O que eu encontrei em Mentawai? Altas ondas e muito plástico

por Veridiana Sedeh

O contraste entre a perfeição das ondas locais e a poluição do oceano marcou a primeira viagem de uma brasileira à Meca do surf na Indonésia

Acabo de voltar da Indonésia, para onde viajei com o meu marido, Fernando. Foi minha primeira experiência na Ásia. Viajamos para Bali e para Mentawai, um arquipélago a 150 km da costa de Sumatra. Eu já tinha ouvido falar muito de Bali, da qualidade do surf e do mergulho ao povo de cultura hindu e sua simpatia marcante. Já Mentawai era totalmente desconhecida para mim embora as ilhas sejam uma espécie de Meca para os surfistas – e o Fê é um deles.

A minha ideia não era surfar lá. Fazia tempo que não caía na água e estava sem minha prancha. Também estava com medo dos reef breaks – em Mentawai o fundo é sempre de coral, e coral raso. Estava entusiasmada para fazer snorkeling, mergulhar... Já sonhava com a biodiversidade marinha de uma ilha isolada em águas cristalinas.

O lugar é um espetáculo. As ondas locais são de uma perfeição tocante: formação, tamanho, consistência, beleza... Tudo no lugar. A água é um caso à parte, transparente, morninha e com diferentes tons de azul. Eu saía todo dia com o barco que levava o pessoal para surfar e aproveitava para nadar no canal que se forma ao lado das ondas. Mergulhei de snorkel várias vezes. Às vezes tinha a sensação de estar em um aquário com um monte de peixes ornamentais, tão coloridos quanto pequenos, algumas lagostas, ouriços enormes. E um monte de plástico.

“Mesmo antes de a balsa partir, começamos a ver pessoas jogando garrafas no mar. Na manhã seguinte, estávamos no paraíso - nós e o plástico ”
Veridiana Sedeh

Ir às Ilhas Mentawai foi uma experiência sensacional. Mas, tenho que admitir, com uma grande dose de decepção. Esperava uma vida marinha muito mais vibrante. Ok, talvez tenha ficado mal-acostumada depois de mergulhar em parques marinhos surreais no Brasil, como Fernando de Noronha e Abrolhos. Em um arquipélago com menos de 80 mil habitantes na Indonésia, um dos recifes de corais mais ricos do mundo, achei que fosse encontrar mais biodiversidade.

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Paraíso distante, problemas globais
O que aconteceu com a vida marinha desse lugar? Comecei a perguntar. Uma das respostas foi uma bomba, literalmente. Até pouco tempo atrás, pescadores locais costumavam jogar explosivos caseiros no mar para pegar peixe em escala comercial, matando não apenas os seus alvos, mas tudo em volta.

Embora esse tipo de pesca seja ilegal, a capacidade de monitoramento das 17 mil ilhas do país é, para dizer o mínimo, difícil. Sem falar que a Indonésia é famosa no noticiário internacional pela corrupção. Em 2013, um vídeo no YouTube com pescadores usando explosivos em Mentawai espalhou-se entre a comunidade do surf e desencadeou um movimento social pedindo mais patrulhamento na região. Até o campeão mundial Kelly Slater abraçou a causa, chamando a atenção para o vídeo em seu Instagram. Com a visibilidade, o governo indonésio prometeu agir. Aparentemente, isso ajudou. Mas claramente a vida marinha ainda sofre as consequências.

Quanto ao plástico que vi no mar, fui ingênua ao não antecipar o problema. A cada ano cerca de 8 milhões de toneladas de plástico vão parar nos oceanos. A Ásia sozinha responde por mais de 80% dessa quantia, sendo a Indonésia o segundo país que mais joga plástico no mar, depois da China.

Nossa experiência com o lixo marinho começou já no caminho para as Mentawai. A gente deveria ir para lá com a balsa rápida, mas era o fim do Ramadã – a maioria dos indonésios são muçulmanos – e, por razões não muito claras, nossa fast ferry foi cancelada na última hora. Por sorte, conseguimos pegar a balsa lenta, e, em vez de três horas, nossa viagem durou nove.

“Há uma previsão dramática do Fórum Econômico Mundial: em 2050 haverá mais plástico do que peixes nos oceanos”
Veridiana Sedeh

Com um pouco de sorte e comprimidos para enjoo, dormimos praticamente a noite toda. Quando acordamos, já estávamos no paraíso – nós e o plástico.

Vimos muito plástico principalmente num pico de surf chamado Scarecrows, um dos mais lindos da viagem. Mesmo sem ter gente jogando lixo no local, as correntes marítimas concentram os resíduos nessa onda. Meus mergulhos ali sempre terminavam com coleta de lixo. Alguns surfistas e a tripulação do barco também recolhiam o plástico, enchendo um saco grande a cada dia.

Tchau, tchau plástico
Nas Mentawais, a gestão do lixo é precária, mas algumas iniciativas tentam mudar o cenário. A Perfect Foundation, criada pela empresa Perfect Wave, criou uma escola em uma das ilhas com aulas gratuitas de inglês, surf e preservação ambiental. Desde 2015, eles trabalham a questão do lixo junto à comunidade, criando vídeos educativos e realizando mutirões de limpeza das praias. “Não temos dúvida de que há um longo caminho pela frente e de que esta seja uma tarefa árdua”, diz Karen Ball, diretora de projetos da fundação.

Em Bali, as irmãs Melati e Isabel Wijsen, de 15 e 13 anos, começaram o movimento Bye Bye Plastic Bags três anos atrás. Ao lado de outros 30 jovens e crianças da ilha, elas conseguiram atenção internacional ao organizar mutirões de limpeza de praias, petições e até uma greve de fome. Um dos principais resultados foi o compromisso do governo de Bali de banir as sacolas plásticas na ilha a partir de 2018. Procurada pelas irmãs Melati e Isabel, Karen apresentará a iniciativa ainda este ano para estudantes das Mentawai.

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Há uma previsão dramática do Fórum Econômico Mundial em conjunto com a Ellen MacArthur Foundation, quando o assunto é plástico e oceanos: em 2050 haverá mais plástico do que peixes nos oceanos se não houver uma mudança radical na gestão do lixo e da pesca. Ao voltar da Indonésia, criei o blog Veri Green, sobre o que podemos fazer no dia-a-dia para evitar que cenários como esse se tornem realidade. Enquanto cidadãos e consumidores, podemos ser parte da solução. Para diminuir a quantidade de plástico que chega no mar, o melhor a fazer é diminuir o consumo do material desde já.

Créditos

Imagem principal: Grant Davis

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