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por Marcela Paes

Pioneira em travessia de canoa havaiana, bióloga remou 28 horas de Niterói a Ilha Grande

Tem gente que corre pra emagrecer, faz yoga para ficar mais calmo, nada para melhorar a postura... Luiza Perin, 31, rema para obter respostas. "Quando se está remando é como se fosse uma máquina de pensar", afirma. No esporte desde 2005, quando o irmão lhe apresentou a canoa havaiana (ou polinésia), a bióloga é uma das únicas mulheres que se arrisca no campo das longas travessias.

Seu último feito foi completar o trecho de 130 km entre Niterói e a Ilha Grande em 28 horas. "Desde quando visitei a Ilha Grande pela primeira vez eu queria ir até a lá remando. Em 2010 eu fui do Rio ate lá, mas em uma canoa de seis lugares, em duas mulheres e quatro homens que eram bem fortes. Mas eu sempre quis ir sozinha, sem ajuda de ninguém", explica a niteroiense.

Com uma rotina de treinos que concilia com o trabalho com animais peçonhentos em um instituto de pesquisa, Luiza não reclama por acordar às 5h20 todos os dias e nem por perder algumas saídas com os amigos. "Arrumei muitos amigos na canoa havaiana então os programas são sempre os mesmos, eles também têm que acordar cedo", conta.

A Tpm bateu um papo com Luiza para tentar entender um pouco do universo pouco conhecido da canoa havaiana e da vida de uma remadora.

Tpm: Pra começar, por que você escolheu biologia marinha?
Luiza Perin:
 Sempre tive muito envolvimento com o mar, sempre gostei de mergulhar e pegar onda do bodyboard. Então a escolha teve muito a ver com o meu envolvimento, mas eu sempre gostei de biologia. A preservação do meio ambiente sempre fio importanter pra mim desde de criança.

Como você descobriu a canoagem?
A canoagem eu conheci em 2005. Já fazia um tempo que eu queria comprar um caiaque pra mim e um dia meu irmão mais velho começou a fazer. E no primeiro dia de canoa ele viu um golfinho, o que é uma coisa pouco usual, raramente acontece. Ele veio falando que o esporte era a minha cara e me contou a história do golfinho. Fui na semana seguinte, não vi golfinho nenhum, mas nunca mais parei de ir. Aí eu vi que tinha tudo a ver com o que eu estudava...

Como você concilia os treinos com o trabalho?
Tenho que acordar sempre muito cedo, às 5h20. Às 6h eu já estou na água, remo até 7h30 e às 8h30 eu já estou no trabalho. Quando eu vou dormir mais tarde não dá tempo de remar, mas eu faço outro esporte para compensar.

Com esses horários sobra tempo para ir a uma festa ou bar com os amigos?
Eu acabo deixando de sair quando meus amigos me chamam pra ir em festa ou qualquer coisa, deixo de ir porque tenho que acordar de madrugada pra remar. Mas acabei conciliando porque arrumei muitos amigos na canoa havaiana, então os programas são sempre os mesmos, eles também têm que acordar cedo, aí é fácil de conciliar. Os outros amigos que não são da canoa não entendiam no começo, mas hoje eles já sabem como é. Hoje em dia eles até me pedem pra remar... acabei juntando tudo.

Dá tempo de ser vaidosa?
Sou muito vaidosa. Quando estou na água fico muito descabelada, mas fora eu adoro passar cremes, fazer tratamentos... Em dias que eu fiz a unha na véspera, peço para os meus amigos me ajudarem a amarrar a canoa.

 

"Quando se está remando é como se fosse uma máquina de pensar"


Há muita mulheres praticando a canoa havaiana? Como os homens vêem uma mulher praticante?
Hoje em dia já há muitas mulheres no esporte, mas quando eu comecei em 2005 eram poucas. Não existia a modalidade feminina, eu entrava nas equipes mistas. Em 2007 os campeonatos começaram com equipes femininas. Mas na minha especialidade, que é a remada de distância, existem pouquíssimas mulheres. Muitos homens não acreditam quando eu conto o que faço. Estão olhando para o meu olho e logo depois que eu falo olham para o meu bíceps para ver se é verdade [risos]. Eu sempre retruco e digo que minha força está mais na minha cabeça.

