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por Alexandre Potascheff

O jornalista fala sobre mídia, liberdade de imprensa e ética nas campanhas eleitorais

O jornalista Eugênio Bucci é formado em Comunicação Social pela Escola de Comunicação e Artes, a ECA-USP, e em direito pela São Francisco. Nos anos 90, foi diretor de redação de revistas como Superinteressante, Playboy e Quatro Rodas e crítico de cultura e televisão dos jornais Folha de S. Paulo, Jornal do Brasil e das revistas Veja, Nova Escola e Sem Fronteiras.

Entre 2003 e 2007 dirigiu a Radiobrás, hoje Empresa Brasileira de Comunicação, trabalho que foi devidamente elogiado pelos principais veículos de comunicação, políticos e intelectuais brasileiros e reconhecido com prêmios nacionais e internacionais. Em 2007 integrou o Conselho Curador da Fundação Padre Anchieta (TV Cultura de São Paulo), onde permaneceu até este ano. Atualmente é professor doutor da ECA, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados, o IEA, também da USP, e colunista do jornal O Estado de S. Paulo e do site Observatório de Imprensa.

O papo hoje é sobre mídia, jornalismo, ética, censura e credibilidade jornalistica com Eugênio Bucci, que também é autor de livros como Sobre Ética e Imprensa e A Imprensa e o Dever da Liberdade.

A seguir, trechos da entrevista:

Paulo Lima: Como você vê hoje a profissão de jornalista? A imprensa no Brasil é absolutamente desenvolvida;  por outro lado tem uma certa crise rondando, não só em números, especialmente na mídia impressa, nos jornais, mas tem um questionamento, um repensar da atividade em função dessa explosão das mídias digitais. O que vem por aí, em termos de mercado de trabalho e qualidade do ambiente?

Eugênio Bucci: Sem dúvida, tem uma profunda revolução no jornalismo no mundo inteiro, não só por causa da crise econômica, que aliás dá sinal de que já foi; nós não estamos mais em crise. Houve uma reacomodação muito profunda e irreversível de grandes redações nos Estados Unidos, mas o fato é que a sociedade precisa cada vez mais do relato independente. O jornalismo oferece para a democracia esse ponto de vista que não está tutelado, coordenado, manipulado por interesses comerciais ou governamentais. É verdade que os jornais, revistas, canais de televisao, tem uma série de interesses, incorrem em erros toda hora; mas o ideal da imprensa, que é de fornecer um relato independente, esse ideal permanece - e as pessoas procuram. Tanto que as críticas aparecem quando alguém levanta uma suspeita de que eles não sao tão independentes assim. O momento é promissor. Eu sou muito otimista em relação a isso.

A gente está vivendo um momento efervescente, com o presidente Lula criticando a imprensa nesse momento de campanha, questionando e reclamando; e de certa forma, até de maneira velada, ameaçando. Como você tem visto isso?

Olha, eu tive muita sorte na vida; e em parte eu tive muita sorte em 2003, quando fui pra Brasília presidir uma estatal de comunicação e convivi mais de perto com o presidente da República que eu já conhecia de outros tempos. Eu acho uma figura genial; um dos homens mais inteligentes que eu já conheci. Uma capacidade de articular números, dados, geografia, tendências. Às vezes tendências q não estão claras, ele intui. Uma figura impressionante em muitos sentidos.  E eu considero que existe nele um compromisso verdadeiro, de vida, com as causas mais relevantes.

Agora, recentemente, ele fez declarações muito graves, indevidas, impróprias com relação à imprensa. Uma delas é essa de dizer que a liberdade de imprensa é sagrada, mas que ela existe para que as pessoas tenham informações corretas. Em princípio todo mundo vai estar de acordo com isso. Mas há uma inconsistência nessa afirmação que é uma sutileza que a gente precisa entender, e explicar. A liberdade de imprensa foi conquistada na democracia para que as pessoas digam o que elas pensam. É a liberdade de expressão, é a liberdade de pensamento, liberdade de opção religiosa. E nem sempre o que eu penso vai ser considerado correto por você. Se nós dependermos de um presidente da República dizer o que é correto e incorreto para que a liberdade exista nós caímos imediatamente na tirania, no totalitarismo.

A liberdade de imprensa existe para as informações que as autoridades vão achar que são incorretas. Existe para a crítica. E um presidente jamais deveria estabelecer essa condicionante. Devia atuar no sentido oposto, de assegurar que a liberdade sustenta a expressão crítica e daquilo que incomoda a autoridade. Isso foi muito negativo do ponto de vista de quem é jornalista como eu, e foi negativo na deseducação da opinião pública sobre o que a imprensa representa. Agora, isso na minha opinião não ameaça de forma alguma a ordem democrática. Tanto que ele falou isso, eu coloco essa afirmação no campo da 'bobagem' - e o presidente da República tem direito de dizer bobagem, vamos respeitar. Mas o fato é que a democracia segue, as eleições seguiram normalmente, a liberdade de imprensa está aí, não foi abalada por causa disso. A democracia no Brasil, ainda bem, não depende do humor do governante. Não é porque o presidente acordou bravo, que a democracia vai tremer nas bases. Então, a vida segue normalmente.

E mais: Eugênio Bucci fala sobre veículos que declaram seu voto publicamente; anonimato na internet; Serra e FHC, PT, aborto, religião e ética nas campanhas eleitorais. Ouça na íntegra aqui.

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