Única mulher do CQC, a repórter e atriz se esforça para ter voz no meio de tantos homens
Única mulher do CQC, Monica Iozzi se esforça para ter voz no meio de tantos homens – e diante dos políticos –, faz planos para quando sair do programa e, sobre a polêmica de Rafinha Bastos, desabafa: “Me sinto acusada de um crime do qual não fui nem testemunha”.
Não se deixe enganar pela personagem quase “sonsa” que Monica Iozzi usa para confundir os políticos em Brasília com o microfone do CQC em punho. Fora do papel, a atriz, que herdou o nome da mais famosa personagem dos quadrinhos de Mauricio de Sousa, deixa claro que é uma mulher segura do que quer e que sabe como alcançar seus objetivos. Tanto que faz questão de começar o papo dizendo “o CQC é apenas 1% da minha vida” e que não pretende ficar lá por muito tempo. Nem por isso, no entanto, trata o atual emprego e o que aprende lá como secundário.
Obstinada, Monica diz que nunca trabalhou “só para ganhar dinheiro” e que já desejava ser repórter do programa semanal da Band antes de lançarem o concurso que escolheria o oitavo integrante, dois anos atrás. Hoje, o CQC é sua “segunda casa”. Porém, mostra que existem duas turmas. É amiga da equipe toda? “Não”, diz, categórica. “Sou íntima dos repórteres [Rafael Cortez, Felipe Andreoli e Oscar Filho], mas não sou próxima dos homens da bancada.”
Na verdade, ela até considera Marco Luque amigo, “temos diversos amigos do teatro em comum”, admira Marcelo Tas, mas nunca passou de “colega de trabalho” de Rafinha Bastos. As últimas declarações do humorista (ele afirmou, ao vivo, que “comeria” a cantora Wanessa Camargo, grávida de seu primeiro filho, e o bebê), que levaram à sua suspensão, têm a ver com esse distanciamento? Monica prefere não falar, deixando claro que está seguindo ordens da empresa onde trabalha, a Eyeworks - Cuatro Cabezas, dona do CQC. “Sei muito bem o que penso sobre as declarações dele. Acho uma bosta tudo que aconteceu. Me sinto acusada de um crime do qual não fui nem testemunha”, desabafa.
Combustível
Apesar da turbulência que gerou uma crise na imagem do programa, para Monica, a polêmica foi boa. Com o afastamento de Rafinha, ela e os outros três repórteres passam a fazer um rodízio nas apresentações ao vivo. “Ficamos assim até o fim do ano, depois não sabemos o que vai acontecer”, diz. Se fosse convidada a ocupar permanentemente o lugar deixado por Rafinha Bastos, aceitaria? “Claro”, diz, sem pestanejar.
Nascida e criada em Ribeirão Preto, interior paulista, filha caçula de um eletricista e de uma dona de casa, Monica aprendeu na adolescência – e na marra – a lutar pelo que quer, haja vista a maneira como ela perdeu o pai, aos 16 anos. Chamado para trabalhar no último dia de Carnaval, Joaquim não resistiu a uma descarga elétrica acidental, provocada pelas trovoadas que costumam acontecer em Ribeirão Preto nessa época do ano. “Não há dúvidas de que me tornei outra após a morte dele. Fiquei mais independente e passei a fazer as coisas hoje, porque aprendi que o amanhã talvez não exista mesmo”, declara.
Sem o respaldo emocional e financeiro do pai, e com medo de sobrecarregar a mãe – como dona de casa, não tinha fonte de renda e precisou se mudar com as filhas para um apartamento menor e viver com o aluguel do antigo –, Monica se viu obrigada a administrar o que a vida jogaria em sua direção. Dormiu de favor no chão de uma moradia estudantil em Campinas, quando fazia as provas do vestibular para artes cênicas, “com baratas passando em cima de mim”. Durante o curso na Unicamp, ganhava uma bolsa trabalho e passou por diversos empregos “internos”, inclusive na biblioteca de física. O assunto sobre o qual mais leu? Energia. “Sou fascinada”, diz, sem perceber que a palavra sem definição exata determina momentos importantes de sua vida.
“Brinco que quero ser a Fernanda Montenegro, mas hoje sou o Tiririca. Então só faço coisas que vão me aproximar de ser a Fernanda”
Quando terminou a faculdade, Monica estava depressiva, infeliz. “O curso de artes cênicas me fez entrar em contato com emoções que não estava preparada para lidar”, admite. Frágil, ela voltou para a casa da mãe até decidir qual seria o próximo passo. Dona Vanda, preocupada, tentou convencê-la a desistir de arriscar a vida em São Paulo. “Queria que ela ficasse de vez comigo aqui em Ribeirão Preto”, explica. Não conseguiu. “A Monica sempre quis ser atriz, desde menina. Eu e o pai dela achamos que talvez ela fosse mudar de ideia, mas nunca pensou em fazer outra coisa”, diz.
Monica reconhece que a ajuda materna nessa época foi essencial para que soubesse encarar as dificuldades da carreira e ponderar quais trabalhos deveria aceitar. Em sua primeira vinda a São Paulo, trabalhou na seção de arte da Livraria Cultura para sustentar os dois cursos, de música e teatro, que fazia na cidade. “Gostava de trabalhar lá, mas decidi sair porque os horários me impediam de ensaiar peças, que era o que eu realmente queria fazer”, conta. A facilidade para largar o ganha-pão não vinha da estabilidade financeira. Ao contrário. “Nunca tive dinheiro sobrando, sempre soube que não seria rica, mas prefiro fazer o que gosto a trabalhar por dinheiro. Brinco que quero ser a Fernanda Montenegro, mas hoje sou o Tiririca. Então só faço coisas que vão me aproximar de ser a Fernanda”, diz.
