”Entrei na menopausa e fiquei impressionada como não sabia quase nada do assunto. Talvez por isso tenha ficado tão mal. ‘Tô velha’, pensei. Acabou. Lembrei então de Rita Lee”, escreve Maria Ribeiro
Quando recebi a mensagem, estava saindo do hospital. Minha mãe seguia internada há algum tempo. E tudo indicava que não voltaria pra casa. Era rotina deixar a casa de saúde e perder um tempo sentada no café da recepção pra dar uma olhada no celular. Voltar, de alguma forma, pra vida sem sobressaltos. Que a gente só dá valor quando perde. Abri o WhatsApp: três áudios dos meus filhos, seis recados de trabalho e uma frase que parecia escrita em caixa alta: “Menopausa mesmo, Maria”.
Não que eu não imaginasse. Mas “faltava o resultado do exame de sangue”, segundo a Dra. Juraci. Que agora estava lá, toda ginecologista, carimbando, em uma frase curta, o fim do meu sangue. Pronto, agora vamos ver o que fazer, eu poderia ter pensado. Mas essas aspas não existiram. E não existiram porque ali não me veio nenhuma possibilidade de senso prático. E muito menos de literatura.
Eu nunca gostei de menstruar. Mas de repente me deu saudade. Saudade da varanda da primeira casa onde morei. Da roupa de balé que eu usava nos jantares dos meus pais. Dos meus filhos pequenos com pijamas de dinossauros. Das certezas e das raivas da juventude. Do Jô Soares no SBT. Dos riscos azuis dos testes de gravidez. De escolher absorventes com ou sem abas. Da possibilidade de fazer filhos com os meus parceiros. Daquele chocolate que vinha com uns bichos em relevo.
Todo esse Proust irracional e aleatório aconteceu no tempo de um pão de queijo e de um capuccino. Prêmios que, inconscientemente, eu me oferecia depois de tomar decisões com a turma do CTI. Na época, minha mãe estava inconsciente, e eu era a gravidade em pessoa. Eu achava que nada mais me abalaria. Eu já estava "dura" o suficiente.
“Menopausa mesmo, Maria”, eu repetia em looping. Liguei pra Mônica Martelli. Mônica, foi, nos quatro anos em que trabalhamos juntas, uma espécie de oraculo pra todo tipo de assunto emocional. Sua franqueza sempre me arrebatou. Temos sete anos de diferença, e isso a tornava imensa pra mim. Separação? Mamografia? Mônica nunca me negou nenhuma verdade. Amo tudo que aprendi com ela. E espero ser essa pessoa pra minas mais novas que eu.
Ouçam as mulheres. Isso era uma frase que eu dizia em um programa que fiz com outra amiga, e que acabou virando um bordão de todas as temporadas. Adorava repetir essas silabas. Parecia uma oração (segredo: é!) e olha que isso foi antes do boom da quarta onda feminista.
Entrei na Menopausa no meio de um ano já muito difícil, e fiquei impressionada como, até então, não sabia quase nada do assunto. Talvez por isso, tenha ficado tao mal. “To velha”, pensei. Acabou.
Encontrei uma atriz na saída de uma peca de teatro e comentei com ela o único tema que me consumia: que estava dormindo mal e esquecendo palavras (embora não estivesse sentindo os tais calores). “Maria, shhh, não conta pra ninguém. Você não parece a idade que tem. Isso pode te tirar trabalhos”.
Lembrei então da Rita Lee. De quando ela transformou sua Menopausa em música. Menopower pra quem foge às regras, Menopower pra quem nunca se entrega. A identificação foi imediata. Ficar quieta? Como assim? Eu tenho 48 anos e me sinto ótima. E passado o baque inicial, que tá muito mais na conta da construção social do que nos sintomas físicos, eu tô ainda mais forte. E quero ser parte dessa bandeira. Da fala. Da escuta. Da honestidade. Do casamento com o tempo.
“Menopausa mesmo, Maria”. Ficar quieta? “Não contar pra ninguém?” Quer saber? Talvez eu faca ou outdoor. Se bobear, até tatuagem. Ou camiseta. Ou as três coisas. Obrigada, Rita Lee.
Créditos
Imagem principal: Catarina Ribeiro (@catarinaribeir.o)
Fotos: Catarina Ribeiro (@catarinaribeir.o); Assistência: Ninon Assis; Make: Fernanda Suzz (@fernandasuzz)