”A verdade é que sexo e deficiência já são tabu, mesmo tratados isoladamente. Juntos, viram assunto quase proibido”
Assim que quebrei o pescoço, uma de minhas maiores preocupações era a de não poder fazer mais sexo. Aliás, não voltar a ter prazer é um assunto que aflige muita gente que se depara com uma deficiência. Comigo não foi diferente. Por isso, na dúvida, quis tirar a prova rápido. Fiz sexo na UTI.
A relação aconteceu durante uma das primeiras visitas de Paulo, que era meu namorado na época e a mesma pessoa que dirigia o carro quando sofri o acidente. Rolou na cama hospitalar, numa espécie de biongo cuja única privacidade se dava por um cercadinho de cortinas. Na ocasião, pedi para que ele me tocasse lá embaixo. E depois de muita insistência de minha parte, e já tomado de um misto de medo e tesão, ele começou a me beijar enquanto me tocava por debaixo do lençol.
Na mesma hora, percebi que estava molhada, e que era capaz de sentir suas mãos de uma forma nova. As sensações internas estavam todas ali e o mais surpreendente é que eu reconhecia o meu próprio cheiro, o que me deixava ainda mais excitada. Naquela tarde eu vi que podia continuar a ter prazer, mesmo sem os movimentos do pescoço para baixo.
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Passados mais de vinte anos desse episódio, as pessoas ainda se mostram surpresas ou chocadas com essa história. A verdade é que sexo e deficiência já são tabu, mesmo tratados isoladamente. Juntos, viram assunto quase proibido.
No filme As Sessões, um homem que teve poliomielite quando criança, tendo vivido a maior parte de sua vida em um pulmão de ferro, resolve perder a virgindade aos 38 anos, contratando uma terapeuta sexual. A trama é baseada em uma história real e ainda envolve os curiosos conselhos de um padre. A abordagem é leve e retrata o sexo e a deficiência de uma forma quase natural, como deveria sem qualquer situação.
Fico pensando em quantas pessoas com deficiência, por medo ou preconceito, se privam de ter prazer e acabam vivendo uma realidade totalmente condicionada pela falta de movimentos. Existem certas crenças que ajudam a reforçar esses medos, desencorajando quem tem deficiência e potenciais parceiros.
Quem nunca ouviu aquela história de que todo o organismo do homem cadeirante desliga e fica assim para sempre? Ou que mulheres com deficiência não podem ter orgasmo, tampouco engravidar? Isso não é verdade para ninguém. Aliás, a cadeira muitas vezes pode ser apetrecho para uma fantasia, já que ter relações com uma pessoa na cadeira de rodas foge à regra de estar na maioria das vezes deitado. Além disso, ninguém precisa ser maratonista para fazer sexo. A disposição para tal só precisa estar na cabeça para irradiar ao resto do corpo.
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Tudo que sinto hoje, sinto de outro jeito. São outros nervos que me trazem essa informação. É curioso, mas também não é regra para ninguém. O que importa é que a intensidade do prazer não muda. Aliás, até pode mudar se a gente quiser melhorar. Mas isso vale para tudo que experimentamos na vida.
Sexo é inerente ao ser humano. É um prazer na vida que em qualquer situação faz bem. O único segredo está em não se prender a parâmetros. E quando percebi que isso era algo que não estava perdido em minha vida, todo o resto passou a ser resto.