por Redação
Tpm #63

Elas já foram selvagens, levemente aparadas e até depenadas. Aqui, quatro fotógrafos especializados em nus comentam as mudanças estéticas no corpo feminino dos anos 70 até hoje

Texto Isabelle Doudou

O padrão estético do corpo feminino está em constante mudança. Desde os antigos egípcios, passando pelos romanos, gregos até chegar no mundo ocidental de hoje, cada cultura e cada época têm um ideal de corpo feminino. Acontece que nós, mulheres de 2007, estamos vivendo um momento um tanto cruel em termos de ideal corpóreo. Nossos peitos não são mais bacanas. Bom mesmo são os de silicone, que temos que comprar, “instalar” e pagar em diversas prestações. Nossas periquitas nunca foram tão depenadas. E nosso corpo só pode ser considerado bom depois de horas e mais horas de academia, dietas, choques, aplicações, massagens, lasers. Que estresse! E a pergunta que fica é a seguinte: para QUEM tudo isso? Para os homens? Para as mulheres que nos olham com aquela ponta de inveja misturada com reprovação? Ou para nós mesmas, loucas que somos? Considerando que a resposta mais aceitável seja a “para os homens”, já que até as cacatuas se aprumam para conquistar o sexo oposto, decidimos perguntar a quatro dos maiores entendedores da estética feminina das últimas décadas o que mais mudou no nosso corpo e qual a opinião deles a respeito dessas transformações. Quer saber a resposta? Para eles, tanto faz.

Peluda, ela?

“Os padrões de beleza, à época da minha juventude, eram muito diferentes dos de hoje. O homem bonito era magro, sem musculação, sem bomba, não existia o culto ao corpo,da forma que vemos hoje. E com as mulheres não era diferente. Não existia malhação, as meninas tinham um corpo mais natural, muitas nem depilavam as axilas. O que dirá o resto. A contracultura, o movimento hippie davam o tom. O peito bonito era o médio, ou o pequeno, sem ser caído. Não existia silicone, e portanto não existiam tantas mulheres peitudas, só as naturais que, assim mesmo, se escondiam. Por conta do ofício, fotografo mulheres nuas há muito tempo. Lembro de uma sessão de fotos com uma super star, já nos anos 2000, para a Playboy. Durante o ensaio nem nem reparei o quanto ela era peluda, ou seja, para os dias de hoje. Só vim a saber que aquilo era uma loucura, ou, digamos, fora de moda, depois, com a revista já nas bancas, pois a grande repercussão tinha sido os dotes capilares pubianos da dita-cuja. Mas sigo ao sabor dos acontecimentos. Não sou nostálgico, acho bonito até esses corpos perfeitos de hoje. Mas, como observador – e falso especialista –, não posso deixar de perceber essa mudança tão grande que aconteceu de 20 anos para cá. É muito pouco tempo para uma transformação de padrão tão grande.” (Bob Wolfenson, 52, fotografa o universo feminino profissionalmente há 25 anos)

De certa maneira, um cúmplice

“No início dos anos 70 comecei a fotografar mulheres nuas e, desde então, trabalho com estética. Naquela época, os tipos de beleza que agradavam ao publico eram mais ou menos os mesmos de hoje, porém sem a ajuda dos silicones e lasers. Os modismos e os fetiches iam desde Valentina, de Guido Crepax, a Sônia Braga no telhado. A depilação, que nessa época era com gilete, deu espaço a um bigodinho verticalmente brochante graças à tirada parcial dos pêlos. Até os dias atuais, em que a moda é depilação total. Traçar um paralelo entre hoje e ontem mostra uma diferença é brutal. Sem dúvida, o padrão de beleza da mulher brasileira mudou. Mas não para pior, uma vez que esse tipo de mudança é sempre guiado por uma evolução. A natureza mestiça da brasileira continua viva e em pleno desenvolvimento. As mulheres têm se transformado em esculturas. Ganharam na aparência, mas perderam na naturalidade já que, nessa corrida maluca pela perfeição, muitas delas deixaram de lado sua auto-estima, sua saúde e até mesmo a felicidade de ser elas mesmas.” (Bubby Costa, 62, clica mulheres desde 1970 e seu nome já estrelou ensaios nas mais importantes revistas do país)


É tudo culpa da moda

“Apesar da passagem do tempo, as gordas continuam sendo as gordas e as magras continuam sendo as magras. Você pode mudar o peito ou a depilação, mas a essência e a beleza vai sempre depender de outras características. A beleza é fruto de um equilíbrio que envolve simpatia, charme e resolução pessoal. Claro que hoje as mulheres se depilam mais até porque os biquínis são menores. Isso é um reflexo da moda, que, por sua vez, é ditada pela mudança de comportamento. Teve um verão que a moda eram os pelos pubianos aparecendo em cima do biquíni. Se a calça baixa é o hit da vez, muitas vezes a depilação tem que aumentar também. Nos últimos tempos a tecnologia está ao alcance de todos e é ela que permite mais transformações, seja silicone ou depilação. As pessoas têm mais acesso, podem se transformar mais." (J. R. Duran, 54, é um dos principais nomes da fotografia brasileira. Clica mulheres “desde que aprendeu a andar” e observou, in loco, as mudanças dos padrões estéticos femininos)

Bolsas de silicone

 “No anos 70,  nos primeiros shows de Caetano ou Gil, as moças cobriam o corpo apenas com um minivestidinho de  pano, um colarzinho de miçangas e sandalinhas compradas no Mercado Modelo de São Salvador. Nada de sutiã. Peitinhos armando delicadamente o algodão. Quanto menores e mais pontudos, mais sensuais. Os pêlos das pernas nos davam a impressão de serem transmissores que irradiariam nossas carícias a todo o corpo da mulher. Já antes disso as mulheres não depilavam os pêlos pubianos. Quando era bem garoto, na praia, observava um ou outro pelinho a escapar dos fartos panos do maiô de minhas tias. Mais tarde, surgiu o biquíni de tecido mais fino, formando-se um misterioso voluminho ali e deixando escapar mais pelinhos. Tão tênue era aquele fino véu a encobrir o obscuro mistério. Ansiávamos pelo dia em que desbravaríamos aquela selvazinha, e chegaríamos  à porta da misteriosa gruta. Então os pêlos pubianos eram eróticos. No século 19, Machado de Assis – e outros – descrevia os delicados colos femininos: os seios são singelos volumes. Sem ufanismos, brasileiros dão primazia à qualidade da sensualidade e não à quantidade. Peitinhos delicados parecem fazer estremecer alma das mulheres com o mais suave toque. Por mais carola que tenha sido nossa cultura latino-católica, ela foi mesclada aos costumes dos e dos povos indígenas. Ao mesmo tempo em que a sacanagem sempre rolou solta, as perversões são menos comuns. Já nossos irmãos lá do hemisfério norte, reprimidos puritanos, se redimem entregando-se de corpo e alma à gula e à obesidade. Adoram mergulhar entre dois seios fartíssimos. Essa preferência contaminou-nos por aqui. Nossa população vai ficando obesa e nossas mulheres, peitudas ou siliconadas. No futuro, quando arqueólogos escavarem nossos cemitérios, encontrarão milhões de pares de bolsas de silicone, e tirarão de lá suas conclusões. (Rafic Farah, 58, é designer, arquiteto, artista e já fotografou muita mulher bonita nesta vida. Acompanha a Trip desde seu início, 20 anos atrás, e é uma espécie de Dom Quixote dos tempos modernos)

Vai lá: As fotos desta matéria estão no livro: Contemporary Nude Portraits, Ralf Mohr, R$ 179: www.excitarte.com.br

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