Quando esta coluna for publicada, terei lançado o meu sexto livro. Convidei muita gente, tenho hoje muitos amigos que Conquistei nesses 12 anos fora da prisão. Será uma festa
Durante muitos anos de minha vida, ainda sob a ótica da prisão, reneguei todo tipo de festa e comemoração. Na prisão as pessoas nos procuram nas datas festivas mais como um desencargo de consciência. “Amigos” e até familiares lotam as filas de entrada de visitas nas prisões nessas datas; a maioria só vai aparecer novamente na mesma comemoração do ano seguinte. Os que estão conosco o ano todo, passam sufoco em longas e penosas filas nessas datas comemorativas.
Concordo com Heidegger quando ele diz que a vida só acontece plenamente à nossa consciência por meio das nossas frustrações, dos fracassos e das dificuldades que tais manifestações nos causam. Tenho encontrado sentido na vida em ultrapassar fracassos, frustrações e dificuldades que o fato de existir acarretou. Hoje, já indo para 12 anos longe das grades, começo a me soltar desses nós existenciais, relaxar e viver com certa tranquilidade. Celebro com meus amigos escritores o lançamento de seus novos livros, festejo novos encontros e comemoro algumas datas. Vou aprendendo que muitos são os prazeres do convívio e que não vale a pena arrastar ressentimentos de um passado que já vai distante.
A existência precisa fazer sentido para nós. Precisamos desse conforto porque ele nos dá, mesmo que de forma elíptica ou imprevista, fé na regularidade do mundo. Um passo levará a outro passo e é dessa maneira que a vida nos convida para festejar. E as festas são essas maneiras de nos confraternizarmos e celebrarmos essa confiança na vida, no mundo e nas pessoas.
Liberdade não traz, necessariamente, a felicidade. Às vezes aderir também é uma excelente escolha. A existência é algo que a vida nos dá. Um presente, às vezes uma condenação. Mas isso deixa de ter importância na medida em que o que devolvemos à vida é o que importa de fato. O que recebemos é passado e já passou, é óbvio. Nada pode estar em outro tempo que não no que está. O que damos é o agora, esse instante que não cessa na medida em que não paramos de dar. A solidão pode ser criativa, mas pode ser também uma árvore oca. Amigos, pessoas queridas, são como artesanato: feitos à mão com capricho.
EMOÇÃO E LÁGRIMAS
Quando esta coluna for publicada, terei lançado o meu sexto livro, no final de novembro. Convidei muita gente, tenho hoje muitos amigos. Conquistei-os nesses anos que estou fora da prisão. Será uma festa. Muitos aparecerão apenas para me cumprimentar e deixar o abraço, o carinho e a afirmação de amizade. Estou ansioso para abraçá-los e derramar todo meu reconhecimento pelos meus olhos que certamente estarão cheios de lágrimas. Lágrimas felizes e da mais intensa emoção. A vida tem sido muito boa para mim e prometo: vou me dedicar muito mais às pessoas e farei muito mais amigos. Eles são a riqueza, todo o tesouro que a existência poderia me oferecer.
Neste Natal, vou sim comemorar o nascimento daquele que nos ensina que todos os inimigos devem ser perdoados e que o amor é a única saída. Farei um voto sincero e profundo de acabar com todo rancor, toda malquerença, aceitar todas as diferenças e, de verdade, me esforçar muito em aceitar todos como irmãos. Não vou virar santo e nada que o valha. Quero continuar a ser o Luiz e me amar como sou, exatamente por quem sou, só que mais aplicado e atento às outras pessoas.
Vou fazer parte de uma festa que reunirá cerca de mil crianças para fazê-las felizes com presentes e muita atenção. Estarei presente desde a contribuição financeira, passando pela armação da festa, da decoração até todo o trabalho que isso tudo vai dar. Vou esbanjar carinho, quero dar minha alma, sentir que minha vida vale a pena, tem sentido e amar até não mais poder. Será um momento muito feliz, aquele que não se quer que acabe nunca mais. Serão festas e celebrações inesquecíveis, não vejo a hora!
Créditos
Flávia Junqueira