Sejamos felizes, tudo vai mal

por Fernando Luna
Tpm #160

Rosset sugeria que sua frase correspondia melhor ao sentimento brasileiro do que o vetusto “Ordem e Progresso” estampado na bandeira verde e amarela

Quem escreveu isso foi um filósofo contemporâneo francês, Clément Rosset, muito antes de o terror explodir no centro de Paris. Era 1989, e na verdade ele estava se referindo ao Brasil, no prefácio da edição nacional de seu livro Lógica do pior.

(E já agradeço por você não abandonar este texto, mesmo depois de ler, logo de cara e a esta altura do ano, as palavras “filósofo”, “contemporâneo” e “francês”, em sequência. Alerta de spoiler: não vou mais fazer isso.)

Pois bem, Rosset sugeria que sua frase correspondia melhor ao sentimento brasileiro do que o vetusto “Ordem e Progresso” estampado na bandeira verde e amarela. Realmente, “Ordem e Progresso”...

Se ao menos, como já tentaram Noel Rosa e Jards Macalé, o lindo pendão da esperança desfilasse o lema positivista completo, “Amor, Ordem e Progresso”, faria um pouco mais de sentido.

Pois 2015 saiu sob medida para o mote trágico que o francês soprou. Afinal, é o ano de Eduardo Cunha, petrolão, tsunami de lama tóxica, inflação e recessão. Ei, deixa disso. Respira. Sejamos felizes, tudo vai mal.

Alegria à beira do abismo é coisa nossa, muito nossa – assim como o samba, a prontidão e outras bossas. A rotina é devastadora? Vamos festejar. Não é qualquer país que tem sua identidade colada a uma festa: meu Carnaval, Brasil. No nosso Enem sociológico diário, a alegria é a prova dos nove.

(Aliás, se proibirem de novo a fabricação de máscaras do Nestor Cerveró, vamos para a próxima folia com o rosto do Delcídio do Amaral. Rindo se corrigem os costumes. Aliás de novo, será que até fevereiro ele ainda vai embutir esse “do” em seu nome, seguindo uma suposta recomendação numerológica? Sei lá, a mudança não deu muita sorte, apesar de aparentemente ter trazido dinheiro.)

Pode ser aparelhagem, baile, balada, farra, fluxo, fuzarca, night, reunião, sarau ou qualquer festa – na página 62 tem um roteiro lírico e sentimental dos embalos que fazem o Brasil remexer. No fundo é tudo uma coisa só: uma maneira de tomar fôlego e seguir em frente. De fazer da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sono uma ponte, da procura um encontro, como bem escreveu um dos quatro cavaleiros mineiros do Apocalipse.

Quanto riso, oh, quanta alegria nestes tristes trópicos. Boas-festas, todas elas. Ano que vem tem mais, sempre.

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