela consciência e expressão de identidades, individuais e coletivas.
Teoria da evolução
Na prática da minha utopia, as tribos se multiplicarão em bilhões e se dividirão tanto até que cada uma delas seja do tamanho de um indivíduo, com características tão próprias e únicas que o ser humano acabará definitivamente com a busca da fórmula da felicidade. “Cada um é um!”, já gritava Tiago, aos 2 anos, reivindicando o respeito à individualidade e ao direito de se vestir como bem entendesse.
Tiago estava certo. Um dia, cada pessoa terá a sua fórmula individual de felicidade e o coletivo ficará cada vez mais rico, cheio de energia e possibilidades; e permanentemente grávido de um futuro cada vez mais criativo, divertido e seguro.
Nesse dia, a falsidade não será mais necessária, a negociação entre o individual e o coletivo será uma arte natural e cotidiana e o “same same but different” deixará de ser piada conveniente para tolerar o vendedor malandro e se tornará uma verdade redentora da raça humana.
Não sei quão longe estamos desse dia, mas sei que estamos indo bem rápido. Os sintomas do exercício explícito dessas identidades são as reações violentas dos same same, aqueles que querem tudo igual, no tempo e no espaço, todos iguais a si mesmos, e o futuro igual ao passado.
Bolsonaristas, trumpistas, brexistas e todos os assassinos de Marielles só se veem como diferentes quando se percebem superiores ao resto do mundo, não quando se sentem iguais. Por isso, a evolução da humanidade vai eliminá-los do cenário da diversidade. RIP.
“Same same but different” nos une pela diferença, não pela igualdade.
Eu sei que não é fácil se unir pela diferença porque não foi fácil, para mim, ver meu neto Joaquim, 16 anos, filho do Tiago, com as unhas pintadas!
“O que é isso, Joca!?!?”, perguntei assustado.
E ele respondeu: “ É da hora, vô!”.
Fiquei feliz com a leveza de sua resposta. Não era mais uma revolução como foi nos meus 16. De mim para o Ti e para o Joca: isso é evolução!
Abraço para você e para o André Alfaya, que me contou a história do “Same same but different”.
Saudades,
Ricardo