por Tania Menai

Com a estreia de Coco antes de Chanel, Tania Menai relembra a trajetória da estilista

“Queria me sentir mais leve, então criei uma moda assim, leve”, disse certa vez a estilista francesa Gabrielle “Coco” Chanel, que nasceu na virada do século retrasado, viveu anos-luz à frente de seu tempo e faleceu em 1971, aos 88 anos. “As mulheres da minha época não pareciam humanas. Suas roupas iam contra sua natureza. Devolvi-lhes liberdade, dei-lhes pernas e braços de verdade”, afirmava. Com esse conceito, Chanel foi responsável pela criação daquele tubinho preto que está pendurado no seu, no meu, no nosso e no vosso armário.Fêmea de forte personalidade, Chanel criou não só sua grife, mas um estilo.

Alta, magra e atlética, Chanel era a modelo de si mesma. “Ela criou peças que podem ser usados por qualquer mulher, de qualquer época, em qualquer lugar”, disse Andrew Bolton, um dos curadores de “Chanel”, exposição de 60 peças que ele preparou para o Metropolitan Museum of Art, de Nova York, em 2005. “Ela se inspirou em modelos da classe proletária, da roupa masculina, do uniforme militar”, conta o curador.

Mulher fru-fru?
O filme Coco antes de Chanel, em que ela é interpretada pela francesa Audrey Tautou, deixa a desejar, mas mostra como a menina Gabrielle era, de fato, diferente das “mulheres fru-frus”. Certa vez, Chanel contou ao pintor espanhol Salvador Dalí que “tudo o que ela fez na vida foi transformar a roupa de homens em roupas de mulheres”. O exemplo é a peça ícone de sua marca: o tailleur de duas ou três peças. Apesar de ter desenhado o modelo por volta de 1915, somente em 1954, 15 anos depois de ter se aposentado, que Chanel – na época, com 71 anos – recriou a roupa incorporando os botões dourados, contornos na lapela e punhos do paletó. Além disso, ela viveu a era das melindrosas, elaborando modelos de cintura reta e saia curta, sem falar nos vestidos de gala, um deles usado por ela mesma em 1936: longo e rente ao corpo, todo bordado em metal e paetês coloridos, acompanhado de um cinto dourado. Pragmática, ela dizia que “moda não é arte. É uma profissão”. Ela ainda desenhou bolsas pretas com alças douradas, sapatos, joias e os imensos colares de pérolas.

Cheiro no cangote
Coco nasceu na cidade de Saumur, perdeu a mãe aos 12 anos e logo depois foi abandonada pelo pai. Por cinco anos, foi criada por duas tias, que lhe ensinaram a costurar, até ser enviada a um orfanato de freiras. Nunca se casou, tampouco foi mãe. Teve casos e mais casos com homens endinheirados, duques e aristocratas. Sempre foi amante, nunca titular. Esses homens a ingressaram no beau monde. Ela abriu lojas em cidades como Biarritz e Paris. Quando perguntavam-lhe sobre seu passado, ela simplesmente inventava – e se contradizia. Coco viveu em uma Europa tomada por grandes conflitos. Apaixonou-se por um oficial nazista, o que lhe obrigou a exilar-se na Suíça – na época, sua marca perdeu força, até ela reaparecer em 1954. O nome do perfume Chanel 5, criado em 1921, acompanhou a moda da época – tudo levava números, inspirados em aviões, como o Voisin III e Blériot XI. Cinco era o número de sorte de Coco. A embalagem foi inspirada em vidros farmacêuticos, e a essência “um perfume de mulher com o cheiro de uma mulher”.

 

Para Coco, estilo transcendia o vestuário. E tão imortal quanto a estilista é uma de suas dicas: “Se você está com dor de cotovelo, passe um batom e vá em frente: homens detestam aquelas que choram”. Mas não esqueça daquela gota de Chanel 5 para dormir. E nada mais.

* Tania Menai é jornalista, mora em Manhattan há 13 anos e é autora do livro Nova York do Oiapoque ao Chuí, do blog Só em Nova York, no site da Tpm, e também do www.taniamenai.com

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