A verdade é um alvo em potencial na rede. O jornalista Leonardo Sakamoto explica em seu livro ”O que aprendi sendo xingado na internet” como não ser enganado
Estas são dicas rápidas para você não ser enganado na guerra cotidiana por corações e mentes que está deflagrada na internet. Porque, em uma guerra, a verdade (se é que ela ainda existe) é sempre a primeira vítima:
1. Olhe sempre a data do texto
Há muita gente que, por inocência ou sacanagem, replica links antigos como se o fato tivesse acabado de acontecer. Como o momento em que um fato ocorre é importante para a sua compreensão, a impressão que fica é de que o problema se repete por incompetência de alguém num eterno dia da marmota.
2. Fuja de textos anônimos
A chance de uma denúncia anônima e sem a fonte da informação circulando no WhatsApp ser séria é a mesma de um jabuti escalar um poste de luz sozinho. Se recebeu, demonstre nojinho e desconfie.
3. Procure o autor
OK, o autor do texto está identificado, o que significa que ele assume a responsabilidade pelo que escreve. Mas… quem é ele mesmo? Pode ser um ilustre fake, um notório hater ou simplesmente alguém que não manja nada do que está dizendo. Nada como dar um Google para saber um pouco mais sobre o cara. Se for um suposto “especialista”, vale buscar o currículo na Plataforma Lattes para ver se o sujeito é mesmo quem diz.
4. Desconfie das “evidências”
Para dar ares de verdade a opiniões bombásticas, muitos textos apresentam “provas” que, para serem mais verossímeis, são geralmente respaldadas por instituições ou autoridades. Muitas vezes, dizer que “a justiça mostrou que Fulano recebe milhões de tal partido”, “a PF descobriu que Beltrano tem altas contas na Suíça”, e tal e coisa ajuda a envernizar uma mentira. Como o papel e a tela aceitam tudo, não custa nada, de novo, tirar a prova no Google para ver se as evidências são mesmo reais.
5. Busque o contexto
Quando alguém tenta desacreditar uma ideia, pinça uma frase ou uma imagem fora de seu contexto e a utiliza para construir seu argumento. Como parte das pessoas foi condicionada a agir como gado diante do discurso de quem confia, acaba acreditando no novo significado que o sujeito tentou impor ao descontextualizar. Ou seja, na dúvida, Google nele.
6. Não seja ingênuo, leia
Ler um texto até o final é fundamental. O título, a foto e legendas não são capazes de trazer toda a complexidade de um argumento. Se não tiver tempo para ler, não compartilhe ou curta. Você pode, sem querer, estar difundindo uma peça de racismo ou de violência contra a mulher.
7. Não se deixe levar por quem escreve bonito
O texto pode até estar te xingando de uma forma doce, e você nem vai perceber se não observar atentamente o significado das palavras que o autor escolheu. Além disso, fique atento: uma pessoa pode escrever com certeza absoluta do que diz e, ainda assim, estar errada.
8. Cuidado com os sites fantasmas
Não é porque um site publicou um assunto com uma abordagem com a qual você concorda que ele é honesto ou faz bom jornalismo. Procure um “quem somos” ou um “expediente” e veja quem trabalha lá. Se não encontrar, desconfie.
9. Não se apegue tanto às imagens
Até uma criança não alfabetizada é capaz de manipular uma foto com aplicativos on-line. Então, por que você acredita que uma imagem é uma prova irrefutável de um argumento? Ao mesmo tempo, ao editar uma imagem, deixando partes dela de fora, se excluem desafetos ou cria-se a impressão de multidões onde elas não estavam.
10. Grite “truco!” com as imagens
Pouca gente sabe, mas o Google Imagens tem um mecanismo bem legalzinho. Na caixa de busca, clique no ícone de máquina fotográfica e arraste para lá a imagem de que você desconfia. O robozinho vai mostrar imagens parecidas – ou iguais – e informar de qual site elas foram tiradas. É um jeito de você rastrear de onde ela veio, se foi alterada etc.
11. Leia coisas das quais discorda
Não é porque você não concorda com uma opinião ou informação presentes em um texto bem-fundamentado que ele não merece ser lido. Considere que o mundo é mais complexo do que você pode imaginar e que a pluralidade de ideias, desde que não desejem a morte de alguém, ajuda a crescermos como sociedade. O contrário disso se chama ditadura.
*Trecho do livro '#O que aprendi sendo xingado na internet', do jornalista, professor e cientista político Leonardo Sakamoto. Ele é diretor da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão.
Créditos
MIKI Yoshihito/@Flickr