por Fernando Luna
Tpm #146

Agora, é a tecnologia a serviço da babaquice. E da misoginia

Depois do WikiLeaks, o VaginaLeaks. Sai Julian Assange, entra um hacker onanista.

Em vez da imagem do helicóptero norte-americano fuzilando uma dúzia de pessoas em Bagdá, a atriz Jennifer Lawrence pelada em cima do sofá, joelhos afastados e braços abertos jogados para trás. Também não adianta procurar pelo manual com técnicas brutais de interrogatório de Guantánamo: o que vazou desta vez foram as fotos íntimas de uma penca de celebridades e subcelebridades.

Agora, é a tecnologia a serviço da babaquice. E da misoginia.  

Da lista de 90 personalidades que teriam sido hackeadas, 100% são mulheres. De Kirsten Dunst (que tuitou um irônico “Obrigada, iCloud”) à bombshell Kate Upton, o rol de vítimas traz atrizes, cantoras e aquelas famosas que são famosas não se sabe exatamente por quê. Elas aparecem fazendo mais ou menos o que faz todo mundo que tem um smartphone ou uma câmera – “fotos íntimas”, o eufemismo da era digital para retratos e selfies desinibidos.

Só para lembrar: crime não é tirar foto nua, é vazar as imagens.

O FBI ficou encarregado do caso. O responsável pela pataquada deve acabar preso, como aquele carinha condenado a dez anos de cadeia e US$ 66 mil de multa por distribuir fotos de Scarlett Johansson, Mila Kunis e Christina Aguilera. Como nos casos de revenge porn, em que 90% das vítimas são do sexo feminino, de acordo com a Iniciativa por Direitos Civis na Internet (CCRI), os hackers da intimidade alheia miram nas mulheres.

Que fixação é essa em distribuir vaginas internet afora?!

À primeira vista, parece só uma espécie de orgulho besta. Dá para imaginar o nerd se gabando da sua habilidade para saltar firewalls, contornar sistemas de segurança hollywoodianos e quebrar protocolos IP. Mas, sei lá, apostaria que a questão central é o medo. Um medo primitivo, mais profundo que a deep web. Medinho freudiano da castração, de mulheres que ele não conseguiria sequer encarar sem a proteção da tela do seu computador.

A imagem do sexo feminino continua poderosa.

Há 30 mil anos é assim, da roliça Vênus de Willendorf à garota da capa, da galeria de arte italiana do Louvre ao Red Tube. Camille Paglia, sempre ela, decifrando a formação do olhar ocidental em seu Personas sexuais, resume de onde vem essa mistura de devoção e temor que uma mulher nua inspira: “Todo pênis é engolido por toda vagina, do mesmo modo como a humanidade, masculina e feminina, é devorada pela mãe natureza”. Uma rosa é uma rosa é uma rosa.

Fernando Luna, diretor editorial

fechar