Da “nega do cabelo duro” à “nega do suvaco cabeludo”

por Nina Lemos
Tpm #141

Agora temos que aguentar arremedo de humorista piorando ainda mais as coisas

Depois das marchinhas que falam de mulatas com cabelo pixaim (sempre as mulheres, né?), agora temos que aguentar arremedo de humorista piorando ainda mais as coisas

Quem tem mais de 30 anos passou a infância cantando músicas racistas em bailinhos de Carnaval sem se dar conta. Era engraçadinho, um monte de criança vestida de melindrosa e havaiana (fantasias hit dos anos 70-80) cantando fofas coisas como “Nega do cabelo duro, que não gosta de pentear”. Era fofo, só que não. Era bizarro. Imagine que legal hoje as meninas cantando na escola “Loirinha de chapinha, que só gosta de balançar / Quando ela passa na rua, todo mundo começa a gritar / Pega ela ali para passar batom”. Seria uma música ainda a pregar a agressão. Muito medo. Pobres criancinhas que fomos.

Outro clássico: “O teu cabelo não nega mulata, porque é mulata na cor”. E a letra continua falando que, apesar de mulata, ela tem a alma cor de anis (clarinho, lembram?). A gente tenta esquecer que essas músicas são racistas, ou não ligar muito para elas, porque são de 90 anos atrás. Mas quando éramos crianças deveríamos parecer um exército de minirracistinhas cantando coisas que nem sabiam o que significavam.

Achamos que o tempo passou. Nossos pais não se ligaram e deixaram a gente ouvir essas músicas, acontece. Eles não sabiam! Está tudo enterrado. Quer dizer, estava, até descobrirmos que existe uma música de um humorista que é a nova sensação da web. Trata-se de um menino que se intitula Pranchana Jack e que faz graça com mulheres sem bunda, negras, sujas e por aí vai. Sua versão de “Nega do cabelo duro” diz o seguinte: “Nega do suvaco cabeludo vem ni mim / Vem que hoje eu quero dar no couro / Nega do suvaco cabeludo vem ni mim / Vem que eu não perdoo nem cachorro”.

O garoto consegue ser tudo ao mesmo tempo agora e, sim, achamos que ele deve ser processado. Mas como humor também é nossa especialidade, fizemos uma versão para ele: “Racistinha otário, nem vem em mim / Nem vem em mim que piso em você como besouro / Racista otário vem em mim / Vem em mim que não perdoo racista ogro”.

Os nossos pais terem cantado conosco “Nega do cabelo duro” a gente até perdoa, mas cantar hoje “Nega do suvaco cabeludo” não dá, não! Protejam as crianças!

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