Você fez a travessia de Niterói a Ilha Grande percorrendo 130km por 28 horas. Seu objetivo era chamar atenção para a importância da preservação do ambiente marinho e sobretudo da Costa Verde. Mas além desta razão, você teve algum motivo pessoal para escolher fazer isso agora?
Desde quando visitei a Ilha Grande pela primeira vez eu queria ir até a lá remando. Me senti mais preparada. Em 2010, fui do Rio até lá mas em uma canoa de seis lugares, em duas mulheres e quatro homens que eram bem fortes. Mas eu sempre quis ir sozinha, sem ajuda de ninguém. Comprei minha canoa individual e peguei intimidade antes de fazer esse percurso.

Como foi estar sozinha por tanto tempo? Passa muita coisa pela cabeça? Porque é uma coisa muito solitária.
Sim, muita coisa. Quando anoiteceu foi a parte que eu mais refleti. Eu estava bem longe da costa e a Praia da Barra estava há uns 10km. Eu olhava as luzes dos prédios e ficava pensando que as pessoas estavam indo dormir... Aí me perguntava "O que eu estou fazendo nesse mar escuro?", "Por que eu estou fazendo isso?", "Será que eu queria mesmo?" Nessa hora o que eu mais queria era estar no edredom, quentinha. Aí o dia foi amanhecendo e eu comecei a vomitar, mas incrivelmente depois disso comecei a ganhar confiança... Aí eu encontrei as respostas. "Estou fazendo isso porque era o que eu queria para mim há anos, consegui patrocínio... Estou fazendo isso porque eu consegui. Eu lutei muito e consegui." Ao mesmo tempo em que se faz muitas perguntas remando sozinha, se consegue muitas respostas. Quando se está remando é como se fosse uma máquina de pensar.

Muita gente se preocupa com o meio ambiente marinho, mas não sabe o que fazer para ser mais ativo. O que as pessoas podem fazer de concreto para ajudar?
Desde a década de 60, 70 a gente vê o movimento ambientalista crescer e as pessoas falando que cada um deve fazer sua parte. No caso do ambiente marítimo, as pessoas imaginam que a gente vá falar que recolher o lixo na praia é importante e etc... Isso é importante também, mas não basta só isso. Hoje em dia as pessoas têm que aprender a se articular socialmente para lutar pelo que querem. São atitudes que envolvem não só o gestual, mas sim uma mobilização social.

Você já remou em diversas condições e lugares. Existe alguma remada preferida?
Foi no dia 23 de dezembro de 2011. Eu estava com dois amigos: o Douglas Moura, que é um dos meus melhores amigos e o Flávio Pontes. A gente saiu de Itacoatiara rumo às iIhas Maricais e durante essa remada três baleias ficaram nos acompanhando, borrifando, olhando pra gente e descendo. Elas ficaram nos acompanhando durante uns 30 minutos. Foi um êxtase. Uma mistura de adrenalina (pelo medo) e uma felicidade e uma serenidade muito grandes.

Qual remada você tem muita vontade de fazer?
Tenho muita vontade de remar ao longo do Rio Xingu e ir até uma aldeia indígena, trocar experiências, canoas. Usar a canoa indígena e mostrar ao índio a canoa havaiana.

O que você aprendeu de mais improtante com a canoagem?
O respeito ao mar. O mar é muito importante pra cultura, para descoberta de novos lugares. O que eu aprendi foram as descobertas infinitas em relação ao ambiente marinho e a nós mesmos.

Vai lá: para acompanhar as histórias e experiências de Luiza acompanhe o seu blog http://voudecanoa.blogspot.com.br

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