Teste de coragem
Foi com esse pensamento que, em 2009, Monica decidiu fazer um vídeo para tentar entrar no time de repórteres do CQC. A motivação veio de um show que Rafael Cortez faria em sua cidade natal, mas, como ela não tinha câmera nem dinheiro para produzir um vídeo – e achou que o humorista o jogaria fora –, desistiu da ideia. Porém, 15 dias depois foram abertas as inscrições para o concurso Oitavo Integrante, que selecionaria um novo repórter para o programa. “Fiquei brava, na verdade. Pensei: ‘Poxa, já tinha tido essa ideia. Agora vou ter que concorrer com mais de 20 mil pessoas’”, explica.
Confiante, fez uma gravação de 25 minutos e só a enviou à Band no último momento. “Depois foram me dizer que não se faz vídeo com mais de 5 minutos, e que eles só assistiram a um trechinho do meu”, conta. Foi convocada para a segunda etapa do concurso e veio a São Paulo com a intenção de passar uma semana. Pediu guarida à irmã mais velha, a pedagoga Aline, que mora na cidade com o marido e a filha. Os testes, porém, duraram dois meses e Monica acabou ficando por lá um semestre, sem problemas. “Me dou muito bem com a minha irmã, sou madrinha da filha dela”, explica. A nova fase rendeu a Monica, além do novo emprego, o namorado Rafael Miotto, jornalista cinco anos mais jovem que ela.
Coroinha
A alegria na chegada ao programa, em outubro de 2009, não durou muito tempo, porém. Rejeitada pelo público nos primeiros meses, Monica amargou comentários bastante machistas (pasme) da audiência feminina. “Ela ficou muito abalada com as críticas, acabou saindo de todas as mídias sociais porque, quando criticavam um dos homens, diziam: ‘Ah, ele não é engraçado’. Mas, quando falavam mal dela, era: ‘Ela é uma vagabunda!’”, explica Rafael Cortez, hoje um dos melhores amigos de Monica. O respaldo da equipe, de repórteres e de produtores foi fundamental para que ela não desistisse nos primeiros meses – e a persistência deu certo. Apesar de ainda não ter tido coragem de voltar para o Twitter (em que recebia boa parte de suas críticas), atualmente ela se assusta com a receptividade calorosa que vem recebendo em palestras que dá esporadicamente. E é muito grata por isso.
Filha de mãe católica, Monica tem o costume de agradecer e fazer pedidos antes de dormir desde os 8 anos, quando ainda seguia a religião. “Fui até coroinha, acredita? Eu já curtia esses ‘trabalhos de menino’”, conta, rindo. Foi durante esse ritual noturno também que ela tomou gosto pela política – assunto que cobre primordialmente no programa. “Comecei a querer que o mundo fosse melhor. Todo dia incluía um pedido para o meu ‘mundo perfeito’. Quando entrei na faculdade, percebi que essas ideias todas não eram nada novas, se chamavam socialismo e já não tinham dado certo”, brinca.
“Ainda me sinto muito moleca, mas estou achando ótimo a serenidade e a segurança dos 30 [anos]”
A vontade de mudar o mundo, no entanto, persiste até hoje nas reportagens que ela faz em Brasília. “Às vezes eu choro. Nunca na frente dos políticos, claro. Mas, quando sou agredida verbal ou fisicamente, fico triste por imaginar que uma pessoa que deveria estar ali para ajudar o país está fazendo justo o oposto”, escancara. Marcelo Tas acredita que é justo o “charrrrme desta mocinha serelepe” que conquistou o público. “Se no início havia dúvidas de que ela poderia suceder Danilo Gentilli em Brasília, hoje ninguém mais fala nisso. A razão é simples: a Monica superou as expectativas e trouxe novos ingredientes às entrevistas, sabendo fazer valer com elegância e inteligência sua condição feminina naquele ambiente de machos vacilantes”, diz. A aceitação do público não diminui a insatisfação que Monica vê em Brasília. “Quando estou na frente de um político corrupto, não encaro como uma simples matéria para o CQC. Me vejo como uma cidadã que tem a oportunidade de confrontar seus líderes e tentar mudar algo no sistema de governo atual”, diz. “Mas, infelizmente, as coisas já criaram raízes. A gente realmente não tem noção do que se passa por lá”, lamenta.
Sem crise
Assim como Monica já sabe que não vai conseguir mudar o mundo, ela também não pretende passar o resto da vida sendo repórter do CQC – muito menos de política. “O Congresso Nacional me consome demais. Não acreditava em energia negativa até pisar lá dentro. Saio de lá moída, como se tivesse feito trabalho braçal”, explica. O próximo passo, então, é se firmar como atriz. “Quero montar uma peça, mas, por causa das gravações, sem horários fixos, precisaria ser um monólogo. O problema é achar um texto que não fale de mulheres passando pela crise da meia-idade. Eu estou passando justo pelo oposto!”, conta.
A animação de Monica com a chegada dos 30 anos, recém-completados no dia 2 de novembro, envolve as últimas conquistas emocionais e profissionais. “Ainda me sinto muito moleca, mas estou achando ótimo a serenidade e a segurança dos 30. Comecei a fazer terapia no ano passado, porque agora tenho dinheiro, e finalmente estou processando a perda do meu pai”, explica. O cachê do CQC ajudou na realização? (Estima-se que Monica ganhe entre R$ 10 mil e R$ 15 mil por mês.) “Claro que sim. Hoje posso morar em um bairro bom de São Paulo e me dei ao luxo de comprar um carro, para poder visitar minha mãe sempre que quiser, em Ribeirão. É para lá que corro quando preciso recarregar minhas...”. Energias.