O ator tira a roupa com uma condição: não olhar para a lente, mas para sua musa, Elen
A primeira vez que vi Júlio, ele ficou nu. Foi no cinema em 2007.
Sem cerimônia, ele protagonizou cenas quentes sem muitos cortes – cenas que chocaram algumas avós, inclusive a dele.
Sob o olhar sensível do diretor Beto Brant, o Brasil que prestigiou o filme Cão sem dono – tachado como alternativo – conhecia um ator novo, gaúcho, magrelo e de nítida entrega cênica.
Ele já havia estado em outros filmes e peças, mas era a primeira vez que encarava um protagonista. Um menino interessante? Um homem com algo frágil? Era impossível saber.
Júlio era Ciro, o personagem; assim como foi Arturzinho, mordomo gay na novela Passione. Ator, se transforma no que representa de tal maneira que consegue não ser reconhecido na rua. “Tomo a pílula da invisibilidade”, brinca.
"Não tenho grandes pretensões... ser famoso? Hollywood? Grana? Não, quero é fazer personagens que eu curta e ter outro filho"
Júlio já foi Raul Seixas, em Por toda minha vida, da Globo; foi Gonzaguinha, no filme Gonzaga, de 2012; e agora é Paulo Coelho, no filme Não pare na pista, em cartaz a partir deste mês.
Também está na televisão como Oswaldo, o jornalista esquizofrênico de O rebu. Mas fora da tela ele é Julinho, amigo do Grampá, parceiro do Daniel, marido da Elen e dono de um cachorro imenso que se chama Pessoa.
Um cara pouco afeito a holofotes, que arrisca o piano, teve banda com os amigos e que, ao se apaixonar por uma moça grávida, assumiu uma filha que não era sua. “Nesse dia me senti poderoso. Fui contra muitas coisas para assumir a Antônia [hoje com 9 anos]. Eu escolhi ser pai dela e isso foi forte”, conta.
Julinho é claramente orgulhoso de si e dos seus, ama e se rasga pelos amigos. Dentre eles os atores Daniel Oliveira e João Miguel.
Julinho é um cara com quem queremos tomar uma cerveja para falar dos planos futuros. “Não tenho grandes pretensões... ser famoso? Hollywood? Grana? Não, quero é fazer personagens que eu curta e ter outro filho, ou, melhor, mais de um”, conta enquanto fuma alguns cigarros e toma café sentado no balanço sob uma mangueira no quintal de sua casa em São Paulo.
"Sean Penn é galã, Serge Gainsbourg é galã. Eles têm um charme escondido e sabem lidar com as mulheres de um jeito delicado"
Pessoa, o cão, nos cerca. Quebra uma xícara e derruba o gravador. Depois de tomar uma bronca, se retira. Julinho mostra orgulhoso sua pequena horta e as mudas da mangueira, enquanto elogia a gentileza de Tony Ramos e o trabalho de equipe de O rebu. “Ali, não sinto o ranço da TV, é uma galera do cinema com a estrutura da televisão”, comenta. “O José Villamarin [diretor] é demais, entende o tempo do ator, e o Walter Carvalho [diretor de fotografia] foi simplesmente quem deu a cara para o cinema nacional.” Nessa hora ele já estava soltinho, mas não foi assim desde o começo. Julinho é desconfiado, sabe que o mercado adora consumir celebridades. “Qual vai ser a desta entrevista?”, perguntou no início da conversa. Mas, com a fluência do papo, ele relaxa. Elogia o irmão Ravel, 15 anos mais novo e que começa a despontar na TV e no cinema. É ele quem faz Paulo Coelho mais novo no filme recém-estreado. “Ele é o caçula de quatro e eu sou o mais velho. Ravel sempre foi esse moleque feliz. Esse filme foi nosso reencontro em grande estilo. Eu saí cedo de Porto Alegre.”
Julinho conta que saiu da casa dos pais aos 18 anos para morar com uma namorada. Guardou uma grana a duras penas para comprar um carro, depois vendeu para ir morar na Cidade Maravilhosa. “Era meu sonho morar no Rio. Eu andava com uma foto dos meus pais no Cristo Redentor na carteira”, lembra. Curtiu os ares cariocas, gastou tudo que tinha, mas não se apaixonou pela vida por lá. Voltou para Porto Alegre e pouco tempo depois surgia nu na minha frente no cinema, contracenando com Tainá Müller, outra estreante à época e com quem, posteriormente, namorou. Ele dividiu a opinião do público sobre ser ou não ser um gato. Pergunto o que é ser galã e, depois de um longo silêncio, ele crava: “Sean Penn é galã, Serge Gainsbourg é galã. Eles têm um charme escondido, sabem se movimentar, têm mistério e sabem lidar com as mulheres de um jeito delicado”. Concordo, e sob essa perspectiva Julinho é sem dúvida um galã. O jeito como ele se curva quando sorri e como cresce ao olhar para a mulher dão ares de bonitão a um rapaz camaleão, ora franzino, ora gigante.
"Preciso de 10 minutos para entrar em cena e mergulho no personagem. Isso até já me atrapalhou, hoje sei separar mais as coisas"
Para tirar a dúvida, Tpm chamou Julinho na chincha. “Queremos você pelado”, fomos direto ao ponto. Sem receio ou uma lista de exigências, ele topou. Nossa arma foi garantir atrás da lente a amiga e parceira Carol Quintanilha. Com ela, Julinho sabia que não seria um modelo, mas sim parte da equipe. “Gosto do cinema porque é uma coisa de grupo”, diz. De fato, apenas entrar pra gravar e cair fora não é pra ele. “Preciso de 10 minutos para entrar em cena e mergulho no personagem. Isso até já me atrapalhou, hoje sei separar mais as coisas”, diz. Foi por isso que para o nosso ensaio Julinho encarnou um personagem. Criou um artista, pintor, fotógrafo entorpecido por sua musa. A inspiração foi Serge Gainsbourg e Jane Birkin. Garantiu que a seco seria inviável. Julinho enquanto Julinho é pacato, família. Este que você vê aqui tem algo dele, claro, tem o olhar parceiro e apaixonado por sua musa. Mas talvez, ao encontrá-lo na rua, você não ligue o nome (e a bunda) à pessoa. Não se avexe, Julinho toma a pílula da invisibilidade.