70 anos de Caetano

por Redação

Para celebrar, relembramos a entrevista com ele nas páginas vermelhas da Tpm # 87

Caetano Veloso faz 70 anos e vamos combinar que não é todo dia que um ícone musical como ele chega aos setenta em plena atividade (para nossa sorte e deleite!), não só dando continuidade ao seu trabalho mas colaborando com a produção da nova música brasileira, construindo parcerias com jovens nomes. 

Desde seu primeiro disco, Cavaleiro/Samba em Paz, de 1965, são 47 anos de carreira e 48 álbuns lançados. Praticamente um projeto por ano, sem contar parcerias, regravações e outros especiais. E que bom que Caetano gosta de trabalhar, porque nós amamos ouvi-lo.  

Em 2009, ela foi Páginas Vermelhas na Tpm. Na entrevista, tinha acabado de completar 66 anos e falou sobre o tempo, velhice, família, drogas e carreira. Abaixo, trechos da conversa com um pouco do que o cantor nos contou na época. Na nossa galeria, fotos que ilustraram a entrevista. Aqui, a entrevista na íntegra.

“A velhice traz uma espécie de teimosia. Mas em mim percebo mais um descompromisso. Quando se é mais jovem, se toma cuidado para não ser desaprovado”

A velhice deixa você mais inflexível?

Caetano - A velhice traz uma espécie de teimosia. Mas em mim percebo mais um descompromisso.

Quando se é mais jovem, se toma cuidado para não ser desaprovado. Está se colocando na vida, no mundo. Tem um esforço instintivo para não estragar essa inserção.

O quanto era importante para você a aprovação dos outros?

Era importante, ainda é. Porém, na velhice, é aquele paradigma de A Velha Dama Indigna, do [Bertolt] Brecht: uma senhora direita, com filhos e netos, que resolve não ter limitação e começa a fazer o que quer. Já vivi tudo, não devo mais nada a ninguém, o que vou esconder agora? Nada.

“Já vivi tudo, não devo mais nada a ninguém, o que vou esconder agora? Nada”

Como está sendo a entrada na velhice?

Há muitas coisas objetivas. Não usava óculos e agora ando de óculos, senão fica tudo fora de foco. Se tomar um talho, na minha idade demora a cicatrizar. Meus cabelos, que eram cacheados e pretos, não têm mais o cachinho e ficaram brancos.

Se a mulher deixa o cabelo branco, todo mundo acha horrível.

É verdade. Pessoalmente, gosto de mulheres com cabelo grisalho, acho bonito. Mas uma vantagem da mulher é que ela pode pintar o cabelo. Homem de cabelo pintado fica com cara de político babaca... Tem várias vantagens e desvantagens em ser homem e ser mulher, mas prefiro ter nascido homem.

Por quê?

Não sei... Cresci no fim dos anos 40, anos 50, quando as mulheres não tinham mobilidade social nenhuma. Não podiam ir ao bar, sair sozinhas, sair à noite. Era chato para mulher. Eu tinha um pouco de pena das mulheres, era feminista quando criança. Mais do que sou hoje.

Por que ficou menos feminista?

Porque também cresci, amadureci, aprendi as coisas da vida [risos]. E as mulheres continuam sem poder envelhecer. Ainda é comum se achar que a mulher deve ser objeto de apreciação, que não pode ter rugas e precisa ser jovem. Isso também está atrelado à biologia, porque os sinais para reprodução são os da mulher jovem. A mulher, depois de uma certa idade, não se reproduz mais. Então, do ponto de vista animal, não precisaria mais produzir excitação sexual. Já o homem não. O homem vai até o fim. Não é mera tolice homens procurarem moças jovens, é uma coisa um pouco hormonal. Não gosto de ser preso a biologia, mas é assim. Gosto muito de mulheres jovens, mas também de mulheres velhas e mulheres de meia-idade.

Você escreveu uma música sobre velhice logo depois que seu pai morreu, “O Homem Velho”, em que definia: “O homem velho é o rei dos animais”.

Eu estava ficando maduro, ficando velho. Mas muito menos ­do que hoje [risos]. Achei bonito dizer aquilo como uma lembrança de meu pai. Ele era um homem muito altivo, mas suave e elegante. Muito bom, muito equilibrado, muito respeitado na cidade inteira. Então, era um entusiasmo afirmativo diante dessa figura patriarcal benigna.

Já que você citou Freud antes, vamos falar da pulsão de morte. Como você lida com a morte?

Sempre tive medo da morte, desde menino. Acho que sou menos angustiado hoje do que quando era novo.

Você continua saindo à noite?

Ah, sim. Gosto de ir aos lugares, de estar com as pessoas. Sou animado. Agora, a resistência é menor. Envelhecimento é isso. Demora para se recuperar de uma noite de cansaço, de uma balada. Eu emendava todo fim de semana na Bahia. Bebia muita cerveja e cachaça, e quando chegava segunda-feira estava novo. Depois foi ficando difícil. Já com 30 anos as ressacas eram insuportáveis. Foi ficando pior. Tô cheio de beber.

Não bebe mais nada?

Bebo só na terça de Carnaval. Este ano, bebi à beça.

Com 20 e poucos anos, você escreveu que seu coração “não se cansa de ter esperança de um dia ser tudo o que quer”. Aos 66 anos, chegou lá? 

Ainda não. Mas reitero que meu coração não se cansa.

Para celebrar a data, a Universal Music lança hoje mundialmente um álbum-tributo ao artista. A Tribute to Caetano Veloso contará com 16 releituras de artistas nacionais e internacionais. O quarteto inglês Magic Numbers escolheu a canção You don't know me, do disco Transa, para gravar sua versão e até videoclipe eles fizeram.